quarta-feira, 31 de março de 2021

Tabu


"Tabo", de Vilgot Sjöman (1977)
Proibido em mais de 15 países, "Tabu" é uma produção sueca de 1977 que vem na esteira dos filmes "exploitation" que surgiram na década de 60, apresentando ao espectador fatos considerados chocantes e tabú para a sociedade.
Em "Tabu", o cineasta e roteirista Vilgot Sjöman cria uma narrativa diferente: misturando ficção e recriando cenas mockmentaries, o filme apresenta uma lista imensa de fetiches e perversões sexuais, alguns no dia de hoje já totalmente absorvidos pela sociedade. O filme também é um excelente registro histórico, pois em 1977, era considerado tabu uma mulher branca sueca fazer sexo com um homem negro; era considerado aberração travestis, transsexuais e cross dressers; e mulheres mais velhas fazendo sexo com rapazes mais jovens era um escândalo.
Um advogado, Kristoffer (Kjell Bergqvist), é recriminado pela sua namorada Sara (Lickå Sjöman) por defender clientes pervertidos. Kristoffer argumenta dizendo que essas pessoas são puras, estão corretas em expressar seus desejos, que a sociedade é que está errada. Ele passa então a narrar histórias de seus clientes, o que faz com que Sara aos poucos se liberte de seus tabus e se envolve com taras sexuais, junto de Kristoffer, outro amante de fetiches. Entre as histórias narradas tem a de um homem que foca de pênis ereto se mostrando para meninas; um homem que fica nú na floresta e quer ser chicoteado pelo parceiro vestido de couro; um homem que se masturba vendo cadáver de uma mulher; uma idosa que gosta de ficar nua em público.
O filme é produzido pelo mesmo Estúdio que produziu os filmes de Bergman, Stockholm Film. É bizarro, grotesco, mas ao mesmo tempo, uma pérola rara, certamente jamais teria sido produzido nos dias de hoje.

terça-feira, 30 de março de 2021

Ciclo solitário


"Ye yi ji Ye", de Qi Zhang (2019)
Longa de estréia do roteirista e cineasta chinês Qi Zhang, "Ciclo solitário' remete ao cinema de Jia ZhengKe, no entanto, sem a mesma força.
O filme lida com temas como passado e presente, memória e a modernização destruindo regiões onde viviam uma população obrigada a migrar para dar lugar às construções. Tudo isso é pano de fundo para o drama de Hong e Ye, mãe e filha. Após se separar do marido, Hong se muda de Yinchuan para Chongqing com sua filha de 6 anos, Ye. Dez anos depois aos 16 anos, Ye sente uma total falta de empatia pela cidade, pela sua mãe ausente, que gerencia uma casa de jogos, pelo amante de sua mãe, e sente saudades de seu pai que ficou na cidade. Ye se torna apática, tem um namorado mas evita as investidas dele. Ela mistura em seus sonhos, realidade e fantasia.
O filme poderia ter sido um ótimo drama sobre temas tão importantes, mas a falta de lineridade, um roteiro confuso e a total falta de empatia dos personagens, aliado a um ritmo lento e arrastado fazem o espectador ficar indiferente ao filme. O que é uma pena, pois tem bela fotografia e bons atores. Mas tudo é muito frio, chato mesmo.

Um passe de mágica


"Magic", de Richard Attenborough (1978)
Drama psicológico de terror cult , foi a primeira experiência do cineasta britânico Richard Attemburough no gênero. 4 anos depois, ele lançaria o super Oscarizado "Ghandi". Anthony Hopkins protagoniza o filme, junto de Ann Margret e Burgess Meredith.
O filme é uma adaptação do livro escrito por William Goldman e para fãs de terror, irão identificar imediatamente que é praticamente um prelúdio para "Boneco assassino", a franquia de sucesso que lançou Chucky. A trilha sonora ficou a cargo do igualmente oscarizado Jerry Goldsmith.
Com tantos talentos na produção, era de se esperar que o filme se tornasse um sucesso estrondoso. Porém, diferente de "Boneco assassino", que investiu em uma narrativa pop e de filme B, "Um toque de mágica"busca refinamento, o ritmo é lento, as cenas são longas e arrastadas e aí afastou o público alvo.
Corky (Hopkins) inciia a sua carreira como mágico nos palcos, porém se torna um grande fracasso. Ao conversar com o seu mentor, que está à beira da morte, esse lhe pergunta se Corky almeja o sucesso. Anos depois, Corky é um enorme sucesso como mágico, e seu número principal envolve um boneco ventriloquista, Fats. Quando Corky e convidado a ter um programa em tv, ele fica tenso e diz ao seu agente, Ben (Meredith) que retornará à sua cidade natal. Chegando lá, ele reencontra a sua paixão de adolescência, PEggy (Margret), que está casada com Duke. Quando Duke viaja a trabalho, Corky reata sua paixão com Peggy, o que provoca ciúmes em Fats, que cria vida própria.
Certamente um filme que vale muito assistir, apesar do ritmo arrastado, muito principalmente pelos talentos irrepreensíveis de Anthony Hopkins e de Burguess Meredith. Hopkins lembra em certa instância de Norman Bates, pela dupla personalidade e pela culpa associada ao desejo sexual reprimido. Uma atuação soberba em um filme curioso.

Fevereiro


"Fevrier", de Kamen Kalev (2020)
Drama búlgaro escrito e dirigido pelo cineasta Kamen Kalev, concorreu em importantes Festivais e recebeu o selo de Cannes 2020, por ter sido selecionado para a competição principal mas devido à pandemia não houve o evento.
O filme, um épico intimista, remete ao cinema de Tarkovsky, Nuri Bulgen Ceylan e Bela Taar. Dividido em 3 capítulos, acompanhamos o protagonista Petar aos 8, 18 e 82 anos de idade na zona rural do Norte da Bulgária.
O cineasta Kamen Kalev e inspirou no seu avô para a história: seu avô vizia sozinho nas montanhas, cercado pelos animais e pela floresta, cuidando das ovelhas. Ele evitava contato com outras pessoas. Petar aos 8 anos é uma referência do diretor quando criança, seu olhar curioso sobre o seu avô.
O filme tem um tom fatalista e melancólico, e simbolicamente fala sobre o ciclo da vida, onde o personagem que começa criança e termina idoso repete as mesmas ações de seus antepassados, sem resistir ao seu destino.
Tem uma fala em off do personagem que sintetiza o filme: "Chegamos a uma certa idade onde o tempo nos dá as características físicas de nossos ancestrais."
A fotografia de Ivan Chertov é estupenda, tirando ao máximo as várias estações do ano apresentadas ao longo do filme. Destaque para cerimônia de casamento tradicional que acontece no 2o capítulo, durante o casamento de Petar. O filme se ambienta durante o regime comunista da República popular da Bulgária. Nesse capítulo Petar se alista no exército mas os oficiais estranham que ele passe mais tempo com as gaivotas do que com humanos. Um belo filme, cansativo, ritmo lento, mas contemplativo e que permite refletir sobre a existência.

Nervos à flor da pele


"Irió", de Baldvin Zophoníasson (2010)
Um drama "coming of age" com sub-trama LGBTQIA+, "Nervos à flor da pele" é uma produção islandesa que conta com um ótimo time de jovens atores e belas locações na Islândia.
Gabriel (Atli Oskar Fjalarsson) tem 16 anos, e vai para a Inglaterra fazer uma imersão em inglês por 3 semanas. Ele conhece Marcus, também islandês, e no último dia, os dois se beijam. Gabriel retorna para a Islândia e passa a seguir a rotina com seus amigos, mas agora as coisas mudaram, e ele está a um passo de sair do armário.
Interessante filme, prejudicado pelo excesso de sub-tramas ( o filme conta histórias paralelas de todos os amigos, passando por todos os temas adolescentes: conflito de gerações, suicídio, alcoolismo, drogas, traições, primeira vez. Acabou ficando sem foco e a trama principal, de Gabriel, se perde.

segunda-feira, 29 de março de 2021

Tina


"Tina", de Daniel Lindsay e T.J. Martin (2021)
Impossível não chorar assistindo a esse fantástico documentário sobre a vida e carreira de Tina Turner. A própria, aos 81 anos de idade, aposentada, narra a sua história. Ver Tina idosa relembrando os shows icônicos com energia de leoa, é comovente. O filme traz tudo aquilo que já sabemos: a relação tóxica com Ike Turner, seus 4 filhos, a luta após separação de Ike, que a deixou sem dinheiro; seu encontro com o produtor Roger Davies que mudou sua vida ao produzir seu disco "Private dancer", em 1985, com Tina já aos 45 anos de idade e que revolucionou a história do rock com a sua fúria no palco. Sua carreira no cinema, suas desilusões, shows ( o do Rio de Janeiro que levou 186 mil pessoas). As cenas raras registradas de sua vida no Memphis, aonde nasceu, em uma fazenda de seu pai, pobres, o abandono de pai e mãe que largaram os filhos à própria sorte.
Testemunhar uma história de luta como a de Tina, em uma época onde o feminismo dava lugar ao machismo na mídia, dele sendo constantemente apagada por perguntas sobre Ike, são de doer o coração. A cena final, de Tina indo assistir na Broadway o musical em sua homenagem, é de soltar lágrimas. Depoimentos de Angela Basset, que a interpretou no cinema, Oprah Winfrey e de muitos produtores, artistas e jornalistas.

domingo, 28 de março de 2021

As regras do filme noir


"The rules of film noir", de Elaine Donnelly Pieper (2009)
Excelente documentário sobre um dos gêneros mais amados e cultuados do cinema americano: o filme noir. O cineasta Paul Schrader, o fotógrafo Roger Deakins, outros técnicos, críticos de cinema e ensaistas dão suas impressões sobre o Noir, além de citar cenas de seus filmes preferidos.
Schrader diz que se não fosse a 2a guerra mundial, não teria existido o Noir: o êxodo de diretores, técnicos, diretores de arte, fotógrafos e atores fugidos da Alemanha para os Estados Unidos fez com que toda a linguagem do expressionismo alemão fosse absorvido pelo cinema americano que estava querendo fazer filmes baratos e com pouca iluminação. Billy Wilder e fritz Lang foram alguns desses cineastas, e dos atores, vieram Peter Lorre e Marlene Dietrich. Além deles, Humpray Bogart, Lauren Bacall, Rita Hayworth, Robert Mitchun, Barbara Stainwick, Orson Welles são constantemente vistos em várias produções do período.
Os temas são os mesmos : policias corruptos, mulheres fatais, traficantes, detetives, homens inescrupulosos, narração em off, preto e branco, armas e tiros em ambientes claustrofóbicos e perigosos. O clima é de total paranóia, advindo da ameaça constante de guerra e do desemprego, depressão. Após a 2a guerra mundial, os filmes ficaram mais violentos: isso porquê técnicos testemunharam os horrores da guerra e trouxeram essa experiência sensorial para os filmes, esse medo constante da morte que rodeia. Os roteiros geralmente eram adaptados de Pulp fictions, literatura barata.
"A marca da maldade", de 1958 é considerado o último filme do gênero. Vale assistir a esse documentário, que é um verdadeiro compêndio do que melhor se produziu na época, entre os anos 40 e 50.

The New York Times apresenta: Britney Spears- A vida de uma Estrela


'The New York Times apresenta: Framing Britney Spears", de Samantha Stark (2021)
Documentário que tem como pauta a tutela de pai de Britney Spears, James Spears, sobre todo o seu patrimônio, impedindo que ela tenha qualquer tipo de acesso ao dinheiro, justificado pelo o que a sociedade chama de "uma pessoa emocionalmente descontrolada", a ponto de perder a custódia de seus dois filhos para - ex-marido, Kevin.
O filme, repleto de raros material de arquivo, desde a infância de Britney em Lousiana, já cantando em corais, e depois, indo para NY com seus pais para tentar a sorte. Britney participou do Clube do Mickey, cantou em shoppings até ser descoberta e estourar em 1998 com a música "Gimme baby one more time". Britney se tornou a imagem da adolescente dona de seu corpo e empoderada, com sensualidade, e acabou se tornando alvo dos conservadores. Casamento com Justin Timberlake, depois com o pai de seus filhos, Kevin. A péssima relação com o pai, empresários gananciosos, paparazzis que a aterrorizaram em sua fase mais dark, os descontroles.. o filme faz um apanhado de toda a carreira de Britney, mais focado nas polêmicas e na questão judicial sobre o seu patrimônio.
O filme nos traz a moral da história de que o Mundo das celebridades é uma porrada onde poucos conseguem sobreviver ilesos, e que muitos que estão ao seu lado possuem outros interesses que não os seus. Britney foi bombardeada por mídia machista, misógena, que a colocaram em um lugar desfavravel em relação aos homens que a atormentaram.

Um estranho na praia


"Umibe no etranger", de Akiyo Ôhashi (2020)
Que lindeza de anime LGBTQIA+ japonês, adaptado de um mangá escrito por Kaan Kii. O filme é do gênero Yaoi, dedicado a histórias de amor entre rapazes.
Em uma ilha paradisiaca de Okinawa, Shun Hashimoto mora com sua avó, ajudando-a no café que ela tem. Shun pergunta para a avó quem é o estranho rapaz que toda noite se senta sozinho em um banco em frente ao mar. Ela diz que e' Mio Chibana, órfão que perdeu seus pais. Shun sente uma estranha atração por Mio. Quando se tornam amigos, Shun procura evitar qualquer tipo de segundas intenções com Mio, assustado com o bulltying que sofreu a vida toda dos colegas da escola, que achavam que ele era gay. Mio viaja e retorna 3 anos depois para a ilha, decidido a declarar para Shun que o ama.
Filme super indicado a casais gays, "Um estranho na praia" toca e temas dolorosos, como homofobia e a não aceitação da homossexualidade. Shun o tempo todo se retrai, questionando a possibilidade de um rapaz amar outro rapaz.
O carisma dos personagens, a linda trilha sonora, os traços da animação e o encantamento dos cenários contribuem para essa atmosfera romântica e lúdica que o filme proporciona. A cena da primeira noite de sexo entre o casal é divertida e ao mesmo tempo, apaixonante.
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Phoenix


"Phoenix", de Michael D. Akers (2006)
Drama LGBTQIA+ independente americano, "Phoenix" é a releitura do roteirista e diretor Michael D. Akers pata a obra-prima de Antonioni, "A aventura". O cineasta repete a história de um amante que desaparece sem deixar vestígios, e de como dois ex-namorados travam uma luta para tentar encontrar pistas de seu sumiço, e ao mesmo tempo, engatam um romance entre eles.
Ken é um homem de negócios que está desenvolvendo um trabalho em Phoenix, Arizona. Ele viaja até Los Angeles para encontrar seu namorado Dylan, um jovem enfermeiro, para passar juntos o dia de aniversário de Dylan. Ken no entanto, recebe uma ligação para retornar urgente para Phoenix. Chateado, Dylan resolve fazer uma visita surpresa ao namorado e tem duas surpresas: Ken desapareceu, e ele tem um namorado em Phoenix, Demetrius, que igualmente se surpreende que Ken tivesse um namorado em Los Angeles.
Rodado em belo preto e branco, o filme peca por escalar nos papéis principais, 3 atores fraquíssimos, cujos únicos dotes positivos são os seus corpos, pois fora isso, é triste. O amadorismo continua em todo o elenco de apoio. A releitura de "A aventura" fica só no desejo, pois o drama em si se perde diante de tantos diálogos fracos.

Love is love


"Love is love", de Shivankar Arora (2021)
Curta hindi escrito e dirigido pelo cineasta gay Shivankar Arora, "Love is love" parece um filme ds Disney sobre um romance juvenil gay. É um mundo cor de rosa, onde tudo dá certo, o amor e os sentimentos são reais e ninguém é contra. Mas Shivankar deixa claro, logo na cartela inicial do filme, que ele não pretende agredir nenhum credo, religião, preconceito da sociedade hindi, que é fortemente contra relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo. Apesar de aparentemente ingênuo, seu filme é uma grande provocação sobre duas pessoas do mesmo sexo que se amam.
Sam (Ramansh Bundela) é um estudante que se muda para Mumbai e vai para um apartamento airbnb. Ao chegar lá, ele conhece o dono do local, o jovem Sourabh (Swarak Kukreja). Sam é assumidamente gay, Sourabh é hetero e namora uma menina. Mas Surabh se encanta com Sam, e começa a sentir coisas que nunca havia sentido antes.
Fofo até não poder mais, é um filme simples, que dá seu recado de forma franca e aberta. Os dois protagonistas são bastante carismáticos e é ótimo ver um filem LGBTQIA+ que permite que seus personagens sejam felizes.
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Boa noite


"Da Yie", de Anthony Nti (2019)
Impressionante multi-premiado curta de Gana, escrito e dirigido pelo cineasta Ganense Anthony Nti que aos 10 anos de idade, migrou com a família para Bruxelas. A equipe é mesclada com Ganeses e Bruxelenses, e o roteiro tem um tom autobiográfico. O filme ganhou quase 70 prêmios internacionais em importantes Festivais, como Clermont Ferrand e Berlin, e está concorrendo ao Oscar da categoria 2021.
Ompossível não se lembrar de "Cidade de Deus"e "Moonlight". Do primeiro, o filme pega a cena inicial, crianças correndo atrás da galinha, a narrativa da câmera na mão, a fotografia que explora beleza nas cores e texturas da favela. De "Moonlight", o filme empresta o adulto que ensina a criança a nadar na praia, um educador. Mas o filme trata de temas pesados: pedofilia, abuso sexual de menores, drogas, traficantes, tudo misturado aà uma cidade onde a lei é de quem tem o poder, e as crianças estão à mercê dessa violência social e econômica.
A fotografia e câmera de Pieter-Jan Claessens é de se louvar, além das performances das duas crianças, Prince (Prince Agortey) e Mathilda (Mathilda Enchil), que nunca atuaram antes, mas exploram todos os sentimentos e emoções de forma brilhante, espontânea. Primoroso.

sábado, 27 de março de 2021

Quem é essa garota?


 

"Who's that girl?", de James Foley (1987)
Lançado em 1987, "Quem é essa garota?" foi uma grande aposta da Warner Brothers unindo 3 grandes talentos que vieram de grandes sucessos de crítica e público do cinema independente em 1985: "Griffin Dune", de "Depois de horas", de Scorsese, James Foley, o diretor, de "Caminhos violentos" e a grande estrela na época Madonna, emergindo depois do grande estouro de "Procura-se Susan desesperadamente". James Foley já havia dirigido Madonna em clips clássicos, como "Dress you up" e "Like a virgin".
A idéia era fazer uma screw ball comedy, comédias amalucadas que tivesses as situações surreais dos desenhos do Pernalonga. Kikki Finn, personagem de Madonna, é praticamente a Pernalonga de saias, botando Nova York inteira de cabeça pra baixo.
Nikki é liberada da prisão por onde passou injustos 4 anos, acusada de assassinar seu namorado. Ela quer ir atrás do mandante do crime. Ela esbarra com London (Griffun Dune), um faz tudo do futuro sogro, às vésperas do casamento coma filha dele, Wendy. Acontece que o sogro é o mandante do crime e quer que London pegue Nikki na penitenciária e a embarque em um ônibus que a despache para Pensylvania. Mas Nikki já está decidida a limpar seu nome e coloca London para ajudá-la na missão.
O filme foi destruído pela crítica e desprezado pelo público. É fácil entender, não porquê o filme seja ruim, mas porquê tem um tipo de humor que esbarra nas sandices de filmes como dos irmãos Marx ou dos desenhos animados, e o público não curtiu. Uma pena, pois o filme é hilário, apesar de super ingênuo, e tem gagas avassaladoras, como nos desenhos de Pernalonga. Madonna se dá muito bem na comédia, e criou uma personagem bem própria para a sua persona. Seu visual no filme, virou icônico, e suas músicas pra trilha sonora foram enorme sucesso. Para quem curte um passatempo leve e descompromissado, e uma boa pedida rever essa nostalgia dos anos 80.
Daniel Barbosa da Silva

O presente


"The present", de Farah Nabulsi (2020)
Meu Deus, me acabei de chorar no final desse comovente e poderoso curta palestino, escrito e dirigido pela cineasta Farah Nabulsi e vencedor de dezenas de prêmios internacionais, entre eles, o de Clermont Ferrand. Em brilhantes e potentes 25 minutos, "O presente" narra o conflito na Palestina em terras disputadas por Israel.
Yousef (Saleh Bakri) quer comprar um presente de aniversário de casamento para sua esposa, Noor (Mariam Basha). Yousef leva sua filha pequena Yasmine (Mariam Kanj) para atravessar o check point controlado por soldados israelenses e poder ir no mercado fazer compras. Mas a burocracia e o preconceito dos soldados israelenses atrapalham os planos de Yousef.
Cada minuto desse filme é dosado de emoção e muita tensão. A edição e a direção constróem brilhantemente uma narrativa que todos acreditamos acabar em sangue. É tenso, é repleto de drama e o desfecho coroando os novos tempos. Palmas em pé para o talento dos atores, do ator que interpreta o pai e da menina Mariam Kanj, impressionante em sua complexa e observadora personagem. Um hino pela Paz e pelo futuro da humanidade.
.O filme concorre ao Oscar de melhor curta em 2021.

Anônimo


"Nobody", de Ilya Naishuller (2021) Um dos melhores filmes de ação dos últimos anos, "Anônimo"é escrito pelo mesmo roteirista de John Wick", Derek Kolstad, e dirigido pelo realizador do vibrante "Hardcore: missão extrema", esse último um filme de ficção científica e ação todo em ponto de vista do protagonista.
"Anônimo"tem duas cenas antológicas: a do ônibus, com o protagonista lidando com uma quadrilha de assediadores mafiosos, e a de Christopher Lloyd, que interpreta o pai do protagonista, se protegendo do ataque dos mafiosos russos.
Bob Odenkirk ( de "Better call Saul") é Hutche Mansell. Pacato, ele vive uma rotina que vai de sua família até o trabalho com a empresa de seu sogro, em atividade burocrática. Uma noite, quando sua casa é assaltada por dois bandidos, sua esposa, becca (Connie Nielen) e seus dois filhos ficam irritados pois Hutch, podendo dominar os bandidos, não o faz e os deixa fugir. Chamado de pacato por todos, Hutch pega um ônibus e testemunha um ato de violência. essa é a deixa para Hucth mostrar quem ele realmente é.
Bom, sabendo que o roteiro foi escrito pelo mesmo autor de "John Wick", fica fácil entender as muitas similaridades entre os filmes.
Mas isso não faz com que esse "Anônimo", forte candidato a uma nova franquia de ação no cinema, seja tão bom quanto a franquia de Keanu Reeves, Isso se deve ao talento da direção, em coreografadas cenas de ação, e ao talento de Bob Odenkirk, sem deixar de lado o brilho de Christopher Llloyd, que rouba cada cena em que aparece, e de Aleksey Serebryakov, como o mafioso russo. Filmaço.

sexta-feira, 26 de março de 2021

Broken noses


"Broken noses", de Bruce Weber (1987)
Você pode não reconhecer pelo nome, mas certamente você já viu as centenas de campanhas publicitárias assinadas pelo mega fotógrafo Bruce Weber: as cuecas Calvin Klein vestidas por Mark Whalberg, ou as fotos da grife de roupas Abercrombrie & Fitch, com rapazes e moças dos mais lindos do planeta, em poses sensuais, um look vintage anos 50 e em fotos maravilhosamente estilizadas em preto e branco.
Fora isso, ele se aventurou na direção de video clips, e pelo menos se tornaram clássicos, para o duo britânico Pet Shop Boys: "Being boring" e "Se a vida é".
No cinema, Weber estreou na função com o premiado documentário "Broken noses", de 1987, concorrendo em prestigiados Festivais, como Sundance. Todo o look de Weber permanece o mesmo: preto e branco, estilização, look vintage anos 50, cameras lentas e também, a alta carga homoerótica, sua lente é totalmente apaixonada pelos corpos masculinos, independente da idade, pelos seus sorrisos, seus olhares. estivesse vivo, Weber certamente seria cancelado e chamado de pedófilo, afinal, boa parte dos modelos são crianças e adolescentes, registrados no mais alto teor erotizado.
O protagonista de "Broken noses" é o boxeador Andy Minsler, vencedor das mais de 300 lutas que participou. Dotado d ebeleza estonteante, Minsler abriu uma academia de boxe para jovens, em Oregon, Portland, chamada Mt SCott. Ao som de jazz composta por Gerry Mulligan, Julie London e Chet Baker, o filme acompanha o dia a dia do treinamento desses meninos, além d epegar depoimentos de Minsler sobre a sua curta carreira. Na metade do filme, acompanhamos Minsler viajando até visitar sua família, e a relação dele com seus pais e padrasto, e de onde veio a influência pro boxe. Mas provavelmente quem assistir ao filme não vai nem prestar atenção no roteiro, e sim, nas deslumbrantes imagens do filme, e na beleza de todo o jovem elenco, retratados como verdadeiros Adônis mirins. Uma aula de fotografia.

I hate New York


"I hate New York", de Gustavo Sanchez (2018)
Produzido pelo Cineasta espanhol J.A. Bayona, realizador de "O orfanato", "Jurassic park" e "O impossível", junto de seu irmão Carlos, "I hate New York"foi dirigido durante 10 anos pelo espanhol Gustavo Sanchez. O filme acompanha 4 trans, homens e mulheres, no período de 2007 a 2017 na cidade mais cosmopolita do mundo. Atraídos pela exuberância da cidade, todos sofreram bullying e precisaram se adaptar a todo o tipo de preconceitos da sociedade. Amanda Lepore, Sophia Lamar, Chloe Dzubilo e T de Long dão depoimentos e apresentam a transição do corpo, assim como a transformação pela qual passaram na evolução de tecnologia, redes sociais, manifestos. e mudança de comportamento da sociedade. Lepore e Lamar são remanescentes dos "The Club kids", faoso grupo Nova Yorkino clubber dos anos 90. Chloe é uma dominatrix e T de Long criou uma banda de rock punk, chamada "Transisters"e também é ativista de movimento em prol d acompanha da Aids. A própria t de Long é portadora do HIV. O filme apresenta em tom de melancolia uma Nova York decadente, do underground do East Side, a parte menos glamourosa da cidade.
Um filme instigante, vencedor de diversos prêmios e concorrendo em Festivais do nível de San Sebastian.

Cinema contemporâneo


"Cinema contemporâneo", de Felipe André Silva (2020)
Excelente curta pernambucano metragem de apenas 5 minutos de duração, composto unicamente por imagens de arquivo. Impressiona o fato da concisão de sua mensagem, o que muita gente faria em 15, 20 minutos, o autor o faz em precisos e contundentes 5 minutos.
O filme traz um relato pessoal do realizador: ele foi estuprado aos 10 anos de idade. Todos os homens presentes na foto borrada de certa forma abusaram dele. Felipe foi aconselhado por um amigo ator a esquecer esse papel de vitima e partir pra frente, mas ele não quer deixar de ser a vítima pois o foi. Os traumas desse passado o atormentam até hoje, e ele resolveu fazer o filme para expiar esse fantasma através da imagem da foto e em uma voz off, de um ator, se colocando no lugar do realizador.
O interessante do filme é que ele foi pensado também como uma resposta a muitos críticos de cinema que registraram um descontentamento com a recente safra de documentários narrados em 1a pessoa. O autor diz que somente ele sabe de suas dores e ninguém mais poderia narrá-lo.
"Cinema contemporâneo" é uma aula de cinema, de edição e de roteiro. Brilhante.

quinta-feira, 25 de março de 2021

Valentina


 "Valentina", de Cássio Pereira dos Santos (2020)

Ótimo drama LGBTQIA+ que traz uma grande denúncia: 80% dos jovens trans abandonam as escolas, e 35% são assassinados ao chegar a idade de 35 anos. Escrito e dirigido pelo cineasta mineiro Cássio Pereira dos Santos, "Valentina" traz como protagonista a youtuber e atriz Thiessa Woinbackk. Fugida de sua escola por transfobia, ela se muda com sua mãe Marcia (Guta Stresser) para o interior de Minas, para que Valentina não precise se anunciar como trans e possa viver em paz. Mas já na matrícula a diretora pede para que os dois pais assinem o documento de inscrição. Valentina e sua mãe tentam contactar Renato (Romulo Braga), que abandonou a família. Valentina faz amizade com dois colegas de escola, mas tem sua identidade descoberta e novamente passa a sofrer transfobia.

Dirigido com firmeza e respeito um tema tão forte, o cineasta Cássio Pereira dos Santos extrai um excelente trabalho de atuação dos três protagonistas. O elenco de apoio está ok, cumprindo seus personagens edificantes e também, transfóbicos.

Meu tio Mario


"Meu tio Mario", de Na'ama Zaltzman (2004)
Premiado curta israelense, "Meu tio Mario" é um lindo drama sobre Sefi (Alan Nachtigal), um adolescente órfão de pai, que mora com sua mãe, uma cozinheira, para quem Sefi trabalha. A mãe de Sfei educa ele com mão de ferro, mas não entende que o menino passa por crise com sua sexualidade. Quando Mario, seu tio, surge para passar uns dias na casa, Sefi passa a entender a vida dele e entende o porque dele ter ido morar em Milão.
Com uma mensagem edificante de aceitação e outing, o filme tem um ótimo trabalho de atores e uma delicada direção, respeitando os caminhos de cada personagem em suas viradas e construções.

quarta-feira, 24 de março de 2021

Black Divaz


"Black Divaz", de Adrian Russell Wills (2018)
Belo documentário LGBTQIA+, "Black Divaz" é um filme que homenageia a comunidade gay aborígene que mora no deserto da Austrália. O Slogan do filme brinca com o clássico "Priscila, a Rainha do deserto": "E você pensou que Priscila era a única Ranha do deserto?"
O filme acompanha as seis finalistas do Concurso Miss First Nation Drag Queen Pageant 2017, dedicado à Drag Queens aborígenes. JoJo, Shaniqua, Nova Gina, Josie Baker, Crystal Love e Isla Fuk Yah competiram com candidatas do país inteiro. O filme apresenta cada uma delas durante os 5 dias de preparação para a grande final. Entrevistas, histórias de superação, homofobia, transfobia, tudo aquilo que a gente já conhece das histórias da comunidade gay, de luta, aceitação e tristeza. Com muita garra, estar no concurso é uma vitória para cada uma das competidoras. É um filme que mescla emoções de alegria e de profunda tristeza. O desfecho é lindo, com as competidoras sendo ovacionadas pela platéia.

Má sorte fudendo ou pornografia louca


"Babardeala cu bucluc sau porno balamuc", de Radu Jude (2021)
Grande vencedor do prêmio de melhor filme no Festival de Berlin 2021, o Urso de Ouro, o filme é dirigido pelo mesmo cineasta romeno do ótimo "Aferim!", que venceu Urso de melhor direção em Berlin 2016.
O filme provocou escândalo no Festival de Berlin com a cena inicial: 2 minutos de sexo explícito envolvendo um casal, a professora de história Emi (Katia Pascariu, ousada, corajosa e visceral) e seu marido. O problema é que esse vídeo acabou vazando e os alunos da professora tiveram acesso a ele. Chocados, os pais exigem uma reunião extraordinária para decidir o futuro da professora na escola.
Radu jude filmou o longa durante a pandemia em 2020: todo o elenco usa máscara em cena, e Radu aproveita para criticar a população, que ignora o uso das máscaras, desdenha do vírus e ainda fica mal humorado por conta das restrições.
O filme tem uma narrativa anárquica, divida em 4 capítulos: no 1o, o filme parece um episódio isolado de "relatos selvagens"; além da cena de sexo, o filme apresenta a rotina da professora nas ruas, às voltas com pessoas mal educadas, que saem xingando, atropelando, se estalpeando diante de uma Romênia capitalista inundada de símbolos e marcas estrangeiras, ao mesmo tempo que a câmera revela prédios históricos comunistas destruídos. Os planos quase sempre terminam em algum símbolo capitalista e ali permanece por segundos, como por ex, a boneca Barbie.
O 2o capítulo é um glossário curioso, sem o elenco, como se fosse um video ensaio de Radu apresentando a Romênia de hoje e da era comunista: usando imagens documentais, cenas pornográficas, faz um compêndio do alfabeto de A a Z.
O 3o capitulo apresenta a reunião da professora, pressionada pela comissão de pais: eles representam o pior da raça humana: reacionários, homofóbicos, anti-semitas, xenofóbicos, anti imperialistas, misógenos, etc. É uma curiosa co-relação com a ditadura comunista e a ditadura capitalista de um governo conservador.
O epilogo apresenta 3 possibilidades de finas, sendo que o final é daquelas cenas inesquecíveis e grotescas, que certamente ninguém esquecerá. Um desfecho apoteótico que somente esse filme pode permitir.

Cabeça de nêgo


"Cabeça de nêgo", de Déo Cardoso (2020)
Excelente drama independente brasileiro, exibido no Festival de Tiradentes 2020, "Cabeça de nêgo" foi escrito e dirigido pelo cineasta cearense Déo Cardoso. O filme teve o Movimento dos Panteras negras como referência e conta a história do jovem Saulo (Lucas Limeira, brilhante), um líder do grêmio estudantil da escola pública aonde estuda. Saulo entende que a comunidade está dominada por traficantes e sabe que a escola está passando por situação precária, inclusive descaso dos professores com os problemas sociais e dos próprios alunos, em sua maioria, desmotivados e agressivos. Quando um colega de turma chama Saulo de "macaco", é a gota d'água para ele criar um movimento contra o racismo: ele resolve ficar an escola, e diante dos funcionários e professores que imploram que ele saia, ele resiste. Saulo grava vídeos na internet que viraliza, e logo, a sua luta se torna a luta de vários estudantes e moradores da região.
Com um excelente elenco de apoio, todos espontâneos e nenhum forçado, o filme apresenta um roteiro conciso e forte, com cenas bem estruturadas, costuradas com imagens reais dos movimentos negros nos Estados Unidos e com a manifestação pelo país nas ruas no ano de 2015. O filme teve como base a invasão de alunos em uma escola de São Paulo em 2015. Lucas Limeira é um excelente ator que merece estar entre os grandes.

segunda-feira, 22 de março de 2021

O caso Mattei


"Il caso Mattei", de Francesco Rosi (1972)
Vencedor da Palma de Ouro em Cannes de melhor filme no ano de 1972, "O caso Mattei"é escrito e dirigido pelo italiano Francesco Rosi, autor das obras-primas "Cadáveres ilustres", "O bandido Giuliano", "Lucky Luciano" e "A provocação". O filme, em narrativa semi- documental, tenta reconstituir, pelo ponto de vista de Rosi, os últimos dias de vida do empreendedor do petróleo Enrico Mattei (Gian Maria Volontè), morto em acidente aéreo no dia 27 out 1962, à caminho de Roma. Na época foi dado como acidente aéreo, mas hoje em da fala-se sobre encomenda de morte pela máfia. O filme apresenta Enrico como um homem que ao invés de negociar com os petroleiros americanos, decide negociar com os árabes. provocando a ira de várias esferas.
A edição do filme é um primor, alternando passado e presente, em construção digna dos melhores filmes políticos de Costa Gavras. A fotografia é de Pasqualino De Santis , que fotografou obras-primas como "Romeu e Julieta", de Zefirelli, e "Morte em Veneza", de Visconti. A trilha hipnótica é de Piero Piccioni. O filme pode parecer aos dias de hoje bem datado, mas ainda assim é um exemplar excelente do melhor do gênero político.