sábado, 31 de agosto de 2019

Cigano

'Cigano", de David Boneville (2013) Vencedor de mais de 20 prêmios em festivais internacionais, entre eles, os prestigiados Festivais de Cannes e SXSW, "Cigano" é um excelente curta que coloca em um único Ator toda a fúria e força do filme. Zé-TÓ (Tiago Aldeia, esplêndido), é um jovem cigano sedutor, que ajuda Sebastião (Jaime Freitas), um rapaz mauricinho e playboy , a trocar o pneu do carro. Zé se convida para uma carona no carro de Sebastião, que em princípio, reluta, por preconceito. Zé entra `força e durante todo o trajeto, abusa da camaradagem do motorista. Um filme muito bem dirigido, com uma tensão sexual que cresce ao longo do filme, misturando homoerotismo e um suspense que deixa o espectador aflito para saber como o filme vai acabar. Um ótimo exercício de direção e de interpretação.

Yesterday

"Yesterday", de Danny Boyle (2019) Construído em cima de todos os clichês da comédia romântica, "Yesterday" é o tipo de filme que não vai mudar a sua vida, mas que é uma delícia de se assistir. Em quase 2 horas de duração, o filme faz rir, emocionar e claro, fazer os fãs dos Beatles cantarolarem quase todo o repertório dos clássicos dos Beatles que surgem ao longo do filme. Danny Boyle já dirigiu dramas (Steve Jobs, Transpotting, 127 horas, Quem quer ser um milionário), ficção científica (Sunshine) , terror (Extermínio). Tava faltando uma comédia romântica, e ela veio com essa graciosa fantasia que segue uma pergunta muito estranha: E se os Beatles não tivessem existido? Jack (Himesh Patel, excelente) mora na cidade de Lowestoft. Ele é um músico frustrado, e durante quase 20 anos, tentou seguir carreira, sem sucesso. Ele trabalha em um supermercado. Ellie (Lily James), é professora de matemática para jovens e também empresaria Jack em shows sem público. Ellie é apaixonada por Jack, mas ele não percebe. Uma noite, voltando para casa, a luz do mundo inteiro se apaga por 12 segundos. Jack sofre um acidente com um ônibus. Ao acordar no hospital, ele descobre que muitas marcas famosas nunca existiram, entre elas, a Coca-Cola, Harry Potter e por fim, Os Beatles. Surpreso, Jack percebe que é sua grande chance de ser famoso: compondo as letras e cantando os clássicos dos Beatles, anunciando como se fosse tudo seu. Danny Boyle sabe que tem uma boa história na mão que diz muito ao público por conta das músicas dos Beatles. O carisma do elenco supre as fragilidades do roteiro, óbvio em todas as suas estruturas. Mas o filme brinca com o universo do show bizz, trazendo no elenco o cantor Ed Sheeran interpretando ele mesmo, e assim como Tarantino, ressuscitando uma personalidade, para surpresa de todos. Uma diversão garantida, sem contra-indicações.

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Michael Inside

"Michael inside", de Frank Berry (2017) Vencedor de mais de uma dezena de prêmios em Festivais internacionais, "Michael inside" é um drama irlandês brutal. O tema já é bastante corriqueiro: um jovem que acaba de completar 18 anos, morador de Dublin, faz um favor para um amigo: guardar um carregamento de drogas de seu irmão mais velho, em sua casa. Michael mora sozinho com seu avô: seu pai está preso, e sua mãe morreu de overdose. Para piorar esse mundo cão, Michael acaba sendo preso, acusado de tráfico de drogas. Na prisão, ele sai totalmente transformado, após testemunhar todos os horrores de uma vida penitenciária. Com performances extraordinárias de Dafhyd Flynn, no papel de Michael, e de Lalor Roddy, no papel de seu avô, o filme mostra a rotina violenta da prisão com todos aqueles arquétipos já conhecidos, de protegidos e de gangues que cobram proprinas. O filme tem um tom naturalista, bem ao gosto dos filmes de Kean Loach, que está mais preocupado em mostrar as mazelas sociais e de que forma o governo pode ser responsabilizado pela tragédia que acomete a população pobre. Com uma direção segura, o filme traz angústia e nos faz pensar que estamos longe de salvar uma geração fadada ao fracasso.

Distância

"Zai jian, zai ye bu jian", de Sivaroj Kongsakul, Shijie Tan e Xin Yukun (2016) Curioso drama dividido em 3 histórias, cada uma delas dirigido por um cineasta asiático diferente: um chinês, um tailandês e um da Singapura. O que os une, é a história girando em torno do distanciamento entre os 2 personagens principais de cada história, e a escalação do mesmo ator protagonista nas 3 histórias, em personagens diferentes, o Taiwanês Chen Boi Lin. A primeira história se chama “O filho”, e é chinesa. Chen interpreta um jovem gerente de uma grande empresa, em viagem para uma região da China. Durante uma visita, ele observa um funcionário idoso, e reconhece que é seu pai, que quando criança, abandonou sua mãe e ele. Chen passa a segui-lo após o expediente, e descobre que ele tem um filho de outro casamento. A segunda história é “O Lago”, e é um conto LGBTQI+. Dois amigos de adolescência se divertem no lago da vila rural aonde moram. O pai de Chen se irrita com a fofoca que gira em torno da amizade de seu filho com o outro rapaz, e o impede de continuar nadando no lago. Anos depois, já adultos, Chen reencontra seu amigo, que está prestes a ser enforcado por tráfico de drogas. A terceira história, o Adeus, é dirigido por um cineasta tailandês. Chen agora é um professor universitário, que aceita dar uma palestra na cidade aonde cresceu. Chegando lá, ele reencontra sua professora, por quem foi apaixonado. O filme em si é bem interessante, e as 3 histórias são bastante melancólicas, defendidas por um bom elenco e uma linda fotografia. O ritmo é bastante lento, dado a natureza do tema da falta de comunicação, quase um existencialismo de Antonioni.

quinta-feira, 29 de agosto de 2019

In Fabric

"In fabric", de Peter Strickland (2018) Já imaginou um filme de terror protagonizado por duas grandes atrizes inglesas, que protagonizaram filmes de Mestres como Ken Loach e Mike Leigh? E que tenha uma atmosfera totalmente anos 80, tendo como referências os clássicos de Dario Argento e David Lynch, como “Suspiria” e “Veludo azul”, cults do surrealismo fantástico e oníricos? Pois esse filme existe, e se chama “In fabric”, detentor de uma dezena de prêmios internacionais em importantes Festivais como Fantasporto e Mar del Plata? “In fabric” é escrito e dirigido por Peter Strickland, que já tem em sua filmografia outros cults bizarros como “Barberian sound studio”. Marianne Jean-Baptiste, de “Segredos e mentiras”, e Hayley Squires, de “Eu, Daniel Blake”, protagonizam essa fantasia de terror, que poderia ser chamada de refilmagem de “Suspiria” ambientada em uma loja de departamentos. Localizada nos anos 80, a história gira em torno de uma estranhíssima Loja de Departamentos em Londres que inaugura seu periodo de liquidação. Todas as duas histórias giram em torno de um vestido vermelho sedutor e...assassino. Quem o compra, tem um destino trágico, e assim ele vai passando de cliente a cliente. A primeira cliente é Sheila ( Marianne), uma caixa de banco. Ela é mãe solteira, abandonada pelo ex-marido. Seu filho adolescente mora com ela, e tem uma estranha relação com sua professora de francês, interpretada por Gwendoline Christie , a Brienne de “Game of Thrones”. Sheila marca um encontro com um pretendente e para isso, compra o vestido em promoção na loja. A próxima história é sobre Reg, um especialista em consertar máquinas de lavar, que compra o vestido para agradar a sua namorada, Babs ( Hayley Squires). Só que Reg usa o vestido em sua despedida de solteiro. O filme mescla terror com humor negro, daqueles tipicamente inglês. Mas o público irá estranhar mesmo é o estilo do diretor Peter Strickland, que está mais preocupado em criar um estilo e dar uma atmosfera de bruxaria ao filme, do que propriamente, agradar ao espectador, afoito por sangue. O filme tem poucas cenas violentas, e nenhuma delas é explícita. As vendedoras da loja de Departamento são muito parecidas com as professoras de “Suspiria”, todas meio bruxas. É um filme curioso, bizarro, lúdico, mas de fato, pouco sedutor para o grande público. Meia hora a menos faria muito bem ao projeto, que vale pelo trabalho das atrizes e pelo visual anos 80. O jingle do comercial d aloja na tv é assustador.

quarta-feira, 28 de agosto de 2019

A mulher do meu marido

"A mulher do meu marido", de Marcelo Santiago (2019) Gostosa comédia romântica protagonizada por Luana Piovani, Paulo Thiefenthaler, Gabi Lopes e os argentinos Francisco Andrade e Aylin Prandi. No elenco de apoio, Guida Vianna e Maria Clara Gueiros roubam as cenas. O filme, produzido pela LC Barreto, teve argumento concebido na Argentina, quando Marcelo Santiago e Fabio Barreto estavam por lá e levantaram a hipótese de trazer o tema de "O Quatrilho", filme produzido pela mesma LC, para os dias de hoje, envolvendo traições entre um casal brasileiro e um casal argentino. O filme brinca também com a inversão de valores entre gerações: a filha adolescente é moralista e careta, e os adultos, liberais. O filme garante boas risadas e também, imagens da cidade do Rio de Janeiro que resgatam o ideal de Cidade Maravilhosa que a violência insiste em derrubar, mas não consegue.

segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Plínio Marcos- nas quebradas do mundaréu

"Plínio Marcos- nas quebradas do mundaréu", de Julio Calasso O título desse documentário escrito e dirigido por Julio Calasso é derivado do LP lançado em 1974, "Plínio Marcos em prosa e samba- nas quebradas do mundaréu", cantado pelos sambistas Geraldo Filme, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro, com canções escritas por Plínio. Mas o filme se dedica mesmo é a contar a obra teatral e cinematográfica desse dramaturgo da marginalidade, nascido em Santos. e família pobre, Plínio quiz ser jogador de futebol, mas acabou trabalhando em vários empregos até chegar no circo. Ali, ele descobriu a soa vocação artística. A escritora e jornalista Pagu foi quem o incentivou a ser Ator, e aí passou a se envolver com o teatro amador em Santos. Sua primeira obra foi "Barrela", e provocou um enorme impacto pela crueza da narrativa sobre um playboy que vai preso e acaba sendo estuprado na cela. Logo depois, viriam obras seminais da dramaturgia brasileira: "Navalha na carne", "Dois perdidos numa noite suja", entre outros. Plínio escreveu o roteiro de filmes clássicos como "A Rainha Diaba", de Antonio Carlos Fontoura, e "Querô", de Carlos Cortez, ambos falando sobre figuras marginais da sociedade. O documentário apresenta as versões teatrais e cinematográficas de "A navalha na carne" e "Dois perdidos numa noite suja', entrevistando atores e diretores. O depoimento de Tonia Carrero, que interpretou a prostituta Neusa Suely de "Navalha na carne" no Teatro, é comovente: ela que sempre foi considerada a Rainha da Beleza e do Glamour, diz que ninguém acreditaria que ela seria capaz de falar um palavrão, ou de interpretar uma personagem de t!ao baixo nível. ela calou a crítica e público, e foi considerada uma atriz de grandeza após esse trabalho. Tonia diz que a dramaturgia brasileira deve muito a Plínio e Nelson Rodrigues. O filme é recheado com depoimentos de Plínio para os programas "Roda Viva", "Jô Soares"e "Conexão D'avila", sendo entrevistado em Paris para a Feira do Livro. No 'Roda Viva", Plínio vai de chinelos e camisa rasgada e é perguntado por uma jornalista como é que ele vai tentar conseguir financiamento se ele for vestido dessa forma nas reuniões. O filme também apresenta o desfile da X-9, escola de samba de São Paulo, que o homenageou em 2008. Uma resposta de Plínio Marcos que o sintetiza como pessoa e pensador: Plínio certa vez visitou a Funabem, e foi perguntado por um jornalista, o que ele diria aos internos da Instituição. A resposta de Plínio: "Fujam!". Filme obrigatório para se entender esse grande artista, é distribuído pela CAvideo.

domingo, 25 de agosto de 2019

Conta comigo

"Stand by me", de Rob Reiner (1986) Clássico absoluto de várias gerações, lançado em 1986 e desde então, para muitos, o filme definitivo sobre amizade. Baseado em um conto de Stephen King, 'O Corpo", foi considerado pelo próprio uma de suas melhores adaptações para o cinema. Embalado pela canção "Stand by me", cantada por Ben E. King, o filme inicialmente era para ter sido dirigido por Adrian Lyne, mas abandou o projeto para descansar após as filmagens de "9 1/2 semanas de amor". O filme acabou nas mãos de Rob Reiner, que havia dirigido o mockmentary cult "This is spinal tap" e que, após o sucesso comercial de "Conta comigo", dirigiu na sequência 3 jóias do cinema: "A noiva prometida", "Harry e Sally" e "Louca obsessão". O filme se passa no ano de 1959, na pequena cidade de Castle Rock. Quatro amigos de 12 anos, Gordon ( Will Wheaton), Chris (River Phoenix), Vern (Jerry O'Connell) e Teddy (Corey Feldman) ouvem falar que o cadáver de um garoto da idade deles foi encontrado emu ma reião há 32 kilômetros de distância deles. Eles decidem descobrir o paradeiro do corpo e assim, ficarem famosos. No caminho, eles estreitam a amizade, e ficam sabendo mais sobre cada um: Gordon é igonorado pelos pais, que lamentam por ele não ter morrido no lugar do filho mas velho, Denny (John Cusack), que morreu há meses atrás de um acidente de carro; Chris é filho de um assaltante e sente que terá o mesmo destino do pai; Vern também tem uma família desajustada; e Teddy tem um pai internado em um hospício. Como em boa parte da obra de Stephen King, os personagens moram em cidade pequena, que é um microcosmo do que existe de pior no ser humano. A relação entre pais e filhos é conflituosa, e esse tema também é recorrente na obra de King (vide “It, a obra prima do terror”). O que mais impressiona no filme, é a performance dos 4 meninos: os 4 atores estão soberbos, naturais e espontâneos, interpretando crianças de suas idades. É encantador testemunhar o quanto os quatro meninos interagem em cena, em uma perfeição de escalação de elenco formidável. Kieffer Sutherland interpreta um bad boy da cidade que também quer procurar o corpo do garoto morto. O filme é repleto de cenas antológica, além de imagens clássicas, como a dos amigos fugindo de um trem que vem atrás deles no trilho. Um filme para se rever sempre.

sábado, 24 de agosto de 2019

Meu marido de Batom

"Tenue de soireé", de Bertrand Blier (1986) Escrito e dirigido por Bertrand Blier em 1986, o filme ganhou a Palma de Ouro de melhor ator para Michel Blanc. Blier repete a dobradinha de Gerard Depardieu e Miou Miou, que já haviam trabalhado juntos no clássico 'Corações loucos". Antoine e Monique estão na merda, e discutem incessantemente em um bar. Bob (Depardieu), um assaltante de residências, surge e oferece uma proposta ao casaL que assaltem juntos mansões ricas. O trio passa a assaltar as residências. Mas Bob não esconde suas reais intenções: homossexual assumido, ele quer seduzir Antoine. Incialmente seduz Monique, para assim, chegar junto de Antoine, que é homofóbico. Cult que fez muito sucesso da época, o filme continua ousado e perturbador, talvez aé revendo hoje em dia fique a sensação de que o mundo ficou careta demais. O filme é repleto de fetiches, e lida com temas tabus: transexualismo, poliamor. O trio de atores está fantástico, e Depardieu estava no auge da imagem de sex symbol. A trilha sonora foi composta pelo mago da canção francesa Serge Gainsbourg.

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

A ratoeira

"Tapette", de Satya Dusaugey (2016) Escrito, produzido , dirigido e protagonizado por Satya Dusaugey, "A ratoeira" é uma divertida comédia francesa LGBTQI+. Michel é um homem na faixa dos 30 anos e trabalha como pedreiro. Michel namora Charlotte e são felizes. Um da, Charlotte propõe a Michel que morem juntos,. Quando Michel vai responder, hesitante, um rato surge e ele se assusta. Essa é a deixa para Michel se perguntar: Será que ele é gay? Michel passa a frequentar todos os ambientes gays para ver se ele sai do armário: vai a boite gay, tenta dar em cima de um amigo do trabalho, tenta fazer pegação. Mesmo assim, ele continua na dúvida. Até que ele conhece um jovem vietnamita gay assumido, que tem dúvidas se Michel é gay, mas mesmo assim, quer transar com ele. Hilário e repleto de sacanagem e nudez, esse filme é totalmente sem preconceitos e se diverte com todos os estereótipos do universo Lgbtqi+ e do mundo machista e conservador. A cena de Michel se revelando na pista de dança da boite gay é simplesmente sensacional. Satya Dusaugey é um ator/diretor que se expõe sem problemas, totalmente nu em cena, e se divertindo pra valer. O rato acaba sendo uma matáfora do medo de Michel: se assumir gay e de morar com uma mulher.

Brinquedo assassino

“Child's play”, de Lars Klevberg (2019) Dirigido pelo cineasta norueguês Lars Klevberg, que dirigiu o excelente curta de terror “Polaroid”, depois transformado em um fraco longa chamado “Morte instantânea”. Esqueçam o vodu e o espirito do serial killer que invadiu o corpo do boneco Chucky nos filmes anteriores. Chucky agora cria vida por conta de um funcionário de uma fábrica que produz a série de bonecos super inteligentes e high tech ‘Buddi”. O funcionário, um vietnamita, é demitido e como vingança, sabota os comandos do boneco, tornando-o violento. O boneco acaba nas mãos de Andy, um menino que mora com sua mãe solteira, Karen. Ela trabalha em uma loja de brinquedos e decide dar o boneco para Andy. Logo Chucky e Andy tornam-se amigos. Mas Chucky leva o termo “amizade” muito a sério, e assim, começa a eliminar todos mundo que interfere na relação dos dois. Esse remake ignora totalmente os filmes anteriores. O boneco aqui não tem a ironia nem o humor negro dos outros filmes. Aqui ele é dublado por Mark Hamill!!!!!!, isso mesmo, o Luke Skywalker de ‘Star Wars”. Mas o filme investe em uma dramaturgia mais atual e que faz sucesso com a garotada: Andy agora não age sozinho. Assim como em “Stranger things” e “It”, ele agora tem uma turma. Claro que todos têm problemas com seus pais. E claro que todos são nerds. A violência aqui também é bastante explorada, em cenas bem explícitas, onde rolam cortador de grama, serra elétrica e claro, facas e mais facas. Existe também um elemento bem ‘Black mirror” no filme, já que Chucky é produto da tecnologia e ainda vem com um aplicativo para baixar no celular. Os atores jovens são todos ótimos, e como não poderiam deixar de ser, são um microcosmo do bullying: o gordinho, o negro e a menina independente. Algumas cenas são bem divertidas e assustadoras, como a do amante da mãe de Andy e a da loja no final.

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Doodlebug

"Doodlebug", de Christopher Nolan (1997) Curta dirigido e escrito por Christopher Nolan em 1997, quando ainda estudava na Universidade. Um ano depois, ele lançaria o seu primeiro longa, a obra-prima "Following". "Doodlebug" evoca o universo de David Lynch embalado em dramaturgia de Franz Kafka e o seu "A metamorfose": um homem se encontra em seu minúsculo apartamento, com um sapato na mão, tentando matar algo que não vemos. No final, revela-se o objeto de obsessão do rapaz, interpretado por Jeremy Theobald, mesmo ator de 'Following". Com uma fotografia em preto e branco em tons acentuados, parecendo um filme expressionista, o filme não tem diálogos. Os efeitos do filme no desfecho são toscos, mas a idéia é sensacional. Vale assistir por ser um dos primeiros trabalhos desse grande gênio do Cinema, experimentando aqui uma linguagem mais autoral. https://www.youtube.com/watch?v=HbJbTpo5xD4

La Manuela

“La Manuela”, de Clara Linhart (2018) Diretora assistente do longa “Gabriel e a montanha”, de Fellipe Barbosa, a cineasta Clara Linhart estréia como Diretora solo no comovente documentário “La Manuela”. Como tema do seu primeiro filme, Clara escolheu um assunto muito íntimo e pessoal: sua melhor amiga Manuela Picq. Nascidas no mesmo ano de 1977 na França, vieram juntas ao Brasil 4 anos após a anistia política no Brasil (curioso como de início lembra o recente drama “Deslembro”, de Flávia Castro). Logo após esse prólogo de apresentação, narrado em off por Clara usando como base foto das 2 crianças, o filme corta imediatamente para cenas jornalísticas de Manuela fazendo parte de uma manifestação contra o Governo do Presidente equatoriano Rafael Correa, em Quito. Por conta de seu envolvimento com o movimento indígena, tema da manifestação, Manuela no mesmo dia teve o seu visto revogado e expulsa do País, acusada de ato terrorista. Esse dia, 21 de agosto de 2015, marcou para sempre a vida de Manuela, que havia escolhido o Equador como o País aonde ela se sentia em casa. A paixão de Manuela pelo Equador veio totalmente do acaso. Ela quis juntar várias paixões em um só lugar: estudar direitos políticos, estudar espanhol e praticar parapente. O equador foi o lugar mais apropriado, por conta de suas montanhas muito altas. Por conta dos ventos fortes, Manuela trocou o parapente pelo alpinismo. Durante as caminhadas, Manuela se deparava com comunidades indígenas que habitavam ali. Ela ficava impressionada como as mulheres que aparentavam ter 80, 100 anos conseguiam se locomover com tanta destreza, até que descobriu que essas mulheres tinham 40, 50 anos de idade. Impressionada com a baixa qualidade de vida das indígenas, Manuela começou a se envolver com os direitos sociais e políticos dos indígenas, estudando a história dessas mulheres. Acabou conhecendo o líder Carlos Perez Guartambel, presidente da confederação indígena Ecuarunari, que fazia estudo sobre a água nos Andes, e logo se apaixonaram. Juntos, lideraram obras sociais e manifestos contra o Governo, em prol da comunidade indígena. Ao chegar no Brasil, em 2016, após ser expulsa do Equador, Manuela foi recebida no Aeroporto por um grupo de Mulheres ativistas e concluiu que seu exilio não tinha data para acabar. Junto de sua mãe, tentou de tudo para conseguir retornar ao Equador, sem sucesso. O Equador para Manuela era tudo na sua vida: seu lar, lugar de trabalho e do seu companheiro. Sem conseguir se habituar a morar no Brasil (Manuela diz que por conta do que ela chama de colapso do sistema educacional no Brasil, ela não vê qualquer chance de continuar morando aqui), Manuela decide ir morar em Berlim por um tempo, para escrever um livro sobre a condição das Mulheres indígenas na América Latina. Em um momento muito íntimo para as câmeras, Manuela revela para Clara Linhart que desde que foi expulsa do Equador e até os dias de hoje ( 2017, data da gravação), ela nunca mais havia se masturbado, deixando claro como todo esse rebuliço emocional mexeu com o seu metabolismo. Logo depois, Manuela foi convidada a dar aula em Boston, para onde foi na sequência. Durante esses anos longe de Carlos, a relação de ambos foi se desgastando pela distância: em longas conversas via Skype (registradas com extrema franqueza em seus diálogos), testemunhamos do encantamento das primeiras conversas para a falta de assunto. Havia uma possibilidade concreta de Manuela retornar para Quito, e assim ],d essa forma, salvar o relacionamento: um dos candidatos à Presidência, o banqueiro Guillermo Lasso, deixou claro que se ganhasse a eleição, traria Manuela de volta e colocaria ela e Carlos no dia da posse. Manuela se tornou importante figura política no País: se tornou um símbolo nacional de resistência. Dentro do imaginário nacional,, o povo quer sempre uma dupla atuando em conjunto: Assim foi com Simon Bolivar e Manuela Canizares, e com Antônio Sucre e Marianita Carcelen. O povo queria ver novamente Carlos e Manuela juntos. O filme reserva um final pós créditos: um comovente retorno de Manuela ao Equador, em janeiro de 2018. Um final feliz para um filme que fala sobre o Amor: o amor de duas amigas, Manuela e Clara Linhart, motivo do filme existir; o amor de Manuela pelo Equador e pela comunidade indígena; o amor de Manuela por Carlos; o amor da mãe de Manuela pela filha; o amor de Clara Linhart pela sua mãe Ana Maria, a quem ela dedica o filme. E finalmente, o Amor de mulheres batalhadoras pelo audiovisual brasileiro, as produtoras Paula Horta e Chaiana Furtado, em levantar esse projeto que traz um legado importante às causas indígenas, feministas e sociais.

Mussum, um filme do Cacildis

"Mussum, um filme do Cacildis", de Susanna Lira (2019) Nascido como Antonio Carlos Bernardes Gomes no Morro da Cachoeirinha, Rio de Janeiro, em 1941, começou a carreira artística como músico no Grupo "Os originais do samba", com o nome de Carlinhos Reco Reco. A cantora Elis Regina elogiava o grupo e dizia ser o melhor grupo de samba dos anos 60. Em 1966, entrou para o grupo de humor da Tv "OS Trapalhões', junto de Renato Aragão, Dedé Santanna e Zacarias. O apelido Mussum na verdade veio de Muçum, peixe arisco e alcunha dada a pessoas negras na época. Susanna Lira é diretora do premiado documentário "A torra das donzelas", entrevistando Dilma Roussef e suas companheiras de cela durante o período que estiveram presas na ditadura militar. Mais da metade do filme é focado na carreira do cantor. O filme também entrevista os 5 filhos, algumas esposas e claro, Renato Aragão e Dedé Santanna, mas em menor proporção. Não sei se foi por questões contratuais ou de direitos de imagem, mas a parte referente a "Os trapalhões" é bem pequena, e pode frustrar quem esperava ver mais coisa do Mussum humorista. O filme tem Lazaro Ramos como consultor de roteiro e narrador, e entre os entrevistados, a importante declaração do Cineasta Joelzito Araújo, falando sobre como Mussum, que foi o artista negro mais famoso da televisão, era visto com olhar racista dentro do humor do programa. Mussum faleceu em 1994, aos 53 anos, devido a complicações pós transplante do coração.

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Retrato do Amor

"Photograph", de Ritesh Batra (2019) Escrito e dirigido pelo mesmo cineasta indiano do excelente "The lunchbox", "Retrato do Amor" competiu no Festival de Sundance 2019. O diretor Ritesh Batra 2018 novamente entrega o espectador uma história de amor por quem o espectador torce bastante pela felicidade do casal. Ele, Rafi, um fotógrafo de rua que tira fotos de turistas e imprime as fotos na hora. Ela, Malena, uma jovem tímida, estudante de contabilidade, que acaba sendo fotografada por Rafi. Quando a avó de Rafi o chantageia dizendo que se ele não se casar, ela irá parar de tomar remédios, Rafi pega a foto de Malena e a apresenta à avó dizendo ser sua namorada. Nesse jogo de mentiras, ele consegue convencer a verdadeira Malena a fazer parte da farsa só para agradar a avó. Com uma direção extremamente sensível, apostando nos tempos silenciosos e nas elipses, Ritesch nos oferece enquadramentos belíssimos, emoldurados por uma fotografia hiper realista, trazendo referências da filmografia de Wong Kar Wai. Outro filme também que me veio à mente foi a comédia romântica francesa "Românticos anônimos", que também nos traz 2 protagonistas tão tímidos que eles mal conseguem se olhar. Muito do filme se deve ao carisma e talento da atriz que interpreta a avó, uma personagem que rouba a atenção em todas as cenas em que aparece. Os dois protagonistas também são ótimos, Nawazuddin Siddiqui e Sanya Malhotra, dando vida a dois personagens amáveis e ao mesmo tempo, complexos. O trabalho de corpo, os olhares, os silêncios, são fundamentais para o sucesso da dupla.

Argentina

"Argentina", de R.B. Lima (2017) O estudante de cinema da Universidade da Paraíba R.B. Lima formou um coletivo e juntos, desenvolveram uma trilogia. "Argentina" é o segundo filme, financiado pelo Catarse a um custo de 4 mil reais. Ruan se hospeda por um dia na casa de Diego. Ruan tem namorada, mas quando passa a noite na casa de Diego, após uma balada, a tensão sexual aflora entre os dois. O filme alterna momentos realistas com sonhos dos personagens, personificando os desejos enclausurados. Em uma bela cena, os dois estão dançando um tango e retirando as suas roupas, transando na sequência. Com fotografia em preto e branco e cores, "Argentina" explora o talento dos 2 atores, Édson Albuquerque e Glaydson Gonçalves, envolvidos em cenas homoeróticas filmadas com bastante elegância pelo diretor.

Sabor de amor

"Gout bacon", de Emma Benestan (2017) Escrito e dirigido pela Cineasta francesa Emma Benestan, esse premiado curta LGBTQI+ é um divertido e inspirado filme que narra a amizade entre dois amigos heteros. uma amizade que vem desde a infância. Um vídeo do snapchat com os dois vaza e os amigos acreditam que eles estão namorado. Para dissipar essa imagem, os dois amigos resolvem procurar cada um deles uma namorada para abafar o caso. Com um grupo excelente de jovens atores, todos espontâneos, e diálogos saborosos e mordazes, o filme mostra um olhar preconceituoso da garotada que não consegue aceitar a amizade entre pessoas do mesmo sexo, mesmo que entre eles não haja segundas intenções. Ótima direção e trilha sonora.

Chute a lata

"Chute a lata", de Andrés Losada (2017) Exibido em diversos Festivais LGBTQI+, esse filme colombiano escrito e dirigido por Andrés Losada tem apenas 5 minutos. Um grupo de 5 amigos adolescentes, todos rapazes, brincam de esconde esconde. Quando dois deles se escondem na floresta, entendem que o jogo entre eles pode se tornar algo diferente. Um filme enxuto e que narra em pouco tempo a tensão sexual adolescente, através de olhares. O filme apresenta os garotos como inocentes em suas brincadeiras, mas que sob um segundo olhar, pode adquirir contornos homoeróticos.

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

The Banana SPlits- O Filme

"The Banana Splits Movie", de Danishka Esterhazy (2018) Esse provavelmente é o filme mais bizarro dos últimos anos. Imagine pegar os personagens do icônico programa de tv da Hannah Barbera, "The Banana Splits", surgidos em 1968 e que por décadas dominaram a tv infantil com um seriado recheado de Sketches de humor e números musicais envolvendo quatro animais de pelúcia: Fleegee, Drooper, Bingo e Snorky e revisitá-los em um longa-metragem em pleno ano de 2018. Muitos fãs mundo afora ficaram excitados com a notícia: crianças e adultos nostálgicos poderiam finalmente rever seus personagens amados e ainda cantar a famosa música tema. No entanto, a Cineasta Danishka Esterhazy e os roteiristas Jed Elinoff e Scott Thomas resolveram dar um sabor extra aos personagens: agora eles são serial killers, e matam de forma mais violenta que Jason e Michael Myers juntos! Decapitam, decepam, desmembram, tacam fogo, arrancam olhos, serram ao meio crianças a adultos durante um programa ao vivo do show deles. Quando eles descobrem que o produtor não quer mais manter o show no ar, eles enlouquecem e matam geral, equipe técnica e platéia. O filme pega a premissa de "A fantástica fábrica de chocolates": quem descobrir em seu ingresso uns número, terá direito a visitar os bastidores do programa. Só que não imaginavam que os bichos, literalmente, enlouqueceram. Claro que tudo é filmado em tom de galhofa., Filme B nível máximo, mas mesmo assim, as cenas de violência são extremamente gore para as crianças: atenção, não é filme para crianças. Tudo aqui é bem gore, bem explícito, mesmo! não dá para entender o motivo dos produtores resolverem resgatar a memória nostálgica dos Bananas Split e sacanearem tudo. Confesso que achei ousado, nunca tinha visto nada igual, é o mesmo que pegar Mickey, Pato Donald e eles começarem a matar as crianças, nesse nível de apego a personagens. Para quem quiser se divertir com filme trash e inconsequente, esse filme é uma pedida bacana, onde não se respeitam nem as crianças. Matam mesmo.

domingo, 18 de agosto de 2019

Humberto Mauro

“Humberto Mauro”, de André Di Mauro (2018) Dirigido e escrito por André Di Mauro, sobrinho-neto do Cineasta mais famoso de Cataguazes, Minas Gerais, “Humberto Mauro” é um filme obrigatório para estudantes e estudiosos de Cinema, Cinéfilos e para quem acredita que o Brasil não preserva a sua memória cultural. André levou cerca de 2 anos decupando, estudando cerca de 300 filmes ( editou trechos de 70 no final) dirigidos por Humberto, entre curtas, longas e filmes educativos produzidos depois de 1936 no Instituto Nacional de Cinema Educativo, o INCE, financiado pelo Governo Vargas e que tinha como intuito, produzir curtas e médias para serem exibidos em escolas e instituições públicas de todo o Brasil. André construiu o seu filme todo a partir de material de arquivo, não tendo cenas filmadas posteriormente nem as tradicionais entrevistas com amigos e parentes vivos. Costurando imagens dos filmes com entrevistas cedidas por Humberto nos anos 60, o filme se torna uma linda declaração de amor do próprio à Arte de se fazer e apreciar o Cinema. Assim como “Cinema Novo”, de Eryk Rocha, ou “Histórias que nossas Babás não contavam”, que tinha como tema a pornochanchada e o seu olhar sobre a Ditadura militar no Brasil, todos esses filmes reconstroem as imagens originais, transformando-as em um filme próprio, trazendo um novo olhar sobre os filmes envolvidos. Ao final da projeção, tem um depoimento contundente de Humberto, já com voz embargada pela idade avançada (Humberto faleceu aos 86 anos em 1983) dando a declaração: “Gostaria que um bisneto ou um tataraneto me confirmasse, lá pelo ano de 2020, se a Terra é azul”. O Cineasta André di Mauro editou o filme de forma que o próprio Humberto, metafisicamente, já tem a resposta. No belíssimo prólogo do filme, vemos imagens da natureza, um dos temas recorrentes e mais apaixonantes de Humberto. Logo vemos crianças observando o céu, e também alguns adultos. Sobre essas imagens, ouvimos a voz de Humberto surgindo como se ecoasse do Universo, desse céu azul, no filme retratado em imagens em preto e branco. O grande acerto de André di Mauro foi ter focado o seu documentário na experiência de Humberto com o cinema, evitando falar d avida pessoal dele. Logo em seu primeiro filme de1926 ,” Na Primavera da Vida”, assinou como Reinaldo Mazzei. Por sugestão do Produtor carioca Adhemar Gonzaga, alterou sue nome para Humberto Mauro. Filho de italiano com brasileira, Humberto veio ao Rio de Janeiro em 1937, a convite de Adhemar Gonzaga, e realizou o primeiro filme do Estúdio Cinédia, “Lábios sem beijos”. Vários outros filmes foram produzidos pela Cinédia, formando uma bela parceria. Humberto gostava de filmar sem muita preparação, gostava do improviso e do elemento surpresa, principalmente quando filmava a Natureza, segundo ele. “Na Natureza, nada se repete, cada instante acontece uma única vez”. Humberto nunca estudou Cinema nem leu livros, diz que é um processo próprio que nasce com a pessoa. Parafraseando uma frase de Michelangelo, onde “A escultura já vem dentro do bloco de mármore, basta esculpir que ele sai.”. Humberto: “O Cinema tá lá dentro da gente, basta apertar um botão que ele sai”. A parte curiosa é quando diz que as mulheres de sua família, que o ajudavam em seus filmes, o censuravam quando o assunto era a exposição de corpos femininos: sugeriam enquadramentos que não mostrassem demais, figurinos que não explorasse a sensualidade delas. Outro momento revelador, é quando Humberto explica o sentido de sua famosa frase, ‘Cinema é Cachoeira”: Muitos amigos seus, fazendeiros, chamavam Humberto para filmar as cachoeiras de suas fazendas. Humberto concluiu que a Cachoeira trazia esse desejo das pessoas de filmar algo belo, que merece ser imortalizado na película. Cachoeira é Cinema, logo, Cinema é Cachoeira. Na última cena do documentário, temos a imagem do próprio Humberto Mauro, representando um Coronel no seu filme “Canto da saudade”, do alto de um Morro, orgulhoso, como se refletisse sobre toda a sua História no Cinema Brasileiro e dissesse para si mesmo: “Meu legado agora pertence a vocês.” “Humberto Mauro” concorreu nos prestigiados Festivais de Cinema de Veneza e Rotterdan em 2018, e concorre a uma vaga para representar o Brasil no Oscar 2020.

Bacurau

“Bacurau”, de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles (2019) Escrito e dirigido por Kleber Mendonça e Juliano Dornelles, “Bacurau” faturou no Festival de Cannes 2019 o cobiçado Grande Prêmio do Juri, que equivale a um 2o lugar. O filme pode ser visto como uma parábola sobre os homens de bem e os homens do mal, personificados em: do lado dos mocinhos pelos quais o espectador irá torcer, estão assassinos, prostitutas, lésbicas, trans, negros, idosos, crianças, cordelistas, nordestinos, pobres (faltaram os orientais e índios nesse microcosmo do Brasil, mas tudo bem, entendemos o recado). Na parcela dos malvados, temos os políticos brasileiros, os brasileiros corruptos e os “gringos”, que no melhor estilo “O Albergue”, só querem se divertir matando a população do terceiro mundo, representado na cidade de Bacurau, que fica a Oeste de Pernambuco. Em Bacurau, todos são felizes e vivem em harmonia, que é quebrada com a chegada do político e dos gringos. A partir daí, o filme pega o melhor estilo Sergio Leone de ser, aliado à trasheira B dos filmes italianos Gore de Dario Argento. É sangue, é víscera, é tudo aquilo que a onda vintage dos anos 80 está retornando com força total nas produções de cinema e tv de hoje. Música eletrônica de sintetizadores, fotografia suja, e ode aos filmes de ficção científica de Ed Wood, o drone tem formato daqueles discos voadores de pratos pendurados em cordinhas de nylon. Assim como “Aquarius” e “o Som ao redor”, é impossível não associar o filme ao momento político brasileiro. Crítica feroz, aqui representada na violência extremada que faz o público urrar, resgatando o instinto de proteção que todos temos dentro de nos. Não se pode julgar alguém quando este está para proteger os seus entes queridos. O Destaque no entanto, vai para o elenco brasileiro, em uníssono, fabuloso. Os atores estrangeiros, como estão sob o signo da caricatura, fica mais difícil avaliar.

sábado, 17 de agosto de 2019

Kinky Boots- Fábrica de sonhos

"Kinky Boots", de Julian Jarrold (2005) Deliciosa comédia musical inglesa LGBTQI+, baseada em incrível história real. A história foi encenada na Broadway com muito sucesso e uma trilha sonora composta por Cindy Lauper. Na periferia de Londres, em Northamptonshire, existe uma tradicional fábrica de sapatos. Outrora de muito sucesso, agora está decadente. O pai de Charlie (Joel Edgerton) morre e a fábrica passa para Charlie, que não tem idéia de como administrar a empresa. Sabendo das dificuldades financeiras, Charlie é obrigado a demitir quase todo os funcionários que estão ali há décadas. Mas acidentalmente, andando em Londres de noite, Charlie salva Lola ( Chiwetel Ejiofor) de um ataque homofóbico. Lola é Drag Queen e canta em um cabaret. Os dois acabam se tornando amigos e Charlie resolve fabricar sapatos de saltos para Drag Queens, com a ajuda da funcionária Lauren. Mas Charlie precisa lidar com a homofobia de parte dos funcionários. Carismáticos, Joel Eddgerton e Chiwetel Ejiofor dão um show em papéis bem diferentes de tudo o que eles têm feito hoje em dia. Acredito que muita gente não faz idéia de que Chiwetel Ejiofor interpretou uma Drag Queen de forma tão poderosa e verdadeira como a Lola no filme. Com músicas clássicas do universo pop, o filme seduz o espectador com divertidos números musicais e de brinde, nos oferece uma belo conto sobre aceitação.

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Era uma vez...em Hollywood

'Once upon a time..in Hollywood", de Quentin Tarantino (2019) Sim, Tarantino continua filmando pés femininos em primeiríssimo plano, um fetiche incorrigível e assumido. Nesse seu 9o filme, um dos Cineastas mais pops da história do cinema reconstitui a noite em que Sharon Tate, atriz casada com Roman Polansky e grávida de 6 meses, foi morta junto de um casal de amigos em uma Mansão de Los Angeles, no ano de 1969. Para contar essa história, Tarantino cria o filme mural muito comum aos filmes de Robert Altman, e que o próprio Tarantino havia se apropriado em "Pulp Fiction": várias histórias se entrecruzando até chegar a um desfecho que linka todas em uma só. A história principal é a do ator decadente Rick Dalton (Leonardo di Caprio, brilhante). Um astro acostumado a fazer filmes de ação, ele traz sempre consigo o seu dublê de ação e faz tudo Cliff (Brad Pitt, impagável). Ele recebe um convite de um produtor de cinema, interpretado por Al Pacino, para protagonizar filmes de western spaghetti e espionagem na Itália, mas ele se recusa. Rick procura urgentemente uma forma de se reinventar, em um período em que surgem novos galãs a cada ano. Tarantino filma tudo com um olhar compassado, sem pressa, até o final catártico. Até lá, ele não tem pressa em narrar suas histórias e crônicas de uma Hollywood que não existe mais. Narrando didaticamente as funções e temas dentro da Indústria do cinema, o filme traz um olhar nostálgico para a 7a arte repleta de paixão e com muitas referências, inclusive ao próprio cinema de Tarantino. A trilha sonora é absurdamente eficaz, inclusive toda a parte técnica, um primor. Vê-se que Tarantino gastou bastante dinheiro aqui para reproduzir ruas inteiras. Muitas cenas antológicas: além do desfecho. tem a cena em que Sharon vai assistir a um filme que ela trabalhou no cinema, só para testemunhar a reação da platéia. O elenco está genial, repleto de participações de toda sorte de atores que já trabalharam com Tarantino em outros filmes. O trio Brad Pitt, Leonardo di Caprio e Margot Robbie está super carismático, impossível não se apaixonar por eles. Outra que merece destaque é a pequena é Julia Butters, no papel da atriz mirim Trudi, que trabalha sob as orientações do "Método"e permanece na personagem o tempo todo. Antológica e fascinante a performance da garota.

Tragam-me a cabeça de Carmem M.

"Tragam-me a cabeça de Carmem M.", de Felipe Bragança e Catarina Wallenstein (2019) Vindo de uma tradição de filmes experimentais, Felipe Bragança lançou em 2017 o seu filme mais acessível para o grande público, "Não devore o meu coração", que tinha como protagonista Cauã Raymond em crise existencial por se apaixonar por uma jovem paraguaia, fazendo alusão ao conflito Brasil/Paraguai. Agora com "Tragam-me a cabeça de Carmem M.", Felipe se une à atriz portuguesa Catarina Wallenstein e juntos dirigem esse jogo de metalinguagem que apresenta em ficção e um filme dentro do filme, a figura polêmica de Carmem Miranda. Catarina interpreta Ana, uma atriz portuguesa contratada para dar vida à Carmem Miranda em um filme dirigido por uma Cineasta excêntrica e cadeirante, interpretada por Helena Ignez. O filme apresenta uma difícil convivência profissional entre a atriz e a diretora, que, exigente, procura extrair o que idealizou de sua Carmen Miranda. Mas Ana, assim como a própria Carmen Miranda em vida, sofre uma grande crise de identidade. Agredida pela mídia, que a acusavam de ter se tornado americanizada, Carmen passou boa parte de sua vida frustrada com a falta de apoio do povo brasileiro. Ana interpreta o Brasil nos dias de hoje: uma atriz portuguesa precisando viver Carmem Miranda, um ícone brasileiro. O Brasil dos anos 40 e 50 de Carmen se torna um Brasil desconhecido por todos, onde juntas e paradas militares se fazem presentes nas ruas. Nas paredes, frases de protesto contra o Governo procuram chamar a atenção das pessoas. Na primeira cena do filme, Carmen Miranda é vista jogada nas ruas, ao lado de bananas podres, e os transeuntes simplesmente a ignoram. O Descaso dos brasileiros continua o mesmo de décadas atrás. Toda essa premissa é contada com muita ousadia narrativa, costurada com artes plásticas e uma sub-trama que envolve uma trans e uma travesti que recolhem Carmem na rua e a acolhem em seu hotel da Lapa. Também temos números musicais com canções de Carmen Miranda, cantadas em ambientes de demolição: O cassino da Urca é dos cenários mais emblemáticos do filme, totalmente destruído e simbólico na construção de um ideal de decadência da cultura no Brasil. Curioso notar como o Cinema independente brasileiro se apegou à figura de Carmem Miranda: Gustavo Pizzi, em seu filme "Riscado", também se apropria da figura da cantora, e tendo na narrativa também uma narrativa de metalinguagem com o cinema e a vida real. A se notar também o título do filme, pêgo emprestado de um clássico de Sam Peckimpah, "Tragam-me a cabeça de Alfredo Garcia", onde literalmente, uma cabeça é dada como prêmio. Aqui no filme, os prêmios inexistem. Existe um desejo forte de resistência, demonstrada em imagens de arquivo como o Incêndio do Museu histórico nacional e outros eventos que baixaram a guarda da auto-estima do carioca e do brasileiro. Com um excelente elenco de apoio comandado por Higor Campagnaro, Marcos Sacramento e Lux Nègre, o filme foi selecionado em 2019 ara o prestigiado Festival de Rotterdan.

quarta-feira, 14 de agosto de 2019

O Monstro do Ártico

"The Thing from another world", de Christian Nyby e Howard Hawks (1951) Clássico de 1951 que inspirou o Cineasta John Carpenter na sua obra-prima do terror "O Enigma do outro mundo", de 1982. Baseado no conto "Who goes there?", de John W. Campbell Jr., esse filme de 1951 envelheceu bastante, tendo praticamente nenhuma tensão, ao contrário do filme de John Carpenter, que é assustador do início ao fim. "O Monstro do Ártico" faz parte de uma leva de filmes da década de 50 que usavam o Macarthismo como base filmes com subtexto político, contrários à invasão comunista na vida social, política e cultural dos Estados Unidos. Geralmente, os filmes eram de ficção científica, e representavam os comunistas como alienígenas do mal ou monstros assassinos. Em uma estação polar no Ártico, um grupo de cientistas e jornalistas encontram uma nave espacial enterrada no gelo. Dentro, encontram uma enorme cápsula com um corpo congelado. Ao trazerem a cápsula para a base, esse degela, trazendo de volta à vida um enorme homem que quer matar a todos. O tal do Monstro aqui é muito semelhante à figura de Frankenstein, ao passo que no filme de Carpenter ele é um monstro disforme, que consegue adquirir a forma de qualquer um, tornando o filme mais paranóico e claustrofóbico, pois qualquer um pode ser o monstro. O filme é muito verborrágico e tem personagens demais. Mesmo assim, vale como um registro de época, um importante momento histórico que testemunha o aterrorizante código Machartista, onde a censura imperava e técnicos de cinema de todas as áreas eram denunciados por prátIcas comunistas, na famosa lista negra.

terça-feira, 13 de agosto de 2019

Socorro, virei uma Garota

“Socorro, virei uma Garota”, de Leandro Neri (2019) Muito provavelmente, 100% das críticas ao filme deverão mencionar a comédia blockbuster “Se eu fosse você” como uma grande referência, e é verdade. Tem a primeira cena no espelho, semelhante ao que Tony Ramos se olhava no espelho e vice versa com Gloria Pires. Tem a cena da depilação. Lá pelo terço final do filme, tem um plot twist idêntica ao do filme “A morte te dá parabéns 2”: mas não se pode dizer que o roteirista Paulo Cursino tenha pego emprestada a idéia do filme, porquê o terror teen foi lançado em 2019, ou seja, muito depois do filme brasileiro estar pronto. Coincidência, como muitos exemplos que já ocorreram em outros filmes. ‘Socorro, virei uma Garota” é uma simpática comédia romântica fantasiosa. Com um time de ótimos jovens atores, o filme tem carisma o suficiente para seduzir o espectador, alternando momentos de humor, drama e romance. Thati Lopes e Victor Lamoglia são aquele talento que todo mundo já espera, vide o grande sucesso de ambos em plataformas de youtube. A surpresa vem do elenco coadjuvante, muitas vezes roubando as cenas: Leo Bahia (Cabeça) , impagável como o amigo nerd; Lipy Adler, divertido como o playboy bobão; Lua Blanco como a irmã lésbica de Cabeça e os adultos Nelson Freitas e Vanessa Gerbelli: Nelson tem um momento revelação do personagem que bota todo mundo para gargalhar, e Vanessa garante os momentos mais delicados do filme. Victor Lamoglia interpreta Júlio, um nerd que tem dificuldade de relacionamento com seu pai e seu irmão sarados de academia. Júlio tem paixão platônica por Milena, mas o acaso de uma chuva de meteoro, advindo de um céu estrelado ( referência ao filme “A culpa é das estrelas”, citado várias vezes no filme) , faz Jülio fazer um pedido que é atendido: ele vira uma garota, Júlia (Thati Lopes). Júliio entendeu que fez o pedido de forma errada e agora precisa reverter a situação. O melhor do filme, é trazer para o universo juvenil, e dentro de uma comédia adolescente, o complexo tema da aceitação do Gênero sexual: lésbicas, gays precisam ser aceitos pela sociedade conservadora. E isso o filme consegue, de forma leve e divertida.

segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Anima

“Anima”, de Paul Thomas Anderson (2019) Curta de 15 minutos dirigido por Paul Thomas Anderson para promover o novo disco do Radiohead, ‘Anima”. Thom Yorke, vocalista da famosa banda inglesa, protagoniza o filme, buscando referências em filmes distópicos como “Metrópolis”, “1984” e “Pink Floyd The Wall” . O filme, sem diálogos, tem 3 canções do disco, na ordem: “Not the News”, “Traffic” e “Dawn Chorus”. A história é simples: um homem encontra uma lancheira deixada por esquecimento por uma passageira em um trem. Ele decide entregar o objeto à moçam mas ela desapareceu e ele fará de tudo para encontrá-la. Como qualquer filme distópico, somente o Amor quebra a barreira da apatia e da mecanização. Com coreografia deslumbrante e soberba de Damien Jalet, que fez os movimentos no filme “Suspiria”, de Luca Guadagnino, o filme aind atem a exptraordinária fotografia de Darius Khondji, fotógrafo de vários filmes de Woody Allen e da série de Nicolas Winding Refn, “Too old to die Young”. A slocações foram filmadas em Praga e em Le Baux de Provence, na França. Rodado em película, o filme tem como objeto de amor do protagonista a esposa de Thom York, Dajana Roncione. Todos, do elenco e elenco de apoio, dançam coreografias vigorosas e instigantes, reproduzindo movimentos de maquinaria de uma fábrica. Um espetáculo visual que deve, segundo recomendações, ser escutada com volume máximo.

Vivendo no abandono

“Living in oblivion”, de Tom DiCillo (1995) Não há nada mais prazeroso para um Cinéfilo do que assistir a um filme que tem os bastidores do cinema como pano de fundo. Todo mundo tem “A noite americana de Truffaut como filme de cabeceira, e provavelmente, alguns têm “Vivendo no abandono” como um filme xodó. Cult absoluto, “Vivendo no abandono” é daqueles filmes que é sempre bom rever, e perceber a cada revisão o quanto ele é perfeito em todos os aspectos: elenco, roteiro e direção primorosos. O Roteirista e diretor Tom DiCillo começou sua carreira como fotógrafo, inclusive fotografou os primeiros trabalhos de Jim Jarmusch, “Estranhos no Paraíso” e “Coffee and cigarretes”. No filme, acompanhamos a rotina de uma diária de filmagem de um filme de baixo orçamento, realizado dentro de um estúdio. Todos os problemas existem ali: Diretor inseguro, atriz que tem um caso com o ator e acabam se desentendendo, assistente de direção estressada, fotógrafo estrela que quer mandar na direção, foquista que erra o foco, máquina de fumaça que não funciona, ator anão que reclama de ser escalado por ser anão, continuísta que dá em cima do ator...enfim, quase uma reprodução de “A noite americana”, mas com um sabor de filme independente americano. Os atores estão impecáveis em seus papéis, e é impressionante o quanto carregam a persona das funções do cinema, trabalhados nas caricaturas mas mesmo assim, divertidíssimos: Steve Buscemi como o cineasta, Catherine Keener como a atriz problemática, Dermot Mulroney como o fotógrafo mandão, Danielle von Zerneck, excelente como a assistente de direção e Peter Dinklage em início de carreira como o anão.

Noite do Slasher

“Night of the slasher", de Shant Hamassian (2015) Premiado em importantes Festivais de terror, “Noite do Slasher” é um terrir que brinca com todas as convenções dos filmes do gênero, algo que a série “Pânico” já havia feito. Uma garota, Janelle, aguarda a chegada de um serial killer em sua casa. Ela quer vingança. Para isso, ela enumera uma lista com todos os clichês de filmes de terror: ambientação anos 80, ficar semi-nua, fazer sexo, etc. Quando o serial killer surge, mais clichês: ele é indestrutível, ele usa máscara. O diretor e roteirista Shant Hamassian brinca com estilo, e se apropria da idéia do plano-sequência, que aqui na verdade, possui cortes discretos em chicotes de câmera. A maior brincadeira é o serial killer usar a máscara do Spock de ‘Star Wars”, com a cara do ator Leonard Nimoy. Para quem não sabe, em “Halloween”, a máscara de Mike Meyers era uma reprodução do rosto de Willian Shatner, o Capitão Kirk. Link para assistir ao filme https://vimeo.com/127454533

Meu amigo Enzo

“The Art of Racing in the Rain”, de Simon Curtis (2019) Malditos filmes com cachorros que fazem a gente chorar mil litros. Mas sério, o que mais me chamou atenção nesse sensível e lacrimogêneo filme foi rever o ator Martin Donovan, ator fetiche de quase todos os filmes do cineasta independente Hal Hartley, fazendo papel de avô!!!! Nos anos 90 ele era galã dos filmes de Hartley, e agora, interpreta o avô da menina Zoe, filha do casal Denny (Milo Ventimiglia) e Eve (Amanda Seyfried). Denny (Milo Ventimiglia, ator da série “This is us” e filho de Rocky Balboa no filme “Creed”) interpreta um piloto cujo sonho é fazer parte da corrida de Fórmula 1. Solteiro, ele compra um filhote de Golden Retriever, e dá o nome de Enzo, em homenagem a Enzo Ferrari. Entre aulas, corridas frustradas e passeios com Enzo, Denny conhece a professora de inglês Eve. Eles namoram, casam e têm uma filha, Zoe. Mas Denny, por conta das corridas está sempre ausente nos momentos-chaves de Eve. Até que ela descobre estar com câncer terminal. Como se vê, o filme aposta em vários truques para arrancar de qualquer jeito lágrimas dos espectadores: tem personagem com doença terminal, tem cachorro que cresce e envelhece, tem avôs que querem a guarda da filha. O filme cativa pelo bom elenco que dá conta dos personagens, e claro, pelo carisma do cachorro Enzo. O filme aposta na fórmula do excelente “Quatro vidas de um cachorro”: dá voz ao bicho, que passa o filme todo tendo reflexões sobre querer ser um ser humano. A voz é de Kevin Costner. Seus pensamentos são entre divertidos e filosóficos, muitas vezes ficando exagerados. Mas é um filme para apaixonados por cachorros, realizado pela mesma produtora de “Marley e eu”, daí já dá para sacar o que vem no final. O Diretor inglês Simon Curtis realizou os ótimos “7 dias com Marylin” e “Adeus, Christopher Robin”. Para os brasileiros, um sabor especial: o filme homenageia Ayrton Senna diversas vezes.

domingo, 11 de agosto de 2019

Cada vez que eu morro

“Every time I die”, de Robi Michael (2019) Drama de suspense sobrenatural, traz elementos de “Feitiço do tempo” e “Amnésia”, dois grandes cults do cinema. A questão é que o roteiro aqui tem uma história simples, mas executada com tanta complexidade, principalmente na edição, que acaba tornando o filme confuso. O filme vai e volta no tempo, e o espectador só começa mesmo a entender lá pelo meio do filme. Até então, pelo menos eu, achei tudo uma piração, e mesmo sabendo que era uma fantasia, tava querendo acreditar no que estava vendo. Deixe a mente livre para reencarnação e espiritismo e aí sim você poderá encontrar interesse no projeto. Sam e Jay trabalham juntos como paramédicos e são melhores amigos. Ambos vão passar um final de semana na casa de campo de Tyler e Mia. Tyler é um mariner e retorna para o lar após um ano de serviços militares. Sam e Mia são amantes e quando Tyler descobre, o mata na beira do lago. Imediatamente, o espírito de Sam reencarna em Jay, e dessa forma, ele tenta impedir que Tyler mate outras pessoas. No flashback, Sam, quando criança, foi acusado de ter matado sua irmã menor, que foi encontrada afogada no lago. Esses dois tempos se mesclam na mente de Sam, que tenta compreenderêele reencarna no corpo de outras pessoas toda vez que morre. Se o Diretor e roteirista Robi Michael tivesse realizado o filme pensando no espectador e menos em estilização e intelectualização, o filme teria sido muito mais interessante. Como falei antes, a história é simples, mas Robi quis “dourar a embalagem”, e dessa forma, irá afastar boa parte do público que até iria se interessar nessa história que de fato tem elementos curiosos. O elenco funciona a contento, apesar da caricatura na figura do Mariner Tyler, muito óbvio na construção do ‘white american” nacionalista e psicopata.

Num ano com 13 luas

“In einem Jahr mit 13 Monden ”, de Werner Fassbinder (1978) Realizado com extrema rapidez em 1978, “Num ano com 13 luas” é uma resposta de Fassbinder ao suicídio do Ator Armin Meier, também namorado do cineasta alemão, que o acusava de negligenciar o seu amor e não lhe dar atenção. Fassbinder se sentiu culpado pela morte de overdose de Meier e decidiu seguir até Frankfurt e rodar esse denso e provocativo drama assumindo quase todas as funções técnicas: Direção, roteiro, fotografia, câmera, direção de arte, montagem. O título significa que 1978 é um ano de 13 luas, e que esse fenômeno provoca em algumas pessoas uma tristeza profunda. A protagonista do filme é Elvira, uma mulher trans (em atuação impecável de Volker Spengler). Antes de transitar, Elvira era Erwin, funcionário de um matadouro e casado com Irene, com quem teve uma filha, Marie Anne. Erwin no entanto se apaixonou pelo colega de trabalho, Anton, que disse ser impossível manter um relacionamento com Erwin, a não ser que ele se torne uma garota. Erwin resolve seguir até Casablanca e faz a mudança de sexo. Ao retornar como Elvira, ela sofre um duplo baque: Anton a rejeita, assim como sua esposa Irene. Elvira acaba se relacionando com um Ator, Christoph. Durante anos, eles se apaixonam, com Elvira sustentando o amante, mas quando Christoph passa a trabalhar, rejeita Elvira e passa a desprezá-la. Fassbinder realiza um de seus filmes mais cruéis, e transforma Elvira em uma personagem aonde ele despeja todo o seu rancor pela sociedade: ela sofre, é desprezada, humilhada, espancada. Logo no prólogo do filme, buscando um pouco de amor, Elvira vai até um lugar de pegação gay, mas é espancada pelos gays que descobrem que ela é uma trans. Em 1978 Fassbinder já foi vanguarda ao tratar do tema da Trasnfobia entre a própria comunidade gay. Fassbinder faz várias referências cinematográficas: além dos melodramas clássicos de Douglas Sirk, fonte eterna de seus dramas com protagonistas femininos, temos “Amarcord”, de onde vem a trilha sonora de Nino Rota, acompanhando as entradas em cena da prostituta Zora. Na apresentação de Anton, o vemos já milionário, assistindo na tv a cena da parada com as mulheres do filme “O meninão”, com Jerry Lewis e Dean Martin. Duas grandes polêmicas surgiram por causa do filme: o personagem Anton é um judeu sobrevivente dos campos de concentração. Logo depois se tornou um milionário, aprendendo a ganhar dinheiro com informações de judeus que foram mortos nos campos. Se tornou um homem desprezível e frio. Fassbinder foi acusado por boa parte da mídia de anti-semitismo. Outro momento desconfortável, é na famosa cena do suicídio de um ex-funcionário de Anton. Elvira presencia o homem se preparando para se matar, e nada faz: ele se enforca na sua frente, com todo um ritual de preparação. Essa cena seria uma forma de Fassbinder se colocar no lugar de Elvira como se testemunhasse o suicídio de Armin e nada fez para impedir. Depressivo mas ao mesmo tempo fascinante, “Num ano de 13 luas” é um filme obscuro de Fassbinder que tive o prazer de descobrir ao assistir a um documentário sobre a obra do cineasta.

O.D. Overdose digital

“O.D. Overdose digital”, de Marco DeBrito (2007) Vencedor do prêmio de melhor ator em curta para Francisco Gaspar no Festival de Gramado e de melhor fotografia em Paulínia, esse curta de 2007 de um dos novos talentos do gênero terror Marco DeBrito é um excelente exercício de estilo, muito provavelmente tendo “Requiem para um sonho”, cult de Darren Aranofsky como referência. Dividindo a tela em várias e fazendo uso de câmeras acopladas ao corpo, exatamente como em ‘Requiem”, o filme narra o encontro entre um Traficante, Zelão (Gaspar) e um viciado (Leonardo Miggiorin). Zelão tortura o rapaz psicologicamente, e sente prazer imenso ao ver o rapaz ficando cada vez mais tenso. Nesse embate verborrágico, o diretor e roteirista brinca com estilo e extrai o melhor de seus atores. Link para assistir ao filme. https://vimeo.com/user8311254

Apóstolos

“Apóstolos”, de Marcos DeBrito. O Cineasta Marcos DeBrito (2017) é especializado em filmes de terror. Na sua filmografia, tem a co-direção do terror teen ‘Condado Macabro” e outros curtas premiados. Em ‘Apóstolos”, Marcos, que também escreveu o roteiro, cria uma fábula macabra sobre um Homem sem cabeça!!!!! Que deseja reproduzir a mesa da última ceia, com cabeças de vítimas representando os Apóstolos!!!!! No entanto, ainda falta a cabeça de Judas, e o Homem sem cabeça parte para a sua nova empreitada fatal. A curiosidade da trama é que ela remete a uma das personagens de “Game of Thrones”, Arya, quando ela faz parte da seita de Deus de muitas faces. No curta, o homem vai trocando de cabeça com as suas vítimas, todas decepadas. Os efeitos são incríveis, e a direção de Marco transmite um clima de decadência moral e social, através da bela fotografia de Lucas Loureiro. No elenco, Francisco Gaspar, Marcelo Argenta, Thaty Taranto, Gabriel Muglia e Jesus Machanoscki, no papel do próprio, se divertem bastante em suas cenas viscerais. Link do curta https://www.youtube.com/watch?v=3V6-F4e50YI

Trauma

“Trauma”, de Lucio A. Rojas (2017) Há tempos eu não assistia a um filme que me deixava tão irritado com o roteiro e com a forma como o Diretor manipula o espectador. Lucio A. Rojas é um cineasta chileno que produz filmes de terror independente com extrema violência, no estilo “O albergue” e “A Serbian film”. É desse último filme sérvio, condenado e proibido em vários países, que o filme chileno mais se aproxima. Pense numa cena onde o filho é obrigado a estuprar sua mãe! O pai é um General da ditadura chilena, no ano de 1978, e descobre que a esposa está envolvida com revolucionários. Ele a espanca e a tortura, e o clímax é obrigar o filho adolescente, Juan, a estuprar sua própria mãe. Em outra cena, esse mesmo filho, agora sendo “educado” pelo pai a praticar atos horrorosos com os revolucionários presos, é obrigado a estuprar um bebê!!! Para quem assistiu a “A serbian film”, imediatamente se lembrou da cena mais repugnante da história do cinema. “Trauma” é assim: um filme que provoca as piores sensações no espectador. Nos dias de hoje, 4 amigas decidem viajar até uma cidade no interior do Chile. Elas se perdem e vão parar em uma cidade inóspita. Lá, elas são estupradas e assassinadas com requinte de crueldade pelo já crescido Juan e seu filho, também treinado para praticar o mal. Em 1:40 horas, o filme desfile um rol de cenas que fazem “Jogos mortais” virar filme de criança. Não à tôa, a produtora se chama “Artexploitation” , deixando claro que é filme feito para explorar violência e sexo. Ara quem é fã daqueles filmes dos anos 70, que misturavam nazistas torturadores, lésbicas e muito sexo, vai adorar “Trauma”. Tem um casal de lésbicas que passam metade do filme fazendo sexo, e a outra metade, tendo as vísceras cortadas. Eu gosto de filmes “Torture porn”, mas precisam ter um roteiro decente. Não dá mais para assistir hoje em dia, personagens idiotas e imbecis, que toda vez que conseguem desarmar um dos torturadores ou escapar, não os matam e ainda resolvem voltar. E isso vale para todos os personagens: nenhum deles quer matar os assassinos, mesmo ele tendo já matado suas amigas!!!!!!!!! Tudo é revoltante, um ódio avassalador. No final, a vontade era de ter apagado o filme da mente de tão irritado que fiquei. Impossível indicar o filme para quem quer que seja: ou por causa da violência extrema, ou pelo roteiro indigente.

Parasita

“Gisaengchung”, de Bong Joon Ho (2019) Pasmo que essa obra-prima de Bong Joon Ho não tenha ganho a Palma de Ouro de roteiro em Cannes 2019. De lá, ele saiu com o prêmio máximo, a Palma de melhor filme. Mas é o caso de roteiro, escrito pelo próprio diretor, com tantas reviravoltas surpreendentes que fica impossível não mencionar o primor da escrita. O Sul coreano Bong Joon Ho já é conhecido por cinéfilos do mundo inteiro, tendo realizado filme extraordinários como “Mother”, “O Hospedeiro” e “Memória de um assassino”, além do ótimo “Okja” e do curioso “O expresso do amanhã”. Aqui, as lentes poderosas de Joon Ho apontam para uma cruel e violenta fábula sobre os ricos e os pobres, e a tentativa de ascenção dos menos abastados. A família Kim Ki-taek (Song ang Ho, protagonista de quase todos os trabalhos do cineasta) mora com sua família ( esposa e casal de filhos) no porão decadente de um prédio na periferia de Seul. Todos desempregados, eles vivem de pequenos golpes. Quando um amigo rico do filho o procura, oferecendo para ele ser professor de inglês de uma adolescente milionária, a família encontra a chance que tanto esperava para saírem do buraco. Um a um, eles vão se empregando na casa, e para isso, armando golpes para desempregarem os empregados da casa e assumirem os seus lugares. Variando em tons, que vão da comédia ao suspense, drama e até elementos de terror, o filme se aproxima mais da metáfora de “O hospedeiro”, que mesmo sendo um filme sobre um monstro que ataca a cidade, não deixa de ser um simbolismo para falar da família e da importância da união e do laço entre os membros. Como quase todo filme sul coreano, os personagens são retratados com uma caricatura que estimula o olhar do espectador para as diferenças, aqui no caso, de classes sociais e de comportamento. De anti-heróis, a família de Kim vai se tornando heroica, deixando claro que mesmo entre os golpistas, existe amor e compaixão. O filme tem muitas referências ao cinema dos irmãos Coen, especialistas em reviravoltas na trama e tornando tudo menos óbvio. Muitos pontos altos no filme: o elenco absolutamente espetacular, a direção de Joon Ho, repleta de maneirismos criativos, a fotografia que emoldura com cores os ambientes deixando bem distintas as castas econômicas e a trilha sonora, variando com o gênero. Uma cena exemplar e antológica: a da inundação no bairro de Kim. Genial!

Histórias assustadoras para contar no escuro

“Scary Stories to Tell in the Dark”, de André Ovedral (2019) Dirigido pelo Cineasta norueguês do ótimo “O Caçador de Trolls”, e co-escrito e produzido pelo mexicano Guillhermo del Toro, “Histórias assustadoras para contar no escuro” é baseado na série de livros homônimos publicados a partir de 1981 e escrito pelo americano Alvin Schwartz , que desenvolveu nos livros contos de terror para crianças. Os livros tinham ilustrações assustadoras feitas por Stephen Gammell e durante anos, foram proibidos de serem doados em bibliotecas públicas. O filme tem como base um grupo de adolescentes no ano de 1968, na cidade do interior Mill Valley. Os homens eram obrigados a se alistar na Guerra do Vietnã e Nixon inflava o nacionalismo nos Estados Unidos. Diante desse quadro caótico, os amigos Stella, Auggie e Chuck procuram se divertir na noite de Halloween. Cada um tem seus problemas familiares, mas o que os une é o bullying praticado pelo rebelde Tommy contra os 3. Quando os 3 resolvem se vingar de Tommy, acabam fugindo com a ajuda do mexicano Ramon, que desertou do alistamento. Eles se refugiam na mansão abandonada da família de Sarah Bellows. Sarah durante décadas foi considerada autora de crimes que vitimaram crianças. Ela ficou trancada no porão de sua mansão pela sua família. Lá, ela escreveu contos de terror. Stella encontra o livro e leva. A partir daí, o livro escreve suas próprias histórias, e cada um dos jovens presentes na mansão está fadado a morrer através de monstros que habitam o imaginário deles. O filme é uma mescla de “O iluminado”, “Dead note”, “Premonição”, a série “Stranger Things”, “It a coisa”, "A mosca", “A noite dos mortos vivos” e várias outras referências de terror para a geração nerd. Só a cena extraordinária no corredor vermelho do hospital já valia o filme. Primorosa, com uma fotografia e edição de som fantásticas, a cena é um show de Direção. Muitas outras cenas são primorosas. O elenco juvenil é competente, os efeitos especiais, bem ao gosto do estilo de del Toro, com seres fantásticos que parecem ter saído de “O Labirinto do Fauno”. Suspense, drama e suspense em doses que irã satisfazer os fãs de terror.

sábado, 10 de agosto de 2019

Light of my life

“Light of my life”, de Casey Affleck (2019) Longa de estréia do Ator Casey Affleck, que também escreveu o roteiro. Affleck já havia dirigido um documentário em 2010, “I’m still here”, sobre o seu amigo Joaquim Phoenix. Affleck escolheu um tema complexo para o seu debut na ficção: Um filme apocalíptico, onde só existem homens. Há 9 anos atrás, uma pandemia dizimou as mulheres do mundo. Affleck é um pai de uma menina de 11 anos, Rag, a única representante feminina do mundo. Ela tem 11 anos de idade, e o pai ( o personagem do pai não tem nome) quer que ela se comporte como um garoto, vestindo e cortando os cabelos dela como um menino. O pai quer protege-la do mundo, com medo de que os homens a sequestrem e estuprem. Aonde eles vão, se sentem constantemente ameaçados. Até que começam a desconfiar de Rag, que já está em fase de puberdade e passa a questionar o seu lugar no mundo. Brilhante fábula que reflete os papéis dos homens e mulheres no mundo. Affleck, que foi acusado de assédio sexual, parece querer pedir desculpas às mulheres nessa distópica fantasia, deixando claro a importância do feminino na sociedade. A personagem Rag vai aos poucos questionando a sua transição para menino, e inconformada, decide aceitar o sue papel de mulher, o que assusta o pai, que teme que ela seja eliminada do mundo. O filme , apesar de lidar com o fantástico, tem uma metáfora muito clara por trás de sua história. Casey Affleck foi bastante ousado, não abrindo concessões para que seu filme se tornasse mais comercial. Os elementos aqui são muito semelhantes ao de “A estrada”, suspense com Viggo Mortensen também sobre um pai que quer defender seu filho de um mundo que se torna canibal. Mas em Á estrada”, não há espaço para filosofias, é mais centrada na ação. No filme de Affleck, existem cenas extremamente longas e verborrágicas entre pai e filho ( Atuações brilhantes de Affleck e a menina Anna Pniowsky. Só o prólogo, dos 2 personagens na cama e ele contando uma história de ninar, dura mais de 10 minutos. Quem busca um filme de ação, passe bem longe. Quem deseja conferir um olhar mais autoral e instigante sobre futuros distópicos, é bem provável que vá gostar do filme, que mesmo assim, se tivesse uns 20 minutos a menos, teria sido bem melhor.

Uruguai na Vanguarda

“Uruguai na Vanguarda”, de Marco Antonio Pereira (2019) Distribuído pela Cavideo, “Uruguai na Vanguarda” traz uma interessante análise de um dos menores Países da América Latona, mas que se tornou uma referência para o Mundo em se tratando de avanços sociais e econômicos para o bem da sociedade: Leis que protegem a igualdade de gênero, a regulamentação da maconha, a lei da interrupção do aborto até 12 semanas, Direitos trabalhistas para todos e a liberação do Candombe, ritmo africano que se misturou à cultura de um País majoritariamente branco. Repleto de depoimentos de moradores, políticos, consumidores de maconha, representantes de movimentos LGBTQ+, feministas, sociólogos e historiadores, o filme faz uma pesquisa sobre a origem do País, e também, sobre hábitos e costumes antes e pós ditadura. Após a ditadura, que durou de 1973 a 1985, segundo depoimentos, 4 anos depois já havia uma pauta no Congresso apoiando uma cota de mulheres na política. O Uruguai sempre esteve na frente desses avanços todos. O tamanho do País e o fato de ser um Estado laico com certeza ajudaram muito a ser implementadas as leis. Com uma boa dinâmica e trilha sonora, o filme traz um painel curioso e didático sobre o nosso vizinho, e nos faz sair do cinema pensando a gigantesca diferença que existe entre o Brasil e o Uruguai.

quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Mulheres armadas, homens na lata

"Rebelles”, de Allan Mauduit (2019) Com esse título divertido em português, nenhum cinéfilo tem dúvida de que o Distribuidor quer seduzir o fã clube de Tarantino Guy Ritchie, e com toda a razão. O filme reúne todo o estilo narrativo, personagens bizarros dos 2 cineastas, ainda trazendo elementos icônicos da filmografia de ambos: hiper violência, trilha sonora que faz referência ao universo pop e do faroeste de Sergio Leone, e a indefectível cena onde todos os personagens apontam as armas um para o outro, cena que Tarantino criou em “Cães de aluguel” mas que já havia roubado de cults de Hong Kong. A diferença agora é que houve inversão dos protagonistas: as mulheres é que comandam a história. Elas são totalmente “Bad asses”: dão porrada, apanham, dão tiros e não têm dúvidas sobre que decisão devem tomar, além de cuidar dos afazeres do lar e do trabalho. Os homens aqui são todos escórias: ladrões, trapaceiros, assediadores. Sandra, Nadine e Marilyn trabalham em uma fábrica que produz latas de pescados. Apáticas com a vida que levam, repletas de problemas pessoais, elas não sabem como sair dessa fim de poço. Ao tentar evitar um assédio de um traficante, Sandra acaba provocando um acidente, e o traficante morre. Elas descobrem uma mala repleta de dinheiro, decidem mandar o corpo do traficante para o triturador e enlatar tudo e ficarem com a grana. O que elas não esperavam, é que os donos do dinheiro sujo fossem aparecer e fazer de tudo para reaver. A grande força do filme é o carisma das personagens e o talento das atrizes, que se divertem nessa fábula de humor negro. Cecile de France, Yolande Moreau e Audrey Lamy estão sensacionais. São anti-heroínas que o espectador irá amar torcer a favor, por mais merda que elas façam para si mesmas e para os outros. A sequência final, do tiroteio na casa, é um primor de direção e de non sense.

Piranhas

“La paranza dei bambini”, de  Claudio Giovannesi (2019) Esse filme é uma porrada! Nada muito diferente da situação que vivemos aqui no Brasil ou qualquer país do terceiro mundo: a escalada da violência nas periferias das grandes cidades, tendo agora como mentores do crime, adolescentes totalmente desprovidos de família, educação ou assistência social. É uma geração com pressa de acontecer, de ficar rico, de dizerem ao mundo que existem e saírem do anonimato. “Piranhas” é a gíria que se dá aos jovens sedentos de Poder que entram na Máfia italiana. Mais precisamente, na Máfia de Nápoles. O adolescente Nicola ( em sua estréia no cinema, um não ator, impressionante) mora com sua mãe e sue irmão pequeno em um pequeno sobrado. Cansado de ver a máfia local cobrando impostos da lavanderia decadente de sua mãe Nicola resolve tomar satisfação com o mafioso do bairro. Nicola acaba apanhando, mas repleto de Poder, se oferece para trabalhar para o chefão, cobrando impostos de comerciantes. Logo, Nicola e sua gangue passam a ganhar dinheiro, cheirar pó, circular com mulheres, tudo aquilo que a vida de luxo da cartilha do traficante demanda. Mas Nicola se apaixona por Letizia, que mora em um bairro comandado por outra Máfia, e assim, se inciia a sua derrocada. Escrito por Francesco Di Napoli, um dos roteiristas da série de sucesso “Gomorra”, de onde também vem o diretor Claudio Giovannesi, “Piranhas”tem ingredientes de todos os clássicos da Máfia “Era uma vez na América”, “Scarface”, “Os bons companheiros. Amizade, amor, traição são os temas comuns a esses filmes. O que difere esse filme dos outros, é o olhar realista sobre esse mundo sem perspectiva, sem glamour, sem piedade. No elenco, impressionantes jovens não atores dando vida a seus personagens raivosos, aliados à estética da câmera na mão que segue seus personagens, como nos filmes dos irmãos Dardenne. Mesmo não trazendo nada de novo na dramaturgia ( e mesmo assim, levando o Urso de Ouro de melhor roteiro no Festival de Berlin 2019), o filme comove pela dura realidade que destrói gerações. Aqui como lá na Itália, os sonhos estão sendo dizimados desde o berço.