domingo, 11 de agosto de 2019
Num ano com 13 luas
“In einem Jahr mit 13 Monden ”, de Werner Fassbinder (1978)
Realizado com extrema rapidez em 1978, “Num ano com 13 luas” é uma resposta de Fassbinder ao suicídio do Ator Armin Meier, também namorado do cineasta alemão, que o acusava de negligenciar o seu amor e não lhe dar atenção. Fassbinder se sentiu culpado pela morte de overdose de Meier e decidiu seguir até Frankfurt e rodar esse denso e provocativo drama assumindo quase todas as funções técnicas: Direção, roteiro, fotografia, câmera, direção de arte, montagem. O título significa que 1978 é um ano de 13 luas, e que esse fenômeno provoca em algumas pessoas uma tristeza profunda.
A protagonista do filme é Elvira, uma mulher trans (em atuação impecável de Volker Spengler). Antes de transitar, Elvira era Erwin, funcionário de um matadouro e casado com Irene, com quem teve uma filha, Marie Anne. Erwin no entanto se apaixonou pelo colega de trabalho, Anton, que disse ser impossível manter um relacionamento com Erwin, a não ser que ele se torne uma garota. Erwin resolve seguir até Casablanca e faz a mudança de sexo. Ao retornar como Elvira, ela sofre um duplo baque: Anton a rejeita, assim como sua esposa Irene. Elvira acaba se relacionando com um Ator, Christoph. Durante anos, eles se apaixonam, com Elvira sustentando o amante, mas quando Christoph passa a trabalhar, rejeita Elvira e passa a desprezá-la.
Fassbinder realiza um de seus filmes mais cruéis, e transforma Elvira em uma personagem aonde ele despeja todo o seu rancor pela sociedade: ela sofre, é desprezada, humilhada, espancada. Logo no prólogo do filme, buscando um pouco de amor, Elvira vai até um lugar de pegação gay, mas é espancada pelos gays que descobrem que ela é uma trans. Em 1978 Fassbinder já foi vanguarda ao tratar do tema da Trasnfobia entre a própria comunidade gay.
Fassbinder faz várias referências cinematográficas: além dos melodramas clássicos de Douglas Sirk, fonte eterna de seus dramas com protagonistas femininos, temos “Amarcord”, de onde vem a trilha sonora de Nino Rota, acompanhando as entradas em cena da prostituta Zora. Na apresentação de Anton, o vemos já milionário, assistindo na tv a cena da parada com as mulheres do filme “O meninão”, com Jerry Lewis e Dean Martin.
Duas grandes polêmicas surgiram por causa do filme: o personagem Anton é um judeu sobrevivente dos campos de concentração. Logo depois se tornou um milionário, aprendendo a ganhar dinheiro com informações de judeus que foram mortos nos campos. Se tornou um homem desprezível e frio. Fassbinder foi acusado por boa parte da mídia de anti-semitismo. Outro momento desconfortável, é na famosa cena do suicídio de um ex-funcionário de Anton. Elvira presencia o homem se preparando para se matar, e nada faz: ele se enforca na sua frente, com todo um ritual de preparação. Essa cena seria uma forma de Fassbinder se colocar no lugar de Elvira como se testemunhasse o suicídio de Armin e nada fez para impedir.
Depressivo mas ao mesmo tempo fascinante, “Num ano de 13 luas” é um filme obscuro de Fassbinder que tive o prazer de descobrir ao assistir a um documentário sobre a obra do cineasta.
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