sábado, 30 de julho de 2022

Dudecreeps


 "Dudecreeps", de Dylan Hamilton-Smith (2020)

Escrito e dirigido por Dylan Hamilton-Smith, 'Dudecreeps" é um ótimo e criativo curta de terrir, trazendo dois pontos de vista sobre uma mesma história, sendo um olhar feminino e outro masculino.

Voltando de um cooper pelo quarteirão, Janine (Barbie Robertson) chega em casa e encontra seu namorado preparando um jantar. Após tomar banho, ela encontra a casa escura e seu namorado agora está com instinto assassino. Pelo ponto de vista masculino, Nathan é atacado por um alienígena e é possuído.
Fazendo homenagem ao cinema de terror dos anos 80, incluindo trilha sonora de sintetizadores, o filme é uma delícia para cinéfilos, que ficam buscando as referências. A fotografia é bem típica da época, com muitas cores, e os atores estão super dentro da proposta inusitada do filme. Assusta mas também faz rir do deboche e da paródia.

Animais


 "Animals", de Nabil Ben Yadir (2021)

Com 40 minutos de espancamento ininterruptos de 4 homofóbicos contra um jovem gay, "Animais" é um dos filmes mais cruéis que já assisti. O filme é inspirado em uma história real: o assassinato de Ihsane Jarfi, considerado o primeiro assassinato homofóbico na Bélgica.

"Animais" é um premiado drama belga dividido em 3 atos: o filme se passa na noite do assassinato de Brahim. No 1o ato, é a noite do aniversário da mãe dele, onde ele pretende anunciar a toda a família e amigos que é homossexual. Mas seu irmão, o único que sabe o proíbe e Brahim sai da festa. No 2o ato, Brahim vai até um bar gay e na saída, pega carona com 4 rapazes, que se revelam homofóbicos e o espancam em um terreno baldio até à morte. No 3o ato, na manhã seguinte, acompanhamos um dos assassinos e entendemos a violência doméstica que ele sofre em casa.
Souflane Chilah, no papel de Brahim, é extraordinário em sua força e sua dor. As cenas em que é espancado é de uma verdade e brutalidade que fico pensando na preparação do filme e no seu envolvimento com os outros 4 atores, também excelentes. A narrativa do filme me remeteu ao premiado "Kinatay", de Brillante Mendoza, que também se passa em uma noite, mostrando o sequestro e assassinato de uma prostituta em tempo real, e a manhã seguinte de uma das testemunhas do crime.
É impossível indicar esse filme a alguém, dada a sua violência e crueza. Mas é um primor na direção, montagem, fotografia, roteiro e principalmente, atuações.

Paradise highway


"Paradise highway", de Anna Gutto (2022)

Drama independente americano escrito e dirigido pela cineasta Anna Gutto, tem um dos castings mais bizarros que vi recentemente. A musa francesa Juliette Binoche interpreta uma caminhoneira americana de estradas, irmã de sangue de Frank Grillo, um ator americano. Juliette tentando fazer a americana nascida nos Estados Unidos, falando de forma coloquial, repleta de palavrões, é estranhíssimo. Mas enfim, é Juliette Binoche, e aí o espectador fã da atriz acaba relevando isso. O elenco também tem Morgan Freeman, pela enésima vez interpretando um policial investigativo.

Juliette é Sally, uma caminhoneira solitária que tem como companheiras, as outras caminhoneiras, com quem conversam pelo rádio. O irmão de Sally, Dennis (Frank Grillo) está preso, e para que ele não leve surra dentro do presídio, Sally é obrigada a fazer carregamentos ilícitos pela estrada. Na última visita, Sally descobre que precisa levar uma menina de 10 anos , Leila (Hala Finley) como carregamento de tráfico de garotas para fins sexuais. Sally aceita, para evitar que batam em Dennis, mas no caminho vai se envolvendo com Leila e acaba ficando em um grande conflito.
Histórias de pessoas solitárias e broncas que se envolvem com crianças já vimos inúmeras vezes, sendo uma das mais conhecidas "O assassino", com Nathalie Portman, ou "Gloria", de John Cassavettes. O desfecho já conhecemos, então o que vale é assistir performances. Binoche arrasa, mas o filme é óbvio demais e longo, e não oferece surpresas.

sexta-feira, 29 de julho de 2022

Urubus


 "Urubus", de Claudio Borrelli (2020)

Premiado drama brasileiro, rodado em São Paulo e baseado em história real. O filme é uma reconstituição de um fato que ocorreu em São Paulo em outubro de 2008, na 28a Bienal de São Paulo: um grupo de pixadores, liderados por Djan Ivson (ou Cripta Djan, como é conhecido nas ruas) virou notícia ao invadirem um andar da Bienal e pixarem todas as paredes brancas. Esse andar abria as portas com um andar inteiro vazio, numa metáfora da crise conceitual que assolava a arte tradicional. Apelidou-se aquela edição como a "Bienal do Vazio" e foi um chamariz para os pixadores. Eles foram presos, mas a notícia correu mundo e logo depois, os pixadores foram convidados para bienais de vários países europeus. Anos depois, a própria Bienal os convidou para exporem sua arte, oficialmente. Com produção executiva de Fernando Meirelles e preparação de elenco de Fátima Toledo, o excelente elenco é liderado pelos ótimos Gustavo Garcez, como Trinchas, nome fictício para Cripta Djan, e Bella Camero, como a documentarista Valeria . Ambos, de mundos e identidades culturais diferentes, acabam se apaixonando.

Ambientado na noite da metrópole paulistana, o filme é como uma adaptação hip hop de Romeu e Julieta, com a retratação da violência da periferia paulistana.

Homens selvagens


 "Vildmaend", de Thomas Daneskov (2021)

Premiada comédia dramática dinamarquesa,"Homens selvagens" tem como protagonista Martin (Rasmus Bjerg), um homem na meia idade que entra em crise por achar que sua esposa e filhas o acham um fracassado. Martin mente para elas que irá para uma reunião de trabalho e decide viver como um viking: morando solitário nas montanhas, vivendo de caça e sem qualquer tipo de modernidade. Mas quando ele percebe que a vida selvagem é complexa, ele vai até uma loja de conveniências e, sem dinheiro, rouba comida e bebida. Voltando para a floresta, ele encontra um carro acidentado, onde o traficante Musa (Zaki Youssef) se encontra. Ee cuida do rapaz, e a dupla acaba sendo caçada pela polícia.

Com muito humor, mas também drama e pitada de filme policial, "Homens selvagens" tem em seu protagonista um excelente ator: Rasmus Bjerg faz o seu personagem com bastante verdade, acreditando nele, e isso é fundamental para que o filme não vire uma chanchada. Lindas locações na Noruega e uma fotografia deslumbrante.

quinta-feira, 28 de julho de 2022

Ennio, o Maestro


"Ennio", de Giuseppe Tornatore (2022)

Dois arrependimentos na vida, um meu, e outro de Morricone: o meu foi de não ter assistido ao concerto do Maestro quando esteve no Teatro Municipal do Rio de Janeiro em maio de 2007. O de Morricone, foi de não ter feito a trilha de "Laranja mecânica", de Kubrick, por pura sabotagem de Sergio Leone, que sem avisar Morricone, disse à Kubrick que ele estava ocupado fazendo a trilha de "Um punhado de dólares".

Nascido em 10 de novembro de 1928 e falecido em 6 de julho de 2020, aos 91 anos, Morricone foi 6 vezes indicado ao Oscar: "Cinzas no paraíso", "A missão", "Os intocáveis", "Malena", "Bugsy" e "Os 8 odiados", pelo qual ganhou finalmente o Oscar em 2016 ( ele havia ganho um Oscar honorário em 2007). Morricone deu entrevista para o cineasta Giuseppe Tornatore entre 2015 a 2019, em sua casa, em Roma. Para Tornatore, sue amigo, ele já havia composto várias trilhas, como a inesquecível de "Cinema Paradiso" e "Malena". O filme acompanha de forma cronológica toda a história musical de Morricone: querendo ser médico, foi obrigado pelo sue pai a se tornar músico para sustentar a casa. Desde a primeira trilha, composta em 1962, até a sua morte, ele compôs 528 trilhas. Somente em 1969, foram lançados 29 filmes!!! com trilha assinada por ele. Trabalhando em todos os gêneros: comédia, romance, drama, histórico, terror, faroeste, guerra, Morricone trabalhou com inúmeros e famosos cineastas, e boa parte dá entrevista no filme, além de compositores: Bertolucci, Roland Joffé, Clint Eastwood, Quincy Jones, etc, além de músicos como Bruce Springsteen e Pat Metheny.
Assistir a esse documentário imperdível e obrigatório é um verdadeiro passeio pela história do cinema, tanto em termos de imagem, quando musical. Dá vontade de ver e rever todos os filmes apresentados, além de escutar as trilhas. Impossível não se emocionar.

A taça partida

"La taza rota", de Esteban Cabezas (2021)
Drama chileno que tem como tema o relacionamento tóxico e a masculinidade possessiva e destrutiva. Rodrigo (Moisés Angulo) já teve esposa, filho e uma casa. A ex agora está casada, e mora com um novo namorado na casa. Rodrigo decide que vai recuperar tudo o que perdeu. Na espreita, ele arma uma situação para entrar na casa quando o namorado da ex sai, alegando querer visitar o filho.
Um filme que fala sobre relacionamentos perigosos e abusivos, infelizmente tema muito comum hoje em dia, onde vemos mais e mais casos de feminicídios. O filme vai em um crescendo de suspense psicológico, sem sabermos aonde chegará o seu desfecho. Um protagonista irritante, perigoso, defendido com garra pelo ator Moisés Angulo.

 

quarta-feira, 27 de julho de 2022

A ausência que seremos


 "El olvido que seremos", de Fernando Trueba (2021)

Premiado drama autobiográfico, adaptado do livro de memórias escrito por Héctor Abad Faciolince e centra-se em seu pai, Héctor Abad Gómez, um proeminente médico e ativista de direitos humanos na polarizada e violenta Medellín dos anos 70. Suas críticas ao regime colombiano levaram ao seu assassinato por paramilitares em 1987. Fernando Trueba, o diretor espanhol, é realizador de importantes filmes, como "A dançarina e o ladrão", 'Chico e Rita".

Hector Abad Gómez (Javier Camara, ator fetiche de Almodovar) nasceu em Medellin, e é adorado por sua família, por seus alunos e pela comunidade local, em cujas ruas ele é uma figura inspiradora, fazendo proselitismo pelo que chama de cinco direitos humanos básicos: ar, água, comida, abrigo e afeto. Mas ele é continuamente assediado pelas autoridades por essas visões progressistas e forçado a tirar uma licença sabática evasiva no exterior em um estágio e, finalmente, se aposentar antecipadamente.
O filme, rodado em preto e branco e cores, é narrado em tom de memória, apresentando Hector desde os anos 70 até o ano de 1987. O filme tem uma excelente reconstituição de época, com bons atores, direção de arte e figurinos competentes. É um libelo contra a intolerância, contra uma extrema direita violenta que massacra o pensamento libertador. Um filme comovente, com atuação espetacular de Javier Camara.

terça-feira, 26 de julho de 2022

Swingin


 "Swingin", de Guo Shang-Sing (2020)

Premiado curta LGBTQIAP+ de Taiwan, 'Swingin" tem como protagonista Qiu Qiu, um menino de 10 anos que mora com seus pais, um jovem casal gay. O pai biológico de Qiu Qiu se separou de sua esposa assim que se apaixonou pelo seu marido, um músico de jazz afeminado. Qiu Qiu é apaixonado por uma colega, mas por ser filho de um casal gay, todos na escola acreditam que ele também é gay. Qiu Qiu se revolta contra os seus pais e foge de casa.

Alternando drama e comédia, 'Swingin" é um delicado filme que trata de temas importantes como homofobia, amizades, primeiro amor e relacionamento familiar. O pequeno ator que interpreta Qiu Qiu é uma graça, e o filme tem uma bela trilha sonora composta por jazz.

Montana story


 "Montana story", de Scott McGehee e David Siegel (2021)

Premiado drama independente americano, rodado em Montana e com imagens belíssimas em cinemascope. O filme é um drama intimista e doloroso sobre dois irmãos que se reencontram 7 anos depois. Eles seguiram caminhos distintos após um evento violento que ocorreu na fazenda do pai deles, Wade. Ele, um fazendeiro e pai abusivo, agora está em coma após um derrame. Erin (Haley Lu Richardson) trabalha como cozinheira no norte de New York. Cal (Owen Teague) mora em Cheyenne e estuda para se tornar engenheiro civil. Cal quer vender a fazenda, e o reencontro com sua irmã fará os dois se lembrarem de traumas do passado.

Com ótimas performances de Owen Teague e Haley Lu Richardson, o filme segue bastante lento, com um ritmo muitas vezes arrastado, mas que compensa pelo visual impecável e pelas atuações repletas de nuances.

segunda-feira, 25 de julho de 2022

Meu nome é ninguém


 "Il mio nome é nessuno", de Tonino Valerii (1973)

Uma grande obra prima do cinema, com roteiro de Sergio Leone e dirigido pelo seu assistente de direção de seus clássicos, Tonino Valerii. Muitos dizem que foi Leone quem dirigiu, pois toda a narrativa, decupagem e visual é exatamente o que Leone fez em seus grandes faroestes. A trilha sonora de Ennio Morricone é tão épica e emocionante que me fez chorar só de escutar enquanto assistia ao filme. O dado curioso é que o cineasta John Landis diz ter feito figuração no filme, rodado no Novo México.

Jack Beauregard (Henry Fonda, em seu último faroeste) é um pistoleiro já na terceira idade e que deseja se aposentar. Ele quer seguir para a Europa e ficar por lá. Mas no seu caminho surgem pistoleiros que querem matá-lo. Um forasteiro chamado Ninguém (Terence Hill) tem Jack como sue ídolo e decide ajudá-lo a fazer um último roubo de carga.
Com dois super astros no elenco, Henry Fonda e Terence Hill, o filme é um primor de construção de cenas e de imagens belamente enquadradas. Com centenas de figurantes e muitos efeitos práticos ( a cena de Terence Hill atirando em um anão na perna de pau é espetacular), o filme encanta, emociona e faz a gente torcer pela dupla. Certamente Os trapalhões chuparam muito de Terence Hill, que faz um humor visual muito bizarro e cáustico, como os tapas no bandido no salão. A cena do jogo de espelhos no parque de diversões é um primor de fotografia. A sequência de abertura, uns 10 minutos silenciosa, relembra 'Era uma vez no Oeste". O desfecho é arrepiante, todo narrado em off por Henry Fonda.

domingo, 24 de julho de 2022

O pacto


 "Pagten", de Billie August (2021)

Um drama que renderia uma excelente peça de teatro para 5 atores, 3 mulheres e 2 homens, "O pacto" é a adaptação do livro autobiográfico do escritor dinamarquês Thorkild Bjørnvig (1918-2004), em que narra a estranha amizade com a prestigiada romancista Karen Blixen entre 1948 e 1955. Karen Blixen ficou famosa por ter escrito o livro autobiográfico "Out of Africa", mais conhecido como "Entre dois amores", protagonizado por Meryl Streep e vencedor do Oscar de melhor filme. Ela também escreveu, entre outros, 'A festa de Babette", que também foi adaptado aos cinemas e ganhou o Oscar de filme estrangeiro. Já o cineasta Billie August é um dos raros realizadores duplamente premiado com a Palma de ouro de melhor filme por "As melhores intenções" e "Pelle, o conquistador", este também vencedor do Oscar e Globo de ouro de filme estrangeiro. Depois de retornar da África, a baronesa Karen Blixen (Birthe Neumann) se torna uma referência para a nata intelectual da Dinamarca, recebendo artistas em sua casa para saraus. Ela acaba conhecendo o jovem Thorkild (Simon Bennebjerg) , casado com Grete (Nanna Skaarup Voss, excelente) e com um filho pequeno. Ela lhe propõe um pacto: ela irá ser a tutora de Thorkild e o fará ser um famoso escritor apresentando-o à nata cultural. Thorkild fica fascinado com o estilo de vida rico de Karen, cercada por artistas, e acaba aceitando o pacto, botando em risco o seu casamento. Karen o manipula e o pacto se torna uma relação de poder, onde Karen o obriga a realizar tudo contanto que tenha que obedecê-la cegamente.

Impossível não pensar em "Crepúsculo dos deuses", ou até mesmo em Fausto, nessa fábula sobre ambição e relacionamento tóxico e manipulativo. Os atores estão todos excelentes, com destaque para Nanna no papel de Grete, a esposa que se angustia pela possibilidade de perder o marido. Ótima direção de arte e figurinos em um drama intenso, e que eu espero tenham exagerado na descrição de Karen, pois ela está em um perfil bem vilanesco no filme.

Leonora, adeus


 "Leonora addio", de Paolo Taviani (2022)

Premiado no Festival de Berlim com 2021 o troféu Fipresci, "Leonora, adeus" é um filme que tem como tema principal a morte. O filme começa com a cartela "Adeus, Vittorio", que vem a ser o irmão do roteirista e cineasta Paolo Taviani. Juntos, eles filmaram 28 filmes, mas Vittorio veio a falecer em 2018. Paolo dedica o filme ao irmão, autores de obras primas como Pai patrão", "Kaos", "A noite de São Lourenço", 'Alonsonfan". "Leonora, adeus" é um curioso filme que tem o autor Luigi Pirandello (1867-1936), premiado com o Nobel da literatura costurando os dois segmentos do filme. No 1o, em preto e branco, acompanhamos o delegado Agrigento (Fabrizio Ferracane) acompanhando a urna contendo as cinzas de Pirandello até a Sicília, um pedido do autor antes de sua morte. O corpo do autor é retirado de um cemitério fascista de Roma e levado de trem até a Sicília. No entanto, vários passageiros reclamam sobre a presença das cinzas no trem. No 2o segmento, agora em cores, é a adaptação de um conto de Pirandello chamado "O prego": um imigrante italiano mora no Brooklyn e trabalha com seu pai em um restaurante italiano. Durante um momento de descanso, ele caminha nas redondezas e presencia um enorme prego caindo de uma carroça.. Em seguida, ele avista duas meninas brigando entre si, e chega na menor e a mata com o prego. Ao ser preso, ele diz que "o prego caiu de propósito, e as meninas também surgiram de propósito, como se fossem um chamado, algo que teria que acontecer". O menino jura que vai visitar o túmulo da menina todos os anos até morrer.

A forma como Paolo narra o filme faz parecer que ele mesmo está realizando o filme como seu último filme, um canto do cisne. É um filme em tom melancólico, apesar de certo humor na primeira história. Requinte de direção de arte e figurinos, não é o melhor Taviani, mas vale ser visto pela sobriedade e delicadeza com que filma uma história tão inusitada como o enterro de Pirandello, recheada com cenas de "Roma, cidade aberta", de Rosselini.

Agente oculto


 "The gray man", de Anthony Russo e Joe Russo (2022)

Você sabe que tem algo estranho em um filme quando no prólogo o protagonista Six (Ryan Gosling) é apresentado, corta para 18 anos depois, e ele está exatamente com a mesma cara. Mais: o filme é divulgado como o de orçamento mais caro da Netflix, 200 milhões de dólares, e no final, o que fica, é apenas as imagens de explosões e tiroteios genéricos já vistos em muitos filmes. Sim, o filme traz todas aquelas referências de Jason Bourne, John Wick e aquela cacetada de assassinos que são contratados para matar o mocinho, e dou um doce para quem adivinhar como será o final.

No mega giga elenco que consumiu boa parte do orçamento, temos Gosling, Chris Evans, Ana de Armas, Billy Bob Thornton, Regé-Jean Page e entre outros, Wagner Moura em um personagem esquisitíssimo que mais parece um quasímodo, no papel de um falsificador de passaportes. Como sou fã do Gosling, assisti até o fim. Mas deu canseira. Melhor ficar com as lindas imagens de Praga, onde boa parte do filme foi rodado.

sábado, 23 de julho de 2022

A Chiara


 "A Chiara", de Jonas Carpignano (2021)

O realizador italiano Jonas Carpignano finaliza a sua trilogia sobre a região da Calábria com esse contundente e dramático "A Chiara", depois de "Mediterrâneo"e "A ciambra". O filme venceu um prêmio especial na Quinzena dos realizadores de Cannes e assim como seus outros filmes, trabalha com não atores, na melhor tradição do ne realismo italiano. A família Guerrasio e seus amigos se reúnem para comemorar o aniversário de 18 anos da filha mais velha de Claudio e Carmela. Giullia. Na mesma festa se encontra Chiara, filha mais jovem do casal, de 15 anos, a favorita do pai. No dia seguinte, o carro de Claudio explode na frente da casa e ele desaparece. Chiara descobre pela internet que seu pai é um mafioso foragido, e se espanta que nunca soube nada sobre ele, nem mesmo sua família havia contado nada sobre os negócios escusos dele. Chiara decide buscar o paradeiro do pai e entender os motivos dele para entrar na máfia.

Um filme longo, com 2 horas de duração, e que poderia ter sido enxugado em pelo menos 20 minutos. Ainda assim, é um filme que vale a pena ser visto, pelo seus temas e pela forma como o protagonismo de Chiara ganha força ao longo da narrativa.

Passagem secreta


 "Passagem secreta", de Rodrigo Grota (2021)

Filmes infanto juvenis brasileiros são sempre bem vindos. "Passagem secreta" tem roteiro de Roberta Takamatsu e foi todo rodado em Londrina, Paraná. Na cartela final, o filme se vangloria de ter oferecido 105 empregos diretos e 225 indiretos. Pegando carona em produções como "Stranger things", "Os Goonies". "Alice no país das maravilhas"e "O mágico de Oz" e muitas outras aventuras , o filme se ambienta na década dos anos 80, e apresenta como protagonista Alice (Luiza Quintero), uma adolescente que vai morar com o seu tio (Fernando ALves Pinto), após a separação de seus pais. Se sentindo deslocada e solitária, ela faz amizade com 3 adolescentes na escola, e todos sofrem bullying. Uma noite, durante um passeio em um parque de diversões, um dos amigos desaparece. Ao procurá-lo, Alice encontra uma passagem secreta, e ali se depara com um mundo governando por um vilão (Arrigo Barnabé).

Apesar de todas as boas intenções do projeto, o filme sofre de 3 quesitos que o impedem de alçar vôos maiores: ritmo arrastado, um roteiro que se esforça em encontrar o seu público ( ora pende para um drama adolescente, ora para uma aventura infantil) e atores em sua maioria ainda bastante crus. Louva-se a realização do projeto e ter dado emprego a tanta mão de obra local, e que tenha servido de base para uma formação técnica ainda mais apurada em uma eventual continuação.

sexta-feira, 22 de julho de 2022

Boa sorte, Leo Grande


"Good luck to you, Leo Grande", de Sophie Hyde (2022)
Por favor, atores do Brasil: comprem urgente os direitos desse roteiro e montem o espetáculo aqui, é um presente e certamente, com direito a muitas premiações!
Dito isso, o filme com um brilhante e perspicaz roteiro escrito por
Katy Brand e dirigido com muita delicadeza e inteligência por Sophie Hyde contribuem para que os únicos 2 atores do filme,
Nancy (Emma Thompson) e Leo Grande (Daryl McCormack) explodam em cada cena com performances poderosas e comoventes, com camadas de emoções que vão da comédia ao drama, romance e, melancolia e muita malícia. A se elogiar a atitude de Emma Thompson de se mostrar nua em cena com nudez frontal, uma linda decisão para trazer a auto-estima que a sua personagem vai ganhando ao longo da narrativa.
Nancy é viúva. Professora, religiosa e conservadora, ela nunca teve um orgasmo com o seu marido, o único homem com quem ela manteve relações sexuais. Ela sente que agora é a hora de provar as delicias da carne, e assim, aluga um quarto de um hotel em Londres e contrata os serviços do garoto de programa Leo Grande, de vinte e poucos anos. O filme se passa quase todo no hotel e é dividido em capítulos, cada um, um encontro entre os dois. temas como envelhecimento, conservadorismo, sociedade patriarcal, machismo, religiosidade, sexualidade, etarismo e comércio sexual são apresentados de forma crua e bastante convincente nos diálogos. Assistir esses dois grandes atores, e principalmente, acompanhar a força do jovem Daryl McCormack de fazer verdadeiros tour de force com a deusa Emma Thompson, não é para qualquer um. Um excelente e obrigatório filme.

Guermantes


 "Guermantes", de Christophe Honoré (2021)

Eu sou um grande fã da filmografia do cineasta francês Christophe Honoré. "Quarto 212", "Comer, viver, conquistar", "Em Paris", "Canções de amor", Minha mãe", entre outros. Mas alguns filmes são chatos e pretensiosos, como "Homem no banho", "Metamorphoses".

"Guermantes" entra no 2o time de filmes que não curti. O filme parte de uma premissa que se tornou comum nos dias de hoje, que é fazer metalinguagem do processo de realização teatral: foi assim em "Drive my car", e em 'Antígona 442 AC", com Andréa Beltrão. Filmes que discutem o processo criativo entre o diretor e a trupe teatral, mostra os ensaios, as crises, conflitos, falta de patrocínio. "Guermantes" é um filme ambientado durante a pandemia da covid, e portanto, sofreu, como tantos outros milhares de espetáculos, o cancelamento durante os ensaios, por total impossibilidade de se apresentar a um público ( isso em 2020). Honoré mistura documentário com algo de ficção. A famosa cia de teatro Comédia française está ensaiando "Guermantes", texto de Marcel Proust. O diretor Honoré e os atores da trupe optam por continuar os ensaios no teatro Marigny.
Durante longos 140 minutos, acompanhamos como voyeurs pequenos conflitos entre os atores e o diretor, influenciados pelo desgaste da covid, mas também falando de processo criativo dentro da coletividade. Para quem gosta de teatro, é um filme a se apreciar.

Pluft, o fantasminha


 "Pluft, o fantasminha", de Rosane Svartzman (2021)

Segunda adaptação cinematográfica da obra infantil escrita em 1955 pela autora Maria Clara Machado. A primeira versão foi lançada em 1962 e contava com trilha de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, e agora, a trilha é do craque Tim Rescala, com música de Frejat e Simone Mazzer. No elenco, as crianças Lola Belli e Nicolas Cruz dão vida à Maribel e Pluft, ela de carne e osso, e ele, fantasminha. Quando Maribel é sequestrada pelo pirata perna de pau (Juliano Cazarré) para que ela revele aonde está escondido um tesouro em uma mansão abandonada, Pluft surge para ajudá-la, apesar dele ter medo de gente. Fabiula Nascimento interpreta a Mãe Dona Fantasma, e José Lavigne o Tio. Um trio de marinheiros trapalhões que vão tentar salvar Maribel é formada por Lucas Salles, Hugo Germano e Arthur Aguiar, Os efeitos de pós produção para criar o efeito do fantasma foram rodados em câmeras submarinas, e levaram anos para serem finalizados. É um filme lúdico, que fala sobre o valor da amizade, e fará a festa dos pequenos. Ótima direção de arte e figurinos.

Ela vai


 "She will", de Charlotte Colbert (2021)

Produzido pelo mestre Dario Argento, e fazendo uma homenagem à sua obra prima 'Suspíria", "Ela vai" levou o importante prêmio de melhor 1o filme em Locarno, Escrito e dirigido pela cineasta Charlotte Colbert, o filme é um terror psicológico que traz temas como bruxaria, assédio sexual e moral junto da questão do #metoo, representado de forma alegórica através de lama e nuvem preta repleta de cinzas que surgem na vida da protagonista Veronica (Alice Krige), uma atriz decadente e que aos 13 anos obteve o auge na sua carreira, ao protagonizar o filme do Cineasta Hathbourne (Malcolm McDowell). Veronica realiza uma cirurgia de mastectomia e decide partir para um refúgio na Escócia, junto de uma enfermeira, Desi (Kota Eberhardt). O cineasta Hathbourne decide fazer um remake do filme e esse anúncio traz para Veronica fantasmas do passado, mais precisamente, o estupro que sofreu quando criança nas mãos dele. Veronica descobre que o retiro foi local de queima de bruxas há centenas de anos, e que as cinzas delas agora surgem para assombrar Veronica.

Com um ótimo roteiro e excelentes atores, incluindo os veteranos Malcom Macdowell e Ruppert Everett, "Ela vai" é conectado com os dias de hoje, onde cancelamento e denúncias de assédio surgem a todo momento. Fotografia soturna, com pontos de vermelho, e uma trilha sonora gótica ilustram esse pesadelo que mescla fantasia e a triste realidade de milhões de mulheres.

quinta-feira, 21 de julho de 2022

Antígona 442 A.C.


 "Antígona 442 A.C.", de Maurício Farias (2021)

Criativa e instigante peça filmada da montagem teatral "Antígona 442 A.C.", dirigida por Amir Haddad e protagonizado por Andrea Beltrão, desde 2016. Esse filme, no entanto, dirigida por Maurício Farias, foi rodado em plena pandemia, após uma das últimas temporadas do espetáculo ter sido abruptamente interrompida com o surgimento da Covid 19.

Misturando documental, montagem teatral e narração, o filme ainda traz o contexto da pandemia, com técnicos e Andrea chegando ao teatro e iniciando o processo de trabalho usando máscaras, e metáforas à situação caótica do Brasil em termos políticos e sociais.
O texto é adaptado da versão brasileira traduzida por Millor Fernandes, da obra original de Söfocles, escrita por volta de 442 A.C, fazendo parte da trilogia tebana, Édipo Rei e Édipo em Colono. A personagem título é Antígona, filha de Édipo, e irmã de Etéocles e Polinice. Filha do incesto de Édipo e Jocasta, Antígona contraria ordem oficial do rei de Tebas, Creonte, que veta o enterro de um dos irmãos dela, Polinices, por considerá-lo traidor. O primogênito morre em campo de batalha vítima do caçula Etéocles, que tampouco sobrevive ao enfrentamento pelo poder.
Para espectadores que como eu, têm pouca intimidade com os personagens, que são muitos e chegam a ficar confusos ao tentar relacionar aa conexão entre eles, o espetáculo procura facilitar o entendimento, com cartazes colados na parede por Andrea Beltrão e didaticamente explicando sobre cada um dos integrantes da linhagem genealógica.
Com 70 minutos de duração, é um tour de force de Andrea, representando diversos personagens e fazendo uso de elementos cênicos e de arte para expôr a faceta de uma sociedade déspota e machista.

quarta-feira, 20 de julho de 2022

O ruído dos motores


 "Les bruits des moteurs", de Philippe Grégoire (2021)

Um filme excêntrico que lembra a filmografia de Mika Kaurismaki, repleto de humor patético e bastante visual, "O ruído dos motores" é a estréia na direção do roteirista e cineasta canadense Philippe Grégoire, rodando seu filme em Navierville, Quebec e na Islândia. O filme é semi-autobiográfico: Gregire foi fiscal da alfândega de fronteira para poder custear os seus filmes.

Alexandre (Robert Naylor) é um jovem que trabalha como fiscal na fronteira. Com a nova legislação, ele precisa ensinar a todos os companheiros a manusearem armas de fogo, por conta dos imigrantes ilegais. Após fazer sexo com uma colega ue acaba tendo crise de asma e seguir pro hospital, Alexandre é repreendido pela inspetora, que o assedia sexualmente. Se recuando a faezr sexo com ela, ele é repreendido e fica de licença. Alexandre retorna para o seu vilarejo e vai morar com sua mãe, dona de um autódromo. Alexandre conhece uma turista e corredora islandesa,
Aðalbjörg (Tanja Björk) e ela o obriga a mostrar a cidade. Enquanto isso, Alexandre é acusado pela polícia local de estar espalhando cartazes com imagens pornográficas com seu rosto estampado.
Com um humor bastante peculiar, "O ruído dos motores" tem momentos surreais e um elenco totalmente entregue às propostas da direção. Mas tem um desfecho estranho, e variações nna narrativa que o levam a um lugar estranho, parecendo estarmos assistindo a dois filmes diferentes. Fica a curiosidade.

As fitas pornôs do meu pai morto


 "My dead dad's porno tapes", de Charlie Tyrrel (2018)

Excelente curta canadense, vencedor do melhor filme do SXSW, concorrendo em Sundance e vencedor de diversos prêmios em importantes Festivais. Foi considerado pela Academia de cinema canadense como um dos 10 melhores filmes de 2018, sendo inclusive indicado ao Oscar de curta.

Misturando áudios, fotos, super 8, VHS, animação, stop motion e narração, o roteirista e cineasta Charlie Tyrell, de forma bastante criativa, apresenta ao espectador quem foi seu pai, uma figura abusiva que ele mesmo desconheceu a fundo, e assim, entender os motivos de tanta animosidade e distanciamento entre o pai e a família. Vasculhando os pertences do pai, Charlie encontrou dezenas de fitas VHS pornôs, e assim, parte para uma divertida, dramática e comovente constatação e entendimento.
Charlie descobriu que talvez um dos motivos da agressividade do pai, fossem os maus tratos que a sua avó fazia contra sue pai. E ela, por sua vez, ter sofrido violência doméstica de sue pai, que a ameaçou com faca e cortou a mão dela. Uma história de violência que percorreu gerações. Um filme muito criativo, instigante e revelador sobre o que se esconde entre 4 paredes e uma família aparentemente normal.

Lua azul


 "Crai nou", de Alina Grigore (2021)

Intenso drama romeno, vencedor do prêmio de melhor filme no prestigiado San Sebastian em 2011. Com atuações vigorosas de todo o elenco, acompanhamos Irina ( Ioana Chitu ), 22 anos , que deseja deixar as belas montanhas da Romênia rural para a capital, Bucareste, para se livrar de sua família autoritária. Ela mora em um resort hoteleiro nas montanhas, que pertence a seu pai, mas é administrado pelos primos de Irina. Seu pai vive em Londres após o divórcio com a mãe de Irina, que nada faz quando Irina é abusada moralmente pelos primos, que a escravizam. Por ser a única com estudos, ela é relegada a ser a contadora. Sua irmã, Viki, tenta defender Viki dos abusos, mas ela está mais preocupada com o namoro com um rapaz e fugir com ele. Viki deseja estudar em uma faculdade em Bucareste, mas todos são contra, pois não querem que ela largue o trabalho no hotel. Ao acordar de uma festa, Viki descobre que um homem mais velho fez sexo com ela, irando sua virgindade. Ele alega que foi consensual, mas Viki se aproveita desse contexto para fazer com que o homem a leve embora dali.

O filme é repleto de personagens e acaba confundindo o espectador com muitos sub-plots, podendo ter feito como os irmãos Dardenne, ter focado apenas nos conflitos da protagonista. Mas ainda assim, é um filme interessante, com discussões sobre patriarcado, misoginia, repressão, anti-semitismo.

terça-feira, 19 de julho de 2022

Regina


 "Regina", de Alessandro Grande (2021)

Drama de estréia do cineasta italiano Alessandro Grande, que co-escreveu o roteiro. O filme traz um drama psicológico e intimista da jovem protagonista Regina (Ginevra Francesconi). 15 anos, órfã de mãe e morando com o seu pai., Luigi. Regina sonha em se tornar cantora, com a ajuda do pai, também cantor mas que abandonou a carreira para ficar perto da filha e poder sustentar os dois. Ele faz de tudo para apoiar a filha na cantora de filha. Luigi trabalha em um hotel, e nas horas vagas, passeia coma filha de barco em um lago. Em um desses passeios, no entanto, Luigi atropela e mata acidentalmente um mergulhador. Para espanto de sua filha, ele foge do local do acidente, sem prestar socorro, e sua filha passa a fragilizar a sua relação com o pai, até então, um ideal de integridade a ser seguido.

Com boa perfomance da jovem Gineva Franciscone, o filme traz grandes dilemas ao universo adolescente, em tom melancólico e desesperançoso. Com boa direção, o filme traz elementos melodramáticos, mas que sustenta a atenção do espectador justamente pela atuação da protagonista, repleta de camadas.

segunda-feira, 18 de julho de 2022

Assim como no céu


"Du som er ir hinlem", de Tea Lindeburg (2021)

Premiado drama dinamarquês, "Assim como no céu" é adaptação do romance

"A Night Of Dying" , de Marie Bregendahl, lançado em 1912.
O filme é escrito e dirigido por mulheres e apresenta uma sociedade quase feudal no início do século XIX em uma fazenda rural no interior da Dinamarca. Ali vive Lise (Flora Hoffman Lindahl, excelente), uma menina de 14 anos repleta de sonhos. A sociedade paternalista permite que a mulher tenho muitos filhos. Lise tem muitos irmãos. A mãe dele está grávida novamente, e diz que Lise siga para a escola, sendo a única a poder frequentar. Lise também flerta com o filho do fazendeiro vizinho. Mas quando sua mãe sofre complicações no parto, Lise teme que ela precise assumir o matriarcado, e assim, desistir de seus sonhos.
Um filme denso, quase Bergmaniano, claustrofóbico, totalmente baseado nas fortes performances e na fotografia angustiante. Certamente renderia uma excelente peça de teatro.

domingo, 17 de julho de 2022

Arthur, maldição


"Arthur, malediction", de Barthélémy Grossmann (2022)
Pegando a recente onda de adaptações de filmes infantos mas transformados em filmes de terror, como "Banana Split" e "O ursinho Pooh", ícones do imaginário infantil, transformados em serial killers, Luz Besson fez o mesmo com sua franquia "Arthur". O cineasta e produtor Luc Besson, um dos mais atuantes do cinema comercial na França, lançou uma série de livros infantis sobre o universo fantástico 'Arthur e os Minimoys" nos anos 2000, e adaptou para o cinema a trilogia de sucesso iniciada em 2006, estrelada por Freddie Highmore, Mia Farrow e Selena Gomes.
Com o roteiro escrito por Luc Besson, dirigido por Barthélémy Grossmann e co-estrelado pela filha de Besson, Thalia Besson, "Arthur, maldição" se inicia em 2006, com um grupo de 8 crianças, todos amigos, liderados por Alex e reunidos em sua casa, assistindo pela milésima vez "Arthur". 10 anos se passam, e todos agora, ainda amigos, resolvem comemorar o aniversário de Alex lhe dando um presente inusitado: irão passar um final de semana no local de filmagem real dos filmes de Besson, ambientado em Connecticut mas filmado na Normandia, França. Chegando lá, encontram a casa intacta, mas logo percebem que pode ser que os vilões de Minimoys existam de verdade, e um a um vão morrendo.

Filmado durante a pandemia do Covid em 33 dias de filmagem, o filme une o universo fantástico com o realismo de serial killers como 'Sexta feira 13" e "O massacre da serra elétrica", suas maiores inspirações. Infelizmente, Luc Besson escreveu um roteiro sem brilho, com personagens estereotipados, uma história mega hiper clichê, com direito ao grupo todo se separar , o que não faz sentido algum. irritante pelas decisões ridículas, o que era para ser algo curioso, vira um filme sem noção e de final ridículo e claro, óbvio. 

Entre dois mundos


 "Ouistreham", de Emmanuel Carrère (2021)

Excelente drama que me fez cair em prantos inúmeras vezes, tal a capacidade de emocionar tanto pela porrada que é a história baseada em fatos reais, quanto pelo trabalho excepcional de todo o elenco do filme, mesclando atores e não atores, capitaneado pela brilhante Juliette Binoche, que por anos tentou comprar os direitos do livro escrito pela jornalista e escritora Florence Aubenas "Le Quai de Ouistreham": Aubenas, de classe média rica, se nfiltra por seis meses no universo de faxineiras que vivem de trabalhos precários. Passando tempo ao lado de mulheres que alternam entre empregos instáveis e períodos de desemprego, ela trabalha em estações de trem, limpeza e conhece a realidade de vida das pessoas que encontra nesses lugares.

Todo mundo sabe que a atriz Frances Macdormand fez um laboratório para seu premiado filme "Nomadland": por meses, ela se infiltrou em empresas trabalhando em serviços precários para entender melhor sua persnagem e o universo dela. mas isso ficou como bastidores, o filme não fala sobre isso. Em "Entre dois mundos", é como se filmássemos todo o processo de Frances MAcdormand. Juliette Binoche faz esse personagem para o filme. Uma espécie de filme de Ken Loach, que fala sobre pobreza, classe trabalhadora, desemprego, amizade real e principalmente, sobre as pessoas invisíveis, que nos filmes de Loach e aqui, são o foco dos filmes.
Hélène Lambert, no papel der Chrystele, faxineira e mãe solteira de três filhos é uma força da natureza, e a construção de sua personagem ao longo do filme é absolutamente comovente. Léa Carne, como Marilou, jovem faxineira, também está fantástica.
O filme sofreu críticas severas por parte da mídia que acusam o filme de explorar a pobreza pelo ponto de vista de uma mulher rica, que possui condições de sobreviver caso não obtenha empregos e não ter como sustentar o aluguel. Mas a forte cena final do filme explicita esse distanciamento entre os dois universos, uma corajosa aposta da direção e dos roteiristas, evitando sentimentalismo. A cena das 3 faxineiras se aproveitando de uma cabine de luxo no navio de passageiros é antológica.

Entre dois crepúsculos


"Iki safak arasinda", de Selman Nacar (2021)
Excelente drama turco, vencedor de prêmios em importantes Festivais de cinema.
O filme me lembrou bastante a obra prima de Elio Petri, 'A classe operária vai ao paraíso", porém a diferença que aqui é pelo ponto de vista dos patrões.
Em uma fábrica têxtil, um dos funcionários usa uma máquina defeituosa sem tomar as devidas precauções e sofre uma lesão grave que o leva ao hospital. A responsabilidade de garantir que ele esteja seguro e tenha os recursos para se recuperar recai sobre os donos das fábricas, que sentem o ônus de garantir que seu trabalhador se recupere não apenas pelo bem de seu trabalho e família, mas também porque eles seriam culpados por colocá-lo em um ambiente de insegurança. Kadir (Mücahit Koçak), filho do dono da fábrica, é um homem ético e decente que não quer que o mal aconteça a ninguém, e precisa lidar com a preocupação com o funcionário e sua família, e com a pressão que sofre de sua própria família que quer colocar a culpa no funcionário, alegando estar bêbado.
O filme acontece em um período de 24 horas e traz o tema do dilema moral e a ética na pauta, aproximando-o de filmes iranianos. Com excelentes atores e bons diálogos, o filme vai em crescendo de tensão, até chegar a um desfecho óbvio que enxerga que o mundo é governado pelos patrões.

 

sábado, 16 de julho de 2022

Mundo novo


 "Mundo novo", de Alvaro Campos (2021)

Drama de baixo orçamento rodado e ambientado na pandemia do covid, "Mundo novo"traz elementos dramatúrgicos de "Adivinhe quem vem para jantar" no contexto do Rio de Janeiro vivendo uma falsa impressão de normalidade na sociedade, e aqui no filme, fazendo emergir as hipocrisias raciais e de classes sociais.

Conceição (Tati Vilella) e Presto (Nino Batista) formam um jovem casal que se formou de forma inusitada, durante a pandemia. Ela advogada, ele artista plástico, decidem comprar um apartamento no Leblon e juntar as economias, fazendo um financiamento. Mas Presto precisa que seu irmão Charles (Kadu Charles), mais velho e detentor dos bens materiais da família, assine como fiador. Ao irem visitar Kadu,o casal sente na pele o que é o racismo e o olhar assoberbado sobre as classes sociais.
O filme, todo rodado em belo preto e branco por Rita Albano e produzido por DIogo Dahl, junto de moradores do Vidigal, tem sua grande força no excelente elenco, que conta também com Polly Marinho, Melissa Arievo, entre outros. Em tom naturalista e todo filmado em uma mansão, o filme traz em suas cores o reforço sobre a cor de pele, e incomoda muito o espectador com a constante implicância de Kadu para com seu irmão que ele considera um caso perdido e a namorada Conceição. Um filme angustiante e certamente viraria uma ótima peça de teatro.

You are my sunshine


 "You are my sunshine", de David Hastings. Premiado drama LGBTQIAP+ inglês, "You are my sunshine" procura fazer um traçado entre os anos 70 e os dias de hoje e trazer ao público a evolução da aceitação da homossexualidade na Inglaterra. Escrito e dirigido por David Hastings, somos apresentados a Joe (Jack Knight) e Tom (Steve Salt), dois rapazes que trabalham em uma mesma oficina. Os dois têm personalidades opostas: Joe é quieto e tímido, enquanto Tom é extrovertido. Durante um passeio na colina, eles sentem química e se beijam pela primeira vez. O pai de Joe (Simon Bamford) recua de desgosto quando descobre a verdade; a irmã Ethel (Charlie Clarke) se sente traída pelo comportamento de Joe. Joe e Tom não se intimidam e decidem viver como um casal, independentemente do que a família pense. Décadas se passam, e Ethel continua sendo a homofóbica que lida muito mal com a homossexualidade do irmão, e consequentemente, trazendo desarmonia ao casal.

O roteiro é básico, trazendo uma história clichê sobre aceitação e homofobia. O desfecho é bem novelesco, com diálogos rasos e frases feitas. Com duas horas de duração, o filme cansa bastante. O que mantém a atenção é o bom trabalho das duas duplas que interpretam Tom e John, tanto na juventude, quanto na terceira idade.

sexta-feira, 15 de julho de 2022

O David perfeito


 "El David perfeito", de Felipe Gomez Aparicio (2021)

Drama LGBTQIAP+ argentino, concorreu em Tribeca e traz o tema da obsessão pelo corpo perfeito como obstáculo para uma vida feliz e saudável para o adolescente David (Mauricio di Yorio). Sua mãe, uma artista plástica controladora e possessiva, quer usar o próprio filho como objeto de arte em sua próxima instalação. Ela quer que o filho fique com o corpo perfeito projetado por Michelangelo, e para isso, ela o obriga a malhar o dia todo e a tomar wey protein. Com o pouco resultado, David começa a tomar esteróides escondido de sua mãe. Ao mesmo tempo, ele questiona os seus desejos por corpos, mais masculinos do que femininos.

Um filme minimalista, claustrofóbico, que traz imagens homoeróticas e explícitas que compõem o psicológico de David. Claustrofóbico, dark, "O David perfeito" é um triste testamento sobre a pressão que as jovens gerações sofrem sobre o ideal do corpo desejável.

O telefone preto

 

"Black phone", de Scott Derrickson (2022)
Terror que conseguiu 100% de aprovação do site Rotten tomatoes, "O telefone preto" é dirigido por Scott Derrickson, realizador de 'Dr Estranho" e do terror "A entidade", protagonizado por Etham Hawke, que repete a parceria aqui no filme, como o serial killer The grabber. O filme é adaptação do conto de terror escrito por Joe Hill, filho de Stephen King.
Ambientado nos anos 70, o filme acompanha Finey (Mason Themes), um garoto que mora com sua irmã sensitiva Gwen (Madeleine Macgraw) e o pai alcoólatra. Finney sofre bullying na escola, e acaba sendo sequestrado por The Grabber (Etham Hawke), um serial killer que sequestra garotos e depois os mata a machadadas. Trancado em um porão e sem poder escapar, Finney atende um telefone preto desativado no quarto, mas estranhamente, recebe ligações paranormais das outras 5 vítimas de Grabber, que tentam ajudá-lo a fugir.
Com ótimos sustos e um bom ritmo, o filme fará a alegria de fãs de terror psicológico com toques de violência. Os atores principais estão ótimos, principalmente as duas crianças e Etham Hawke. Os pontos fracos são o desenvolvimento do núcleo policial, fracos, e o ployt twist roubado de "O silêncio dos inocentes".

Elvis


 "Elvis", de Baz Luhrmann (2022)

Nove anos depois do criticado "O Grande Gatsby", o cineasta australiano Baz Luhrmann retorna com a ambiciosa cinebiografia do cantor americano Elvis Aaron Presley, o Rei do rock, falecido aos 42 anos de infarto em 1977. O filme cobre o período de 1955 a 1977, e passa por todas as turbulências já conhecidas do grande público. Mas o que o torna único é por fazer uma biografia pelo olhar de seu empresário, Coronel Tom Parker (Tom Hanks), um homem inescrupuloso que roubou boa parte da fortuna de Elvis e fazia dele gato e sapato. Tom Hanks tem uma ótima atuação, mas ofuscada por dois importantes elementos: próteses falsas que denotam a existência de maquiagem pesada, e Austin Butler, que simplesmente consegue a proeza de apagar Tom Hanks em cena. Desconhecido do grande público, tendo feito séries da Disney e uma participação em 'Era uma vez em Hollywood", de Tarantino, como um membro da seita de Charles Mason, Butler deixou no chinelo astros como Harry Styles, Milles Teller, Aaron Johnson e Ansel Egort. Para choque de todos, Austin canta de verdade nas cenas, e o seu trabalho físico e corporal é impressionante.

O filme foi exibido no Festival de Cannes 2022 com enorme sucesso, recebendo 12 minutos de aplausos em pé. Extravagante, como não poderia deixar de ser, afinal seu realizador é Baz Luhrmann, autor de "Moulin Rouge" e "O grande Gatbsy". A direção de arte é de encher os olhos, e foi totalmente rodada na Austrália. O filme sofreu com a pandemia, tendo Tom Hanks positivado pro covid e as filmagens canceladas por um período.

quarta-feira, 13 de julho de 2022

Dançarino cubano


 "Cuban dancer", de Roberto Salinas (2020)

A história do jovem bailarino cubano Alexis Valdes, atualmente com 22 anos e fazendo parte do corpo de baile da San Francisco Ballet company. Mas o premiado documentário dirigido e fotografado pelo cineasta italiano/nicaraguense Roberto Salinas é de luta, garra e perseverança. O filme acompanha 4 anos na vida de Alexis, mais precisamente, de 2015 a 2019 Em 2015, Alexis, com 15 anos, morava em Cuba e estudava ballet, com muita dedicação. Repleto de amigos na escola e com uma namorada, também estudante de ballet, Alexis entende que a dança é sua paixão. Com a abertura política entre Cuba e Estados Unidos, os pais de Alexis decidem se mudar para Miami, onde a outra filha do casal reside. Alexis deixa os amigos, namorada e o país que ama e precisa reaprender tudo do zero: a falar uma nova língua, a viver na solidão, e principalmente, a recomeçar o ballet, uma vez que a técnica americana é diferente.

O filme emociona por trazer o tema universal da juventude tentando se conectar com o mundo e com os seus desejos, principalmente quando precisam abandonar o seu lar. Alexis é um grande achado: carismático, falante, dedicado e impulsionado pela paixão ao ofício. O filme apresenta lindas imagens de Cuba, o ambiente escolar e o da dança. E comparando com o capitalismo americano, o filme ganha um enorme sabor de conflitos culturais, sociais e políticos.