quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Maacher Jhol – O peixe com curry

“Maacher Jhol – the fish curry”, de Abhishek Verma (2017) Que lindeza esse curta de animação LGBTQ+ indiano. Realizado com extrema delicadeza, o filme foi escrito, dirigido e desnehado por Abhishek Verma. O filme conta a história de Lalit, um rapaz de 28 anos, que deice contar aos seus pais que é gay. Para isso, ele resolve preparar o Maacher Jhol, um famoso prato indiano, que consiste em um peixe refogado com bastante curry. O Maacher Jhol é o prato preferido de seu pai. Quando o pai chega, de cara pergunta ao filho quando vai se casar, e apresenta fotos de 3 candidatas. Muito lindo, e com um roteiro sensível e uma trilha sonora repleta de canções de Bollywood. O filme ainda apresenta em um clip como preparar o peixe, que é realizado por Lalit com muito amor. Os traços são simples mas bastante belos. As cores também, em tons de cinza dourado. Amei muito.

Homem livre

“Homem livre”, de Álvaro Furloni (2018) Drama psicológico que procura se aproximar da claustrofobia do Cinema de Roman Polanski, filmado quase todo em ambientes fechados e escuros. O protagonista é Helio Lotti (Armando Babaioff), um cantor pop que caiu em desgraça após cometer um assassinato. Assim que sai da prisão, seu irmão o instala em uma Igreja evangélica no bairro de Piedade, Rio de Janeiro, cujo Pastor , Galeno (Flávio Bauraquij, procura acolhê-lo da melhor forma possível. Mas Helio acredita que as pessoas da igreja de alguma forma possuem algum plano para ele, e entre delírios e realidade, as coisas se misturam. Um bom exemplo de cinema de baixo orçamento que tem um roteiro adaptado ao seu orçamento, com uma boa história e ótimos atores. A fotografia achei escura demais, tinham cenas que eu não consegui enxergar direito o que estava acontecendo. O trabalho da edição de som é muito interessante, trazendo elementos de suspense psicológico. O desfecho achei um pouco confuso, acredito que o roteirista a do diretor quiseram deixar em aberto mesmo. “Homem livre” sai dos estereótipos quando mostram uma Igreja evangélica querendo demonizar todos aqueles que fazem parte. Todo mundo ali tem culpa no cartório, mas pelo menos são representados de forma realista e sem caricaturas.

Os vivos serão devorados

“Mangiati vivi!”, de Umberto Lenzi (1980) O cinema italiano do final dos anos 70 e até meados dos anos 80 foi recheado de filmes que exploravam o gênero “exploitation”, muito por conta do sucesso de “Mondo cane”, famoso documentário de 1962 que mostra atrocidades reais cometidas por homens do mundo todo, sejam eles civilizados ou primitivos. “Mondo cane” fez muito sucesso, provando que o trinômio Sexo, morte de animais e violência extrema eram sinônimos de bilheteria. Logo, filmes que tinham tribos de canibais se tornaram um grande filão, tendo como expoente máximo a obra-prima de Ruggero Deodato, “Canibal Holocausto”, homenageado por Eli Roth no seu filme “Inferno verde”. Uma mulher, Sophie, é chamada pela polícia em Nova York; foi encontrado no bolso de um asiático, que morreu atropelado após matar 3 pessoas, um filme em super 8 que mostra a sua irmã Diana, que está desaparecida. Nas cenas, vemos Diana participando de um ritual primitivo na Nova Guiné. Sophie viaja até lá, e contrata o desertor ex-combatente do Vietnã Mark, um tipo meio Indiana Jones. Eles entram na densa floresta e além de encontrar uma tribo de canibais, descobrem uma vila onde está a seita de Jonas, um guru perigoso que trouxe americanos e nativos para o local, entre eles, Diana. O filme é repleto de cenas onde animais são mortos ou devorados por outros animais, são cenas realmente chocantes e dão um tom bastante cruel para o filme. A cena final, com duas personagens sendo devoradas pelos canibais, também é um festival de sadismo. Seios, pernas, braços são devorados de forma explícita. Além disso, o filme tem vários cenas de abuso sexual e estupro, e pobres mulheres, elas estão ali apenas para terem seu corpo explorado de todas as formas possíveis e seviciadas. Mas esse era o filão desses filmes exploitation, que mesmo datados, divertem pela forma tosca e grosseira como apresentavam as cenas de sexo e viol6encia: sangue falso, homens feios em closes, tudo é muito apavorante. Obviamente que o filme não pode ser apreciado por qualquer espectador. Mesmo exageradas, as cenas provocam um desconforto muito grande. É o ser humano insultado da forma mais vil possível. O Cineasta Umberto Lenzi merecia um documentário sobre a sua filmografia: além de filmes de canibais, ele filmou uma paródia de "Um corpo que cai", chamado "Paranóia", e outro do James Bond, além de outras pérolas.

Meatoo

“Meatoo”, de Dean Loxton (2019) Excelente curta-metragem inglês LGBTQ+ de apenas 4 minutos e que apresenta a relação de Poder no audiovisual, através da autoridade de um Diretor perante um ator em busca de trabalho. Um Ator vai para uma audição onde se encontra apenas o Diretor. O Diretor pede que ele fique de cuecas. O diretor lhe faz perguntas sobre as considerações dele como ator em relação ao personagem: “O personagem é gay”, “tem cenas de sexo”, tem nudez”. “Algum problema? . Diante da negativa do Ator para todas as respostas, o Diretor pede que o rapaz explore o corpo durante a audição: faça exercícios como flexão, agachamento, etc, enquanto observa voyeuristicamente o corpo definido do rapaz. No final, o diretor diz ao rapaz que outros atores virão ao teste, mesmo assim ele faz um convite ao rapaz para um “jantar delicioso”. Esse tipo de situação é clichê em qualquer ambiente, indiferente da profissão e do gênero. Filmado como se estivéssemos no lugar do Diretor, realçando cada detalhe do corpo do jovem Ator, e provocando essa sensação de vouyeur que existe em cada espectador de cinema, o filme discute o limite entre o assédio e o profissional, além da relação de Poder. Belíssima fotografia e enquadramentos. O título faz uma clara e óbvia alusão ao Movimento #Metoo.

Four quartets

“Four quartets”, de Marco Alessi (2018) Exibido em prestigiados Festivais internacionais, entre eles o Festival de Berlin, de onde saiu com uma menção especial, e no BFI London Film Festival, “Four quartets”, é um musical sobre o outting de um adolescente, Raf, que vai até uma boite gay e lá ele se solta, exorcizando todos os seus traumas e medos de se revelar como gay. Ali é o seu altar ( como diz na música tema “Altar of me”). Ele flerta, ele dança com drag queens, ele presencia todos os tipos de cores, gêneros, amores. Paralleo, o filme apresenta flash backs de Raf criança e adolescente e o seu despertar sexual para a homossexualidade. Um lindo filme, sem diálogos, apresentado como um musical. Com ótima trilha, fotografia estilizada e figurantes que fazem parte da estética do filme, “Four quartes”, mais do que um filme, é um grito de liberdade Queer.

Calmaria

"Serenity", de Steven Knight (2018) “Calmaria” é um filme estranho, que mistura muitos gêneros e que toda parece algum filme ou seriado. Parece “Black mirror”, parece “O Show de Truman”, parece “Corpos ardentes”. É drama, é romance, é fantasia e é filme noir de suspense. Com tanta mistura, o filme acaba ficando sem muita personalidade, o que é uma pena. Com um elenco poderoso que vai de Matthew McConaughey, Anne Hathaway, Jason Clarke, Djimon Hounsou e Diane Lane ( esses 2 últimos desperdiçados em personagens esquemáticos e sem vida), “Calmaria” foi dirigido pelo Diretor inglês Steven Knight, que dirigiu os ótimos “Locke” e “Coisas sujas e belas”, além de ser o roteirista de “Senhores do crime”, um dos melhores filmes de David Cronemberg. Baker (Matthew McConaughey) é um guia turístico de uma Ilha paradisíaca em Plymouth. Ele leva turistas de barco para o alto-mar, na missão de pesar o maior atum da região, conhecido como “Justice”. Um dia, sua ex-mulher, Karen (Hathaway) surge, fazendo um estranho pedido: que Baker mate seu marido, que por anos tem praticado atos de viol6encia doméstica contra ela. Baker está com dívidas e por isso, entra em um conflito, se deve aceitar ou não a missão. Quando ele descobre que seu filho Patrick também sofre abusos, Baker resolve botar o plano em atividade. Steven Knight, que também escreveu o roteiro, além de todas as referências que dei acima, também quer surpreender o espectador com uma reviravolta à la Shamayalan. Quando essa revelação vem, a gente fica com o pensamento tipo: “que filme doido!”!!! De fato, muitos ácidos foram tomados por Steven, mas enfim, melhor embarcar na história e seguir adiante. Tivesse tido uma condução mais interessante, talvez o filme tivesse ficado melhor. Investir mais em suspense, ou ter um vilão e fato mais brutal. A verdade é que no final, fica uma sensação estranha, quando o adolescente Patrick toma uma certa atitude. Final feliz a qualquer custo, mesmo que em situação moralmente polêmica. Os atores fazem o que podem, mas parecem estar todos no automático, o que pensando bem, faz até sentido.

Intimidade entre estranhos

"Intimidade entre estranhos", de José Alvarenga Jr (2018) O fascínio de adolescentes por mulheres mais velhas já rendeu verdadeiros clássicos do cinema: “A primeira noite de um homem”, “Ensina-me a viver”, “Era uma vez um verão”. Todos esses filmes com altas doses de romantismo e o famoso “Coming of age”, termo americano dado a filmes onde os personagens jovens passam por experiências que os tornam mais maduros e prontos para enfrentar a vida adulta. Em “Intimidade entre estranhos”, o assunto é exatamente esse. Matheus Souza, o roteirista, estourou aos 20 anos de idade com “Apenas o fim”. 10 anos se passaram, e aos 30 anos, Matheus coloca Horácio (Gabriel Contente) como o seu alter ego: é através dele que ele fala de rock , de amor adolescente, de frustração amorosa, de morte. Horácio é um adolescente com alma velha. Os personagens do filme vivem um eterno luto: no caso de Horácio, a morte de sua avó, que criou ele. No caso de Maria (Rafaela Mandelli) e Pedro (Millhen Cortaz), é o luto pelo amor perdido e determinado a morrer. Maria retorna ao Rio de Janeiro, anos depois te ter trocado por São Paulo, aonde conheceu Pedro. Esse foi contratado por uma emissora de Tv carioca para interpretar Noé. Maria sente ciúmes da parceira de cena de Pedro, e ao mesmo tempo, se irrita com Horácio, uma figura solitária, exótica ( dorme em uma cama caixão) e que ela pasma, descobre ser o síndico do prédio. Logo Maria e Horácio se conectam através da solidão. “Intimidade entre estranhos” tem de melhor o trabalho dos 3 atores. Uma pena que José Dumont, excelente ator, faça uma ponta tão mínima, no papel do porteiro. O filme, diferente de outros roteiros escritos por Matheus Souza, investe em um drama mais denso, com personagens repletos de traumas e frustrações. São muitas as cenas onde os personagens expõem seus medos e inseguranças, embalados por uma fotografia muito escura e uma trilha sonora melancólica. Algumas referências ao universo de Matheus Souza se fazem presente bem ali, ao fundo: Gang 90 e as absurdetes, o próprio apartamento de Horácio, repleto de universo Geek em tudo quanto é canto. Por isso, quem for buscar assistir ao filme achando que irá encontrar uma comédia de Matheus Souza, irá se frustrar. O humor só existe nas cenas da novela bíblica, ridicularizadas, e no ar patético do personagem de Pedro.

Crepúsculo

"Dusk", de Jake Graf (2017) O roteirista e Cineasta Jake Graf é um Homem Trans inglês, e com seus filmes já recebeu quase 60 prêmios internacionais. "Crepúsculo", super premiado em diversos Festivais, busca referência na própria vida de Jake. Um homem trans idoso observa duas crianças brincando no jardim. Com essa imagem, o filme volta em flashbacks e apresenta Chris, uma menina de 2 anos. Chris cresce e adolescente, se interessa por Julie, uma colega da classe, por quem se apaixona. Mais tarde, já adulta, Chris transiciona e se torna um Homem Trans. Sofrendo rejeição da sociedade conservadora, e também de Julie, que não aceita a transição. Mas o amor entre Julie e Chris continua forte, e Julia volta para ele. Mas Julie sofre um ataque de homofóbicos. O filme retorna para os dias de hoje, mostrando Chris idoso e trazendo uma revelação surpreendente, Com uma história muito curiosa ( o próprio Diretor Jake Graf se tornou um Homem trans que ele mesmo chama de lésbico, por manter relação com uma mulher), o filme tem como protagonista na fase adulta a atriz e modelo Elliott Sailors, que se reinventou na carreira ao optar em ser um modelo masculino, mesma ela sendo Cis e mantendo a sua heterossexualidade ( ela é casada com um homem).

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Ana e Vitória

"Ana e Vitória", de Matheus Souza (2018) O que mais me espanta nesse musical romântico, é a longa duração!! Quase 2 horas, voltado para um público adolescente e "Millenium", acostumado a vídeos curtos de youtube. O filme é uma cinebiografia livremente inspirada na formação da dupla de cantoras de Tocantis Ana e Vitória, nome artístico Anavitória", que bombou justamente com o público jovem de Youtube e afins. No filme, ambas se reencontram no Rio de Janeiro durante uma festa regada a música e muita pegação sem compromisso. Nesse universo jovem de Matheus Souza, todo mundo vive conectado, mal se falam ao vivo, se correspondendo através de Face, Instagram, Stories , Snapchat, etc. O filme busca essa linguagem de mensagens e videozinhos que surgem na tela. Apostando mais nas histórias de amor do que no sucesso em si das meninas, vemos muitos e muitos relacionamentos da dupla, com meninos, meninas, deixando claro a bissexualidade e até uma mensagem muito boa de que a garotada não curte caretices. A fotografia, de Flora Dias, e a Direção de arte de Fernanda Teixeira, aliada ao repertório adocicado da dupla, tornam o ato de assistir ao filme uma experiência daquelas que a gente fica o tempo todo falando: "que filme fofo!". Mas além da longa duração, o que mais peca no filme? O nítido desconforto da dupla com os diálogos decorados. Quando elas abrem a boca para cantar, é uma maravilha. Mas quando estão em personagens, é gritante a diferença entre elas e qualquer ator que contracena com Ana e Vitória. Fosse um filme de Robert Bresson, até faria sentido esse papel de "Modelo", pois Bresson odiava atores. Mas aqui, ficou mesmo a impressão de que o filme seria muito mais cativante se tivessem investido mais na performance dramática delas.

Nós, não mais

"Vi finns inte längre", de David Färdmar (2018) Escrito e dirigido pelo sueco David Färdmar, "Nós, não mais'é uma versão LGBTQ+ do clássico de Bergman "Cenas de um casamento". O jovem casal gay Hampus e Adrian mora há anos juntos. Adrian é centralizador e sempre contesta Hampus em todas as opiniões dele. Cansado de ser constantemente criticado, Hampus decide pôr um fim à relação. essa notícia destrói Adrian emocionalmente. Enquanto discutem a partilha dos bens, Adrian tenta reconquistar o amor que um dia, Hampus teve por ele. Com ótima performance dos 2 atores, o filme tem bons diálogos e belos momentos de silêncio. Não é nenhum primor, mas um filme decente e que cumpre a função de apresentar uma boa história.

O Amor

"L'amore", de Roberto Rosselini (1948) Após o grande sucesso mundial de sua trilogia da Guerra “Roma, cidade aberta”, “Paisá” e “Alemanha ano zero”), Roberto Rosselini resolve falar sobre o amor, e realiza um filme em 2 episódios. Anna Magnani, sua esposa na época, protagoniza as duas histórias. Logo na cartela inicial do filme, temos a seguinte dedicatória: “ O filme é uma homenagem à Arte de Anna Magnani.”, assinado pelo próprio Rosselini. A primeira história é uma adaptação da peça teatral de Jean Cocteau, ‘A voz humana”, encenada desde 193 em palcos do mundo inteiro. O texto foi escrito para ser um monólogo de uma atriz, desencantada com o rompimento de seu namoro com um amante, que a abandonou por uma outra mulher. A personagem de Anna Magnani permanece no quarto o filme todo, falando ao telefone com o ex, desesperadamente tentando reatar a relação. Às vezes a ligação cai, ou entra uma linha cruzada e ela perde a razão. Rossleini conseguiu a proeza de trazer elementos cinematográficos a um texto onde a personagem passa o tempo todo colada com um telefone ao ouvido, e muito da força do filme obviamente se deve a essa forca magnânima chamada Anna Magnani, uma das maiores atrizes de todos os tempos, repleta de dramaticidade. O filme, ironicamente, acabou sendo um presságio para a vida pessoal de Magnani, pouco tempo depois. Casada com Rosselini, ele conhecer Ingrid Bergman e ambos se apaixonaram durante as filmagens de “Stromboli”, de 1950. Rosselini abandonou Magnani que ficou emocionalmente destruída. O 2o episódio se chama “O Milagre”, e foi escrito por Federico Fellini, que interpreta um homem malandro confundido com a ingênua Nanninni (Magnani) com o são José. Acreditando ter tido a visão do Santo, Naninni acaba se embebedando e o homem a estupra. Quando acorda, a pobre mulher, que nem tem aonde cair morta nem o que comer, não se lembra do ocorrido. Meses depois, ele descobre estar grávida. Ela crê estar grávida do espírito Santo, mas os moradores da cidade dizem que ela está louca e zombam dela, assim como cristo na Via Crucis. É um episodio cruel, e Rosselini faz uma dura crítica à ingenuidade de pessoas que colocam a fé em um estágio de cegueira. Nos Estados Unidos, esse episódio foi proibido, acusado de blasfemo pelos católicos. Rosselini dirige o filme com maestria, e mesmo os não atores balanceiam bem com a força de Magnani. A trilha sonora e a fotografia em preto e branco reforçam a dramaticidade das histórias.

Marguerite

"Marguerite", de Marianne Farley (2018) Franco favorito para ganhar o Oscar 2019 na categoria curta de ficção, o filme perdeu para o americano "Skin". "Marguerite" ganhou mais de 20 prêmios, entre eles, o Festival Mix Brasil. Marguerite é uma senhora de 80 anos, necessitada de cuidados de uma enfermeira, Rachel, na faixa dos 40 anos. Quando Marguerite descobre que Rachel namora uma mulher, ela rememora uma paixão platônica que ela teve por uma mulher, antes de se casar com seu falecido marido. Delicado e sensível, essa maravilha de curta escrito e dirigido por Marianne Farley com extrema poesia. Todo calcado no trabalho formidável das 2 atrizes, Béatrice Picard e Sandrine Bisson, o filme comove pela cinematografia, pela fotografa e trilha sonora. Um grande achado, : Marguerite" tem um desfecho que irá fazer muita gente chorar.

Albatroz

“Albatroz”, de Daniel Augusto (2018) Realizador da adaptação cinematográfica do filme sobre Paulo Coelho, “Não pare na pista”, Daniel Augusto busca referências em David Lynch, Kafka, Salvador Dali, Bunuel e Ionesco para contar a história de Simao(Alexandre Nero), um fotógrafo casado com uma compositora de jingles publicitários ( Maria Flor) e que viaja para Jerusalém com uma atriz (Camila Morgado) para fazer fotos de trabalho. Chegando lá, ele testemunha um atentado e acaba se aproveitando das fotos para se promover. Simão acaba em desgraça , sendo linchado moralmente pela opinião pública. A partir daí, sua vida vagueia por delírios e surtos psicóticos que trazem lembranças de uma amante do passado ( Andrea Beltrão) e a neurologista que ela conheceu ( Andre Horta). Nesse espiral de non senses, ainda há espaço para um País fictício chamado Albatroz, e elementos de ficção científica. Bom, não é uma tarefa fácil tentar buscar compreensão no filme. Ele é complexo e você sairá do filme com aquela cara de “ E...???” Para quem se deixar levar apenas por percepção sensorial, pode curtir o filme. Ponto para a fotografia de Jacob Solitrenick e a edição de Fernando Stutz. O elenco all star é um triunfo para dar credibilidade a esse projeto estranho de um gênero inédito para a cinematografia brasileira.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Paisá

Paisan", de Roberto Rosselini (1946) Segunda parte da Trilogia da Guerra de Rosselini, iniciada com “Roma Cidade Aberta” e finalizada com “Alemanha ano zero”. “Paisá” é composto de 6 episódios, e mostra a chegada dos aliados americanos na Itália durante a 2a Guerra. Chamado em Portugal de “Libertação”, o filme conta histórias sobre a relação entre os italianos e seus libertadores. Em ordem cronológica, acompanhamos a evolução da Guerra de 1943 a 1945. Episódio 1 ) Em 1943, uma frota americana desembarca em um vilarejo italiano na costa da Sicilia. Uma camponesa, Carmela, guia a frota pelo penhasco para leva-los até os soldados alemães e armar uma emboscada. Quando o grupo se divide, Carmela fica sozinha com o soldado John. Ele se enamora dela e diz que quer leva-la até os Estados Unidos. Os alemães chegam e o matam. Carmela, vendo que seu sonho acabou, mata um soldado alemão. A frota americana chega, e acham que foi Carmela quem matou John. Episodio 2) Soldados americanos e ingleses desembarcam em Nápoles e a tomam. A cidade se torna um importante ponto logístico. Um menino italiano, que vive de pequenos roubos para poder sobreviver, se aproveita da embriaguez de um soldado negro americano e rouba suas botas. O soldado descobre o roubo e obriga o garoto a devolve-lo. Ao chegar na periferia e entender a real situação de pobreza extrema do menino e das pessoas que ali moram, o soldado desiste e vai embora. Episódio 3) em 4 de junho de 1944, os italianos comemoram a retirada da tropa alemã de Roma. A cidade é tomada com alegria pelos aliados. Um soldado americano bêbado se apaixona por uma jovem Francesca, que lhe oferece um copo de água e promete retornar. Seis meses depois ele retorna, mas Francesca é agora uma prostituta. O soldado não a reconhece, ela o leva até um quarto de hotel. Ele diz que seu desejo é reencontrar Francesca e casar com ela. Francesca vai embora enquanto o soldado dorme e escrever um bilhete dizendo para ir encontra-la em um endereço, para que ela possa voltar a ser a Francesca dos sonhos do soldado. Esse é o episódio mais triste de todos, mais cruel que o de “Carmela”. Episódio 4) Uma enfermeira americana segue até Florença para salvar o seu amado, um líder da resistência que está cercado pelos alemães. Ela o conheceu quando morava em Florença e ele era um pintor, e agora, precisa aravessar as linhas inimigas para chegar até ele. Episódio 5) Em um Mosteiro Franciscano nos Montes Appeninos, 3 soldados americanos pedem para passar a noite. Os monges aceitam, mas logo descobrem que os 3 são Capelães: um católico, 1 protestante e o outro judeu. Os monges discordam da presença do protestante e do judeu e exigem que eles sejam convertidos, fazendo greve de fome. Episódio 6) às Margens do Rio Pó, meses antes do fim da guerra, um grupo de resistentes é feito prisioneiro pelos alemães. No final, os prisioneiros são jogados ao mar. Como todo filme em episódios, existe uma desigualdade na qualidade entre os curtas. Os que mais gostei foram os episódios 1, 2 e 3. São histórias de amor e de amizade, que falam da possibilidade entre uma união entre povos e culturas distintos. É um filme desesperançoso, triste, cruel, assim como são os outros 2 filmes da trilogia de Rosselini. Para os padrões do Neo-realismo, achei até o filme muito bem produzido, com alto custo, mesmo filmando em locações reais e usando não atores.

Alemanha ano zero

"Germania anno zero", de Roberto Rosselini (1948) Vencedor do Grande prêmio do festival de Locarno em 1948, “Alemanha ano zero” é uma das mais trágicas e desesperançosas histórias contadas no cinema. Roberto Rosselini é um dos maiores expoentes do neo-realismo italiano, e realizou uma trilogia chamada “trilogia da guerra”, composta por “Roma, Cidade aberta”(1945), “Paisá”(1946) e “Alemanha ano zero”(1948. O filme foi rodado em Berlin no ano de 1947, e como reza a cartilha do movimento, Rosselini usou não atores. Berlin estava totalmente destruída e bombardeada, e só se v6e destroços e ruínas por todos os lados. Nesse ambiente de total desolação, viva Edmund, um menino de 12 anos, que vagueia pelas ruas da cidade tentando levantar um dinheiro para ajudar a sua família, composta por 4 membros: o pai, um ex-militar nazista que está adoentado na cama; a irmã, que se prostitui com soldados aliados; o irmão mais velho, nazista, que se esconde em casa com medo de ser preso; e Edumund. O problema é que a família recebe 3 cartelas do governo de alimentação, pois o irmão mais velho, por estar escondido, não recebe. Edmund fica na rua fazendo de tudo para ganhar dinheiro. Ele reencontra um ex-professor pedófilo que alicia garotos para levar a velhos pedófilos. Edmund resolve atender aos pedidos do pai, e o mata. Isso traz uma crise de consciência ao menino, que o atormentará até um desfecho cruel. Logo no início do filme, Rosselini apresenta uma cartela, dando o seu ponto de vista do porquê fazer um filme mostrando o povo alemão do pós-guerra: “ Não é uma acusação contra o povo alemão mas uma documentação de três milhões e meio de pessoas tentando sobreviver. Não quero recriminar ou perdoar os alemães.” Impressiona a performance do jovem menino Edmund Moeschke no papel de Edmund. Repleto de nuances, o garoto dá vida a um garoto em conflito. O filme lida com temas muito complexos e bastante ousados até para o dia de hoje, envolvendo um protagonista infantil: pedofilia, suicídio, assassinato, roubo. O filme é um fenomenal material de arquivo de uma época, totalmente filmado em locações, mostrando uma Berlin devastada, 2 anos depois do final da 2a guerra. O que mais impressiona, é a velocidade com o qual o País se reergueu. O filme é uma grande metáfora sobre uma geração que cresceu sob o signo da derrota, da baixa autoestima que dizimou um povo, cidade e uma cultura. Edmund é essa Alemanha nova, e sue pai, a Alemanha antiga, que precisa ser derrotada e enterrada. Só que mesmo essa nova Alemanha, esse ano zero da reconstrução, não se encontra em estado favorável para reflexão. O filme é uma grande obra-prima, presente em quase todas as listas de melhores filmes de todos os tempos. Obrigatório.

domingo, 24 de fevereiro de 2019

RBG

“RBG”, de Julie Cohen e Betsy West (2018) Documentário finalista ao Oscar 2019, “RBG” é um retrato da ponderosa Juíza Americana Ruth Bader Ginsburg , tida como ícone Pop nos Estados Unidos, aos 85 anos de idade. Ela já foi tema de um filme, “Suprema”, tem o apelido de “Notorius RBG”, referência ao rapper “Notorius BIG” , além de ter sua imagem usada em filmes como “Deadpoll2”, “Uma aventura Lego 2” e no ‘Saturday night live”. Em 1993, Ruth foi empossada pelo Presidente Bill Clinton à uma vaga na Suprema Corte, feito só ocorrido com uma outra mulher até então. O filme apresenta Ruth, mostrando a sua infância, sua relação com seus pais judeus, que fugiram para os Estados Unidos e viveram lá a partir dos anos 30, época em que ela nasceu. Rutgh teve uma educação bastante rígida, e sua mãe lhe pediu 2 coisas: “seja uma lady” e “seja independente”. Ruth é conhecida por jamais gritar, sempre reservada e educada, e por isso mesmo, se fazendo ser bastante respeitada. Ela fala de sua relação com o seu marido Marty, que ela conheceu em Cornell, estudando direito, em 1950. Ruth foi das poucas mulheres que puderam estudar direito, uma profissão até então reservada para os homens. Marty sempre a apoiou. Quando tiveram uma filha, Ruth teve que cuidar da filha e de Marty, que estava doente de câncer. Workaholick, estudava por ela e por Marty. O grande feito de Ruth em sua vida profissional foi defender os direitos das mulheres, lutando pela igualdade social, salarial, e também, defender negros e minorias. É lindo ouvir Ruth falando de sua paixão pela Ópera, quando ela se faz sair de sua realidade do lado de fora e se deixa envolver pelo drama e pela música. Mas o momento mais lindo e emocionante é quando Ruth fala de seu marido Marty. Sempre alegre, brincalhão, contrastando com o jeito sério de Ruth, eles se conheceram no ano de 1950 e conviveram mais de 56 anos juntos. Ele sempre a apoiou e participou de todas as lutas que ela teve que enfrentar. Uma linda história de amor, que jamais fez com que ela perdesse o foco também no trabalho e no amor ao próximo. Um exemplo de ser humano a ser seguido.

Sergei Sir Gay

"Sergei Sir Gay”, de Mark Rappaport (2016) O cineasta independente americano Mark Rappaport faz uma excelente tese sobre o homoerotismo na filmografia de Sergei Einseisnten, um dos maiores Cineastas russas da história do cinema. Rappaport começa o filme apresentando inúmeras ilustrações feitas pelo próprio Eisenteisn quando adolescente, e ele assinada os desenhos como ‘Sir Gay”. São desenhos pornográficos, mostrando homens fazendo sexo em situações de fetiche extremo. Logo, o cineasta faz uma comparação entre essas ilustrações e cenas icônicas dos filmes de Eisentein: “O encouraçado Potenkin”, “Que Viva Mexico”, “Ivan, o terrível”, “Greve”, entre outros. Os homens são sempre apresentados desnudos ou com roupas rasgadas, corpos musculosos, viris. Depois são apresentadas comparações com a figura de São Sebastião, imagem que Eiseinteisn tinha como fetiche e que ele performou em quase todos os seus filmes. Também temos imagens de sadomasoquismo, bondage, com personagens dos filmes sendo amarrados com cordas e dependendo o ponto de vista, sentindo prazer através da dor. Mas o melhor do documentário está em seu terço final. O filme apresenta inúmeros cineastas gays que escalaram seus amantes em seus filmes e os tornaram ícones do cinema: Jean Cocteau com o seu ator fetiche Jean Marais; Fassbinder e seus vários amantes negros; Visconti com Massimo Girotti, Alain Delon e Helmut Berger, que receberam closes homoeróticos sem seus filmes; e finalmente, Eisenteisn, que escalou 2 de seus amantes: “Grisha” Alexander Grigorov e Sacha. O fetiche de Eisenteisn por eles era tanto, que escalou os 2 para papéis fundamentais em ‘O encouraçado Potenkin”: Grisha era o capitão, e Sacha o líder dos grevistas. Na cena onde os dois duelam, Eisenteisn dizia que se imaginava no meio dos dois, e que desejava ser disputado pelos dois. O filme também fala do período em que v filmou no México nos anos 30, onde realizou ‘Que Viva México”. Ali, ele teve experiências homossexuais com jovens nativos, retratado no documentário ficcional de Peter Greenaway, “Que Viva Eiseinstein: os 10 dias que abalaram o México”.

Um dia de ontem

"Um dia de ontem", de Thiago Luciano e Beto Schultz (2009) Drama intimista com narrativa que passeia pelo experimentalismo, “Um dia de ontem” foi escrito e dirigido por Thiago Luciano e Beto Schultz. O filme apresenta Pepe (Caco Ciocler) , um violinista que tem um trauma de infância, quando seu pai adotivo, um músico vivido por Pietro Mario se suicida. Por conta desse evento, Pepe ficou surdo de um ouvido. Adulto, Pepe se isola das pessoas e do mundo. Se tranca em seu pequeno apartamento, passando o dia todo vendo tv e a todas as suas programações, desde seriados até programas sensacionalistas. Ele assiste a filmes pornôs e a filmes obscuros que ele pega com o dono de uma loja bizarra, dono de um gato. Pepe toca duas vezes por semana em uma churrascaria e mantém relacionamento com prostitutas. Um dia, o dono do gato pede que Pepe cuide de seu gato. Nessa sinopse, contei o filme todo. Em 82 minutos, o filme se estica em devaneios estilísticos, momentos intermináveis de solidão e que muito pouca coisa acontece. Talvez os diretores quisessem passar para o espectador essa sensação de tédio, mas de qualquer forma, é bem difícil ter interesse no filme em toda a sua duração. Caco Ciocler é um ótimo ator e aqui ele tenta dar consistência ao personagem, mas os outros atores estão perdidos em tons que não combinam com o filme.

Uma nova chance

"Second act”, de Peter Siegel (2018) A crítica em peso meteu o cacete nessa comédia dramática estrelada pela Cantriz Jennifer Lopez e co-estrelado por outra Cantriz, Vanessa Hudgens, que reinventou a sua carreira e está no sensacional filme de ação “Polar’, com Maks Middelsen. A verdade é que “Uma nova chance” é um filme bem Ok para se assistir naquele dia de tédio, pois ele possui todos os clichês do gênero e por isso dá para quebrar um galho. Pegando carona em “O diabo veste Prada” e “Uma secretária de futuro”, filmes onde as protagonistas comem o pão que o diabo amassou e por conta de sua destreza de lidar com a vida dura elas se dão bem no final. Lopez interpreta Maya, uma mulher que não teve condições de estudar e isso acaba impedindo que ela cresça na empresa onde ela trabalha, um supermercado. Seu sobrinho nerd acaba criando um Cv falso para ela e por conta disso, ela é chamada para uma entrevista em uma Multinacional de cosméticos, e acaba sendo contratada. Logo, ela disputa espaço com a vice-presidente, Zoe (Hudgens) e ambas competem para criar um cosmético 100% natural. Mas como todo filme romântico, Maya coloca o trabalho em primeiro lugar, e isso afeta o seu relacionamento com seu namorado, que deseja ter filhos. O filme foi bastante criticado por conta de uma reviravolta na história que todo mundo disse ser inverossímel. De fato, é um plot bem típico de melodramas de Barbara Cartland, a Rainha dos livros românticos. Mas na boa, nesse tipo de filme, isso não incomoda. O que importa mesmo, é que o time de elenco de apoio, as amigas de Maya, são todas incríveis, e as atrizes, maravilhosas, principalmente Leah Remini. Lopez ainda segura a onda de protagonizar comédias românticas, por conta de seu carisma, e mesmo quando ela tenta fazer comédia física, funciona. Para quem não gosta do gênero, melhor ficar bem longe, por que aqui tudo é bastante óbvio.

sábado, 23 de fevereiro de 2019

Viagem à Itália

“Viaggio in Italia ”, de Roberto Rosselini (1954) Uma das grandes obras-primas do cineasta italiano Roberto Rosselini, está na lista dos 100 filmes essenciais da história do cinema, editado pela Toronto Film Festival, do livro “1001 filmes para se ver antes de morrer” e também tem uma grande resenha de Martin Scorsese no seu documentário “Viagem ao Cinema italiano”. Um grande fracasso de público e de crítica na época de seu lançamento, 1954, o filme foi posteriormente resgatado pelos críticos da “Cahiers du Cinema” e alçado à condição de obra-prima, e também ganhou o título de “Primeiro filme moderno da história do Cinema”. Parte do fracasso do filme veio por conta do turbulento relacionamento de Rosselini com a sua estrela, Ingrid Bergman, que chocou o mundo ao abandonar marido e filhos para ficar com Rosselini. Os fãs e os jornalistas não os perdoaram. “Viagem à Itália” narra a história de um casal inglês milionário, Katherine ( Bergman) e Alex Joyce ( George Sanders). Em crise no casamento, eles seguem de carro até Nápoles, e depois para Pompéia, para resolver questões da herança de uma casa de um tio de Alex que morreu. Katherine passa os seus dias em museus, passeios culturais e pelo caminho, fica surpresa com a quantidade de mulheres grávidas e de mães com filhos perambulando pelas ruas, o que a deixa frustrada por nunca ter sido mãe. Alex, por sua vez flerta com mulheres e prostitutas, aos olhos vistos de Katherine. Mas uma viista até o sítio arqueológico de Pompéia e depois a visão e uma Procissão irão mudar os rumos do casal. Diferente de outros filmes do neo-realismo de Rosselini, uma vertente cinematográfico que o projetou ao mundo, com obras-primas como “Roma, cidade aberta”, Alemanha ano zero” e “Paisá”, aqui Rosselini investe no existencialismo e na crise de um casal burguês, tema caro a muitos cineastas que surgiriam depois, principalmente Antonioni. Impossível não se lembrar de “A aventura” e a trilogia de Rosselini. Os protagonistas desses filmes perambulam pelas ruas sem rumo, atingidos por algum trauma ou crise conjugal que os deixa atônitos. Até mesmo um filme recente como o de Angelina Jolie, ‘À beira mar”, com ela própria e Brad Pitt formando um casal que viaja a uma cidade europeia para tentar dirimir a crise no casamento, tem a influência de “Viagem à Itália”. O filme tem uma narrativa documental, mostrando com uma câmera distanciada a rotina dos personagens dentro da cultura italiana. Essa frieza narrativa combina com a metáfora do relacionamento, que tem um desfecho arrasador em Pompéia, quando testemunham os corpos de um casal sendo encontrado enterrado, abraçados diante da morte. George Sanders e Ingrid Bergan estão brilhantes. É muito curiosa a trajetória desses dois ícones de Hollywood no estilo de filmar de Rosselini. Como todos sabem, Ingrid Bergman escreveu para Rosselini dizendo que queria trabalhar com ele e conhecer essa forma mais humana de filmagem, sem grandes equipes e estrutura de camarim. Diferente dela, George Sanders odiou tudo: passou seus dias de filmagem irritado, com a proposta do filme de quase não ter um roteiro, e ser improvisado, e não ter uma infra-estrutura de Hollywood aos seus pés.

Free Solo

"Free Solo", de Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi (2018) Indicado ao Oscar 2019 de Melhor documentário, esse super premiado filme, ganhou também o Bafta de melhor documentário. Os seus últimos 25 minutos serão definitivamente, os seus momentos mais angustiantes já vividos em um filme. A gente já sabe como o filme acaba, mas mesmo assim, é impossível não se deixar impressionar pela grandiloquência da Montanha “El Captain”, localizada no Parque Yosemite, na Califórnia. ‘El Captain” tem 910 metros de altura, e é muito procurado pelos alpinistas para escalação. O protagonista do filme, o alpinista americano Alex Honnold, de 33 anos, se tornou o primeiro homem a escalar a montanha na modalidade “free solo”, ou seja, usando apenas pés e mãos, sem uso de equipamentos para escalação. O filme apresenta Alex e sua motivação em esportes radicais. Quando ele decidiu escalar via Free solo, todo mundo foi contra: sua namorada, Sinni, também alpinista. Seus amigos e também profissionais. Outros já tentaram e morreram. O filme apresenta um clip assustador, de alpinistas que morreram ao redor do mundo escalando montanhas. O filme é de fato, um ode a esses verdadeiros super heróis, que desafiam a morte para alcançar um objetivo. “Eu tenho as mesmas esperanças de sobrevivência de todo mundo. Só aceito mais fácil que vou morrer em algum momento.”. Come essa frase, Arnold silencia a todos que querem entender o porquê de sua ato praticamente suicida. O filme apresenta a família de Alex, e como a morte de seu pai o afetou bastante. Há quase 10 anos, Alex mora dentro de uma van, em um estilo de vida totalmente solitário. Para poder conviver com o esporte, Alex alega que quanto menos pessoas envolvidas, melhor, pois uma relação de amor ou amizade acaba influenciando nas decisões que ele toma. Mesmo assim, ele conhecer Sinni, uma alpinista, e o casal se mostra o tempo todo extremamente apaixonado. Mas Alex tem o esporte como foco principal. O filme lembra o oscarizado “O equilibrista”, sobre  Philippe Petit, o homem que ilegalmente, atravessou as Torres gêmeas em 1974. A diferença é que aqui, a equipe de filmagem usa equipamento de última geração, filmando ao vivo. Ou seja, tudo pode acontecer, até mesmo Alex cair e morrer. A equipe precisa estar preparada emocionalmente para um resultado fatal. É emocionante o relato de um dos câmeras, dizendo que a presença da equipe e de câmeras influencia na escalada de Alex, e que se ele se distrair com qualquer barulho ou movimento, pode cair. A equipe fica tão u mais tensa que Alex. Um outro câmera, filmando a escalada em teleobjetiva, diz que nunca mais filmará nada parecido, que não tem estrutura psicológica para isso. De fato, as tomadas do filme são inéditas em termos cinematográficos. No filme “Missão impossível”, tudo era digital. Aqui é a vida rel. É tenso. A escalada aconteceu no dia 3 de junho de 2017 e levou 3:50 para cumprir a meta. Alex é uma pessoa extremamente carismática, e a gente fica torcendo de verdade para que tudo dê certo, ou até mesmo, que ele desista de seu feito. A trilha sonora é um elogio à parte: é das mais lindas e emocionantes que já ouvi, pena que não foi indicada.

O Rio era um homem

"Der Fluss war einst ein Mensch ", de Jan Zabeil (2011) Drama alemão, vencedor de prêmios importantes, como Melhor filme em San Sebastian, foi escrito pelo diretor em conjunto com o protagonista, Alexander Fehling. Segundo consta, o filme não tinha um roteiro, e as filmagens seguiam de acordo com a percepção de ambos. O filme tem um tom de fábula existencialista e metafórica em relação ao domínio do homem branco europeu sobre o continente africano. Alexander Fehling interpreta um ator alemão que faz uma expedição solitária em Botswana, acompanhado de um guia local já idoso. O guia o leva sozinho pelo rio, em uma região deserta e inóspita, longe da civilização. Durante a noite o guia morre, e o jovem ator se encontra perdido em um local sem acesso a nada, totalmente distante de tudo. Para piorar, ao chegar a um pequeno vilarejo primitivo, ele descobre que um dos jovens é filho do guia morto, e que esse acredita que o pai foi morto pelo ator. Com ritmo extremamente lento, o filme é quase um documentário etnocentrico sobre o País africano e seus costumes primitivos. Parece um filme produzido pela National geographic. Surpreende o filme ter ganho tantos prêmios. Talvez o que valha a pena, é assistir a performance de Alexander Fehling, que atua 70% do filme sozinho, lutando contra a natureza e contra a solidão e o desespero de estar longe de sua civilização.

Me chame um fantasma

"Call me a ghost", de Noel Alejandro (2017) Drama erótico LGBTQ+ que traz um novo foco para os filmes gays: espiritismo. Valentin é um jovem que está em luto e depressivo. Ele mora sozinho em uma casa e vagueia pela casa dia e noite, sem rumo, como um sonâmbulo. Uma noite, ao percorrer um salão abandonado, ele encontra um espírito extremamente sedutor, Pierre. Eles transam. Pierre vem recorrente para a rotina de Valentin e eles conversam sobre solidão. Pierre então, exibe uma linda dança onde depois, desaparece. Belamente filmado e fotografado, com um desfecho extremamente poético e sensual, o filme de Noel Alejandro é perfeito para quem busca um filme Lgbtq+ que traga muito tesão para quem assiste. Belos atores, lindas imagens, filmadas com extremo bom gosto. A cena de sexo é explícita. Um filme de sensações e que traz um final em aberto a leituras individuais de cada espectador.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Kitbull

"Kitbull", de Rosanna Sullivan (2019) Curta de animação da Pixar, "Kitbull" foi todo desenhado à mão. A Diretora e roteirista Rosanna Sullivan evitou o uso de computadores, e trouxe para as locações, o bairro onde morava em San Francisco. A animação com menos de 9 minutos, apresenta a improvável amizade entre um gatinho vira-lata e um cão pitbull, treinado para ser violento pelo seu dono. Como todo desenho da Pixar, o filme é muito fofo, com personagens carismáticos. Mas aqui, a Pixar cresce um pouco em termos de realismo, mostrando o abuso contra animais. O cão apanha, sangra e o violento dono não tem qualquer tipo de remorso. Totalmente sem diálogos, é uma festa para o coração. O final, inclusivo, apresenta um casal formado por uma mulher negra e um homem branco. https://www.youtube.com/watch?v=AZS5cgybKcI.

Alita, anjo de batalha

“Alita, battle angel, de Robert Rodriguez (2019) Adaptação cinematográfica da série de mangá de Yukito Kishiro e produzido pelo mago James Cameron. O filme teve um orçamento estimado de 170 milhões de dólares e parece que o faturamento não deve cobrir os custos. Uma pena, torço para que surja uma franquia porque eu gostei bastante desse filme. Protagonizado por Rosa Salazar, atriz do drama “ A professora do jardim de infância” e da série “ Divergente”, e com um elenco mega star, como Christopher Waltz, Jenifer Connely, Mahershala Ali e Edward Norton. O jovem Keean Johnson, no papel do mocinho Hugo é uma ótima surpresa e ele lembra bastante uma versão jovem de Ryan Gosling. O filme é uma ficção científica, ambientada na Terra por Guerra chamada de “ A queda” que dividiu o mundo em uma cidade aérea chamada Zalem, algo tipo O paraíso, e os que moram na superfície, considerados a escória. Esse mote já lembra bastante “ O vingador do futuro”. Mas o filme é uma grande história de amor. O cientista Ido ( Waltz) encontra uma carcaça de uma cyborg no lixo e a recupera, dando a ela o nome de Alita. Aos poucos, ambos descobrem que ela foi uma guerreira e que possui uma missão. Mas Alita se apaixona pelo marginal Hugo, e todos estão em perigo. Para tentar salvar a vida de Hugo, Alita precisa participar do Motorball, uma competição mortal. Repleto de referências a todos os filmes clássicos de ficção científica “ Blade Runner”, “ Rollerball”, “ Robocop” e outros, “Alita” tem personagens muito carismáticos e foi isso que me conquistou. O roteiro em si já é bem batido, mas o ritmo, os efeitos e a linda história de amor seguram a onda dessa aventura romântica. Robert Rodriguez deixa de lado sua estética trash e faz um belo filme que está sendo injustamente criticado. Um pipoca da melhor qualidade.

Tea for two

"Tea for two", de Julia Katharine (2018) Pegando emprestado o título de uma deliciosa comédia com Doris Day, Julia Katharine é a primeira Cineasta e roteirista Trans a ter um filme exibido comercialmente nos cinema brasileiros. Esse feito maravilhoso e importante foi graças ao Edital direcionado à pessoas Trans e ao suporte da Vitrine filmes dentro do projeto Sessão Vitrine Petrobrás, que fez desse ótimo curta uma dobradinha com o longa documentário de Gustavo Vinagre, "Lembro mais dos corvos", protagonizado pela Atriz Julia Katharine. "Tea for two" é um filme sobre mulheres: Silvia, Isabela e Isabel. Silvia ( Gilda Nomacce) é uma Cineasta em crise profissional e pessoal: se separou de Isabel (Amanda Lyra) , após a traição dessa. Isabel é atriz e ganhou um prêmio que ambas fizeram juntas, mas ela também está em crise, pois sua carreira como Atriz não decolou. Isabel tenta se reaproximar de Silvia, mas encontra a barreia em Isabela (Julia Katharine), vizinha de Silvia. Silvia acudiu Isabela quando esta foi agredida pelo irmão drogado dela, que levou as chaves de casa. Trazendo Isabela para sua casa, Silvia sente uma linda conexão que ela já havia perdido há tempos. Julia Katharine, que escreveu e dirigiu "Tea for two", encontra no drama e no fino humor a chave para seduzir e encantar a platéia. Isabela e Silvia são apaixonantes. Sororidade é um termo que está na pauta e aqui encontra voz. Quando o porteiro bêbado reprova a presença de Isabela no prédio, Silvia imediatamente a defende. Com linda fotografia repleta de cores fortes e estilizadas e direção de arte, em uma equipe majoritariamente formada por mulheres, "Tea for two" traz um final em aberto altamente romântico e uplifting. São Paulo é grande, mas almas solitárias podem muito bem se encontrar e se apaixonar. Excelente trabalho das 3 atrizes, vibrantes e fortes.

Lembro mais dos corvos

"Lembro mais dos corvos", de Gustavo Vinagre (2018) Exibido em diversos Festivais e premiado como Melhor filme da Mostra Internacional do IndieLisboa, "Lembro mais dos corvos' é um documentário que remete a um clássico de Eduardo Coutinho, "Jogo de cena": o que estamos vendo e ouvindo, como espectadores, é real ou uma encenação de uma atriz dentro de uma personagem? Ou é a a atriz, sem rodeios, se abrindo de corpo e alma para o espectador? Julia Katharine é uma Atriz Trans. A própria Julia, em sessão debate, diz que não gosta de ser rotulada como "Atriz Trans". Como exemplo, ela questiona o público se ao irmos à uma padaria, perguntamos: vocês viram o padeiro Trans? ela é uma Mulher, e quer ser vista como tal, mas entende que, como luta política, afirmar a palavra e o sentido da palavra "Trans" se faz necessária. Gustavo Vinagre, diretor de filmes independentes premiadíssimos, como "Nova Dubai" e "A rosa azul de Novalis", é um dos maiores expoentes do Cinema Queer brasileiro. Ele conduz com sensibilidade e bom gosto o documentário, e entende que precisa deixar Julia Katharine fazer seu vôo solo: o filme é ela. Todo filmado em um pequeno Kitchsnette bem decorado, onde além de Katharine, a única presença que se faz presente é de um passarinho, "Nuvem", que a acompanha em noites solitárias de insônia e solidão na grande Metrópole que é são Paulo. Julia faz a tímida, a divertida, a alegre, a gueixa, a dramática. Ela são várias: a batalhadora, a que viajou até o Japão em busca de emprego e do seu pai, a que ganhou prêmio de melhor atriz coadjuvante no seu primeiro trabalho, a que tentou se prostituir e não deu certo, a que assiste dezenas de vezes com sua mãe o filme "Laços de ternura"e choram sempre, a que foi abusada pelo tio avô quando ela tinha 8 e o homem 55, a que tomou muitos hormônios que modificaram seu corpo e finalmente, a Julia cinéfila, que trabalhou em locadora de vídeo, e Cineasta. Assistir a um documentário de 82 minutos claustrofóbico, focada em apenas uma pessoa e ninguém mas, não é para qualquer um. Como a gente já aprendeu nos filmes do Eduardo Coutinho, o entrevistado precisa ter histórias sedutoras que interessem ao público. Julia tem de sobra. Um prazer enorme, um misto de alegria, risadas, emoção assistir a esse belo filme, que graças à Sessão Vitrine Petrobrás, vem acompanhada do curta que Julia escreveu e dirigiu, chamado "Tea for two". Julia dá um depoimento dizendo que ai focar em dirigir comédias românticas, pois a sua vida já foi dramática demais e precisa dosar com alegria.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

O fim

"The end", de Noel Alejandro (2018) O Cineasta espanhol Noel Alejandro é um dos grandes nomes do novo cinema LGBTQ+ que surgiu na Europa. Muitos de seus filmes foram produzidos por Erika Lust, a maior realizadora de filmes com conteúdo erótico da Europa e com temas de inclusão e representatividade, dona da produtora Xconfessions. "O fim" foi todo rodado em Berlin. Narra a história de Javier, um artista plástico que está em luto desde a morte de seu namorado. Seus amigos estão preocupados com seu luto, mas Javier se mantém isolado, até que aceita sair para conversar com um de seus amigos. Mas Javier precisa literalmente enfrentar os seus demônios interiores, que vem na forma de um africano que o seduz. Filmado com uma bela fotografia, o diretor e roteirista Noel Alejandro filma com muito bom gosto a cena de sexo entre Javier e o demônio, com carga erótica repleta de sexo explícito, mas sem resvalar apara a pura pornografia. Os dois atores exalam tesão e alta carga de sensualidade.

O retorno de Ben

\ "Ben is back", de Peter Hedges (2018) O roteirista Peter Hedges tem em seu currículo filmes escritos por ele que retratam a difícil relação mães e filhos: "Um grande garoto"e "Gilbert Grape" são alguns exemplos. Agora com "O retorno de Ben", Peter Hedges não só escreve, como dirige essa dramática história de uma mãe tentado salvar seu filho das drogas. Peter convidou Julia Roberts para interpretar essa mãe coragem, que coloca em risco a sua vida e a de seus familiares para salvar a vida de Ben (Lucas Hedges). Julia Roberts aceitou de cara o papel ao ler o roteiro, mas o único pedido dela foi que Peter escalasse o seu filho Lucas Hedges para o papel de Ben. ele relutou, pois não queria dirigir o próprio filho, mas acabou cedendo e visto o filme, a gente fica muito comovido com a performance desses 2 grandes atores. Holly Burns ( Roberts) mora em uma cidade pequena com seu marido, sua filha adolescente e dois filhos pequenos frutos dessa nova união. Católica fervorosa, Holly é dedicada à sua família. Às vésperas do Natal, ela descobre que seu filho adolescente Ben, que estava internado em uma clínica psiquiátrica por vício em drogas, recebeu um indulto de Natal para passar o dia com a família. Holly decide aceitar que Ben fique com a família, apesar dos pedidos contra do seu novo marido e da irmã de Ben. contanto que ela passe o dia todo ao seu lado. Ben reluta, mas aceita. Aos poucos, Holly vai entendendo quem é Ben e o que ele passou durante a sua vida. Curioso que esse filme tenha sido lançado no mesmo ano que "Querido menino". drama também sobre relação pais e filhos envolvidos com drogas, com Timotheé Chamalet e Steve Carrel. A história é praticamente a mesma, a diferença é que aqui em "O retorno de Ben", o filme vai se transformando em um trhiller. O filme é bem dirigido, e Julia Roberts e Lucas Hedges estão emocionantes, até chorei em uma cena muito comovente. Lucas prova ser um dos grandes nomes de sua geração. Julia Roberts é uma grande estrela que comprovou com o tempo que era muito mais do que um rostinho bonito. O roteiro peca em excessos melodramáticos. O personagem do marido de Holly é bem ingrato, antipático toda a vida e o espectador facilmente fica irritado com ele. Mas a seriedade do projeto, e a performance dos atores é tão bonita que o filme merece muito ser visto.

Girl

"Girl", de Lukas Dhont (2018) Com apenas 27 anos, o Cineasta e roteirista Lukas Dhont realizou um drama de extrema delicadeza e sensibilidade. Narrando a história da adolescente Lara, uma jovem que quer transicionar para um corpo feminino, tendo nascido como menino, o filme discute todos aqueles temas já desenvolvidos em "Uma mulher fantástica", de Sebastian Lelio: preconceito, homofobia, bullying, curiosidade sobre o corpo do outro, insegurança, suicídio. "Girl" ganhou 4 prêmios no Festival de Cannes 2018, incluindo Melhor filme, Ator e Fipresci na Mostra Camera de Ouro, além do prêmio Queer Palm, dedicados a filmes com temática LGBTQ+. Lara ( em performance irretocável de Victor Polster, que também é bailarino), deseja se tornar bailarina, mas encontra dificuldade de acomodar o seu corpo para a dança feminina. Ao mesmo tempo, ela procura buscar a melhor forma de interação com o seu irmão de 6 anos, e seu pai, o taxista Mathias ( Arieh Worthalter, excelente). Lara também é apaixonada por um vizinho, e sofre bullying das colegas da escola, que desejam ver o corpo masculino de Lara. "Girl" é um drama minimalista, visto em pequenas ações do cotidiano de Lara, que diuante seus conflitos na escola e em casa, frequenta uma cirurgiã e um psicólogo que irão prepará-la para a transição para o corpo feminino. O cineasta Lukas Dhont. realiza um filme com extremo bom gosto tanto na condução da narrativa, quanto na questão técnica: fotografia, trilha sonora. O ritmo é lento, mas o filme busca justamente processar aos poucos o que se passa na mente de Lara. Mundo afora, o filme sofreu críticas das comunidades LGBTQ+, pelo fato de escalarem um ator cis para o papel da jovem trans. Esse é um tema muito delicado para lidar, mas convém afirmar que, independente da questão do lugar da fala, o ator Victor Polster está maravilhosamente ajustado à personagem. Fiquei comovido com sua performance. O filme foi indicado pela Bélgica para concorrer a uma vaga no Oscar 2019, mas acabou sendo despreterido entre os finalistas.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Cores e gostos

"Les goûts et les couleurs", de Myriam Aziza (2018) Co-escrito com a roteirista Denyse Rodriguez-Tomé, a roteirista e cineasta francesa Myriam Aziza realiza uma comédia repleta de preconceitos para todos os lados: fala de homofobia, racismo, anti-semitismo, xenofobia, tudo misturado no mesmo saco. Simone namora Claire. De família judia, Simone nunca revelou à sua família que ela é gay. Ela decide anunciar o seu outting no jantar, mas fica com medo de represálias de seus pais e desiste. Simone tem 2 irmãos: um gay assumido, e outro que resolve criar um perfil em um site de relacionamentos para que ela conheça outro judeu. Ao almoçar em um restaurante senegalês, Simone acaba se sentindo atraída pelo garçon, o africano Willi, um refugiado. Myriam Aziza tem seu olhar para as protagonistas femininas, mas isso não o diferencia de correlatos dirigidos por homens; os clichês são os mesmos. Para piorar, ela exagera na dosagem dos temas discutidos em um mesmo filme. É informação demais, preconceitos demais a serem discutidos em tão poucos personagens. As roteiristas resolveram falar da França atual, imersa em todos os tipos de conflitos étnicos, sexuais, de gênero e de religião. O filme funciona pouco, algumas cenas divertem, mas no geral, é um filme sem carisma e de personagens antipáticos. De interessante, a virada de Simone, e um final totalmente em aberto.

final de semana em Campagna

"Week-end à la campagne", de Matthieu Salmon (2007) Co-escrito e dirigido por Matthieu Salmon, "Fim de semana em Campagna" é um drama minimalista LGBTQ+, e apresenta 2 melhores amigos, os adolescentes Pierre e Marc. Marc convida Pierre para passar um final de semana em sua casa de campo em Campagna. Ao chegar no local, Pierre imediatamente sente medo dos cães de segurança. Marc diz que eles são inofensivos. Quando Pierre vai trocar de roupa para nadar na piscina com Marc, esse investe em Pierre, seduzindo-o. Pierre o repele, e Marc fica sentido. Quando Pierre sai da casa, os cães passam a persegui-lo. "Final de semana em Campagna" é um drama que usa os cães como metáfora da homofobia e do medo de sair do armário. No desfecho, existe uma inversão interessante: como Pierre tem medo dos cães, Marc o chama de "Viado", mesmo que ele mesmo tenha investido sexualmente no amigo. É um filme curioso, de poucos diálogos e os silêncios dizem bastante da relação dos amigos.

Grass

"Grass", de Hong Sang-soo (2018) Exibido em Competição no Festival de Berlim 2018, "Grass" é dirigido e escrito por Hong San Soo, o mais prolífico cineasta sul coreano em atividade, produzindo uma média de 3 longas por ano, todos naquele esquema que qualquer espectador do cineasta já conhece: poucos personagens, mais da metade do filme acontecendo dentro de um bar com os personagens bebendo; planos-sequência longos, sem cortes, e com uso de zooms constantes para aproximar algum detalhe ou o rosto do ator. Seus filmes são baratos, rodados em poucos dias. O mais curioso, é que seus filmes são disputados por prestigiados Festivais mundo afora, e mesmo sendo repetitivos em sua forma e conteúdo, parecem não cansar os apreciadores do bom cinema. Confesso que gosto da filmografia de Sang Soo. Mas esse "Grass" definitivamente, é dos que menos gosto, senão o pior. Quase todo o filme acontece dentro de um Café bar, às vezes a câmera sai e faz um registro do lado de fora, onde há uma rua estreita. Rodado em preto e branco, o filme acompanha uma mulher, interpretada pela mulher do cineasta, Kim Min-hee (sua atriz fetiche de seus últimos filmes) , que passa tardes sentada no bar e escrevendo em seu computador. O que ela escreve? Aquilo que ela testemunha no bar: discussões entre casais, com temas que variam entre morte, suicídio, traições. Min Hee imagina sempre o que acontece depois dessas discussões, quando ela não os presencia mais. De novo lidando com personagens que vivem o ambiente de cinema( Atores, roteiristas), Hong San Soo mostra a rotina dos relacionamentos vistos pelo olhar de uma estranha, e que tem o poder de transformar suas histórias. Pena que o filme tenha ficado tão sem atrativos. Tudo é bem chato aqui, e olha que o filme tem pouco mais de 1 hora de duração.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Chá com Mussolini

"Tea with Mussolini", de Franco Zefirelli (1999) Existem alguns filmes que os críticos torcem o nariz, mas o grande público adora. "Em algum lugar do passado" e "Chá com Mussolini" são dois exemplos de filmes que ao passar dos anos, continuam sendo favoritos da platéia. Talvez pelo elenco, talvez pelo roteiro que investe no melodrama. Mas o fato é que "Chá com Mussolini"reúne um time de grandes estrelas que raramente se vê num filme, e só por elas, já valeria a pena assistir ao filme. Judi Dench, Maggie Smith, Joan Plowright, Lily Tomlin e Cher, todas elas muito a vontade no filme, em personagens que exalam aquele sarcasmo inglês e no caso de Cher e Lily Tomlin, aquele humor americano deliciosamente arrogante. Fora isso, existe a direção de Franco Zefirelli, que é um ás em dirigir atrizes e também um apaixonado pelas artes. Tem Florença, maravilhosamente registrada pelas lentes de David Watkin, vencedor do Oscar por "Entre dois amores", O roteiro de "Chá com Mussolini" foi escrito pelo próprio Zefirelli e segundo ele, uma autobiografia de quando ele era criança e adolescente na Itália dos anos 30 e 40. O filme começa nos anos 30 e mostra a Itália como amiga da Inglaterra. Mas o fascismo está crescendo na Europa. Um grupo de senhoras inglesas, conhecidas como Scorpiani e que decidiram morar na Itália, se encontram todas as tardes para tomar chá e botar o papo em dia. entre eles, estão Mary (Plowright), secretária de um empresário italiano, seduzido pelo fascismo e que tem um filho que ele chama de bastardo, Luca ( alter ego de Zefirelli). Luca acaba sendo criado pelas senhoras: além de Mary, estão Lady Hesser (Maggie Smith), uma rancorosa viúva de um diplomata britânico. Arabella (Judi Dench), uma artista plástica que faz com que Luca se apaixone pelas Artes. Georgie (Lily Tomlin), uma arqueóloga americana lésbica e sua amiga cantora milionária e judia americana Elsa (Cher), por quem Luca, mais tarde, se apaixona. Os anos se passam, e vem a Guerra. Lady Hesser acredita que Mussolini está fazendo de tudo para agradar aos britânicos e não consegue enxergar quem ele realmente é. As amigas tentam sobreviver à guerra e ao mesmo tempo, tentam salvar as obras de arte. Confinadas ao exílio, consideradas inimigas do povo italiano, as scorpiani precisam lutar pela vida, além de Elsa, judia, que precisa fugir do País. O filme é todo perfeito tecnicamente: figurino, maquiagem, fotografia, trilha sonora. É o tipo de drama que junta toda aa família e fiam todos torcendo pelas senhoras. Zefirelli sabe comandar um espetáculo, sempre tentando seduzir o espectador com a beleza das locações ou do figurino de suas estrelas. Não é um filme perfeito, é longo, mas certamente, quem gosta de uma bela novela, irá se apaixonar pelas Scorpiani.

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Polar

"Polar", de Jonas Åkerlund (2019) O Cineasta dinamarquês Jonas Åkerlundé famoso no mundo dos video-clips, tendo dirigido para grandes estrelas como Madonna, Roxette, Beyoncé, Duran Duran, Lady Gaga, David Guetta, Maroon 5, Coldplay, para citar apenas alguns. Como Cineasta, realizou alguns filmes, mas certamente "Polar" é o melhor deles. Adaptado dos quadrinhos "Polar', uma série realizada para a americana Dark Horse comics. e criada pelo espanhol Victor Santos, é uma espécie de Kill Bill, porém, com protagonista masculino. Mads Mikkelsen, genial, é Duncan Vizla, considerado o maior assassino de aluguel do mundo. ele está prestes a se aposentar. Seu chefe resolve eliminá-lo, pois a aposentadoria de Duncan vai custar alguns milhões de dólares. Vários assassinos são contratados para eliminar Duncan. Para piorar a situação, uma jovem misteriosa, Camille (Vanessa Hudgens, longe dos tempos de "High Scholl Musical") surge no caminho de Duncan, e por algum motivo, ele sente que precisa protegê-la. Os personagens, principalmente os vilões, são totalmente caricatos, bem no estilo Tarantino. Mas aí reside a delícia de se assistir a filme ótimo filme de ação, bem no gosto de John Wick e outros anti-heróis recentes. No entanto, atenção: o filme é hiper violento, com cenas repletas de tiros explodindo miolos, pernas, machadadas, etc. Quadrinho puro. Fico torcendo para que haja uma continuação, pois merece. Excelente fotografia, edição, locações. O elenco também está todo incrível, escolhidos a dedo.

Whiplash

"Whiplash", de Damien Chazelle (2013) Premiado curta que deu origem ao famoso longa de 2014 com Miles Teller e J K Simmons, "Whiplash"ganhou o prêmio de melhor curta em Sundance 2013, e repete no seu elenco o extraordinário trabalho de J k Simmons, no papel do perverso professor de música. O curta consiste apenas na famosa cena onde o personagem Carl (Nate Lang, perfeito, não sei porque não foi escalado para o longa) tem seu 1o dia de aula na prestigiada Shaffer escola de música. Durante o ensaio da música "Whiplash", o professor Andrew Neiman pratica um bullying excessivo com vários alunos, até chegar em Carl. A cena é a mesma do longa com Miles Teller, que também fez um fabuloso trabalho. Damien Chazelle já mostrava aqui, em um de seus primeiros trabalhos, a sua excelência técnica na direção, edição e diálogos, além da direção de atores exemplar. Vale assistir e comparar com o longa. O filme se passa todo na sala de aula. Um exemplo de baixo orçamento realizado com perfeição. https://www.youtube.com/watch?v=lH8MOkk1OKs&t=950s

Os garotos selvagens

"Les garçons sauvages", de Bertrand Mandico (2018) Esses Críticos europeus adoram uma polêmica: considerar "Os garotos selvagens", estréia em longa do Curta-metragista Bertrand Mandico como o melhor filme francês do ano, pela renomada revista Cahiers du Cinema, é realmente querer botar fogo na lenha. Fora isso, o filme ainda levou o grande prêmio da semana da crítica no Festival de Veneza 2018. "Os garotos selvagens" é filme para cinéfilos, e mesmo assim, cinéfilos que estejam de mente aberta para assistir no mesmo liquidificador, 'Laranja mecânica", de Stanley Kubrick, "O porteiro da noite", de Liliana Cavani, "Querelle", de Fassbinder e "Pink Narcissus", de James Bidgood. Não é qualquer um que consegue ver cenas onde os protagonistas bebem leite de frutos exóticos em forma de pênis, um outro transa com uma planta nativa em forma de corpo de mulher. O que realmente interessa nessa fantasia experimental e erótica de Bertrand Mandico, e a discussão metafórica acerca do gênero. Meninos que viram meninas, como forma de punição por seus atos selvagens. No início do Século XX, 5 rapazes, filhos de famílias ricas, estupram e matam a professora de literatura. Como punição, seus pais chama O capitão e pede que puna os rapazes, levando-os para uma estranha ilha. Nessa Ilha, eles irão descobrir que a punição vem através de estranhos elementos eu farão os rapazes se transformar em meninas. Tem uma cena bem trash onde os pênis caem dos corpos e se transformam em vaginas. Escondido através de um potencial exotismo e elemento Kitsch, típico do cinema europeu, muitas situações beiram o mau gosto, mas como a gente nunca entende a cabeça dos críticos, a maioria achou maravilhoso. não sei se gostei, admito que é um filme curioso e bastante criativo, mas ao mesmo tempo, os seus excessos estilísticos e de linguagem, misturando preto e branco e cores, croma, projeção e outras narrativas bem anos 80, de onde o filme tira referências, inclusive na trilha sonora repleta de sintetizadores. De positivo mesmo, é o visceral trabalho das 5 atrizes, que se entregam de corpo e alma para um projeto bem peculiar, que com certeza, muitas atrizes por aqui teriam recusado trabalhar

Uma aventura Lego 2

"The Lego Movie 2: The Second Part", de Mike Mitchell (2019) Cinco anos depois do grande sucesso do filme anterior, que rendeu quase 500 milhões de dólares no mundo todo, os criadores da franquia Phil Lord e Christopher Miller continuam por trás dessa continuação, mas passaram a direção para Mike Mitchell, que dirigiu o ótimo "Trolls", Agora, Emmet ( pena que vi dublado, na voz original é Chris Pratt) , mais feliz do que nunca, se diverte com novos e antigos amigos. Porém, uma invasão alienígena dá fim à essa felicidade: sequestram os amigos de Emmet, e destroem tudo o que evoca felicidade: cores, superfícies brilhantes. O mundo vira um universo apocalíptico, bem ao gosto de "Mad Max" e o Planeta da Morte de "Star Wars". Para trazer o mundo de volta, Emmet se une à Lucy, Rex, Batman e outros. Como o seu antecessor, esse filme também é repleto de piadas, sarcasmo e milhões de referências à cultura Pop. No original, com legendas, fica mais fácil entender essas referências, mas dublado, muita coisa se perde na tradução, por conta de diferenças culturais. Esse filme não é tão divertido como o primeiro Lego, que tinha a piada infame dos golfinhos surgindo constantemente, motivo de grande gargalhada, mas aqui tem uns personagens bem fofos que ajudam a segurar a barra. O problema é a longa duração, quase 2 horas de duração, e o desfecho que lembra muito "Toy Story 3" e "Divertida mente". Mas enfim, crescer faz parte da natureza e do ciclo da vida. Bom que ainda dá para pedir para os pais comprarem mais bonecos da Lego, ou essa não era a grande intenção do filme? A cena onde todos cantam a "Catchy song", uma música grudenta, é antológica.

Finalmente 18

"21 & Over", de Jon Lucas e Scott Moore (2013) O mais engraçado dessa comédia adolescente não é nem o filme em si, mas o título que recebeu no Brasil, que subverteu totalmente o tema da história original. Nos Estados Unidos, a idade legal para poder beber é a partir de 21 anos, e aqui no Brasil, 18. O protagonista Jeff Chang (Justin Chong) acaba de completar 21 anos, e por isso, seus 2 melhores amigos, Miller (Miles Teller) e Casey (Skylar Astin) resolvem levá-lo para uma noite de muita farra. O problema: o rigoroso pai de Jeff vai levar o filho no dia seguinte para uma entrevista de emprego, e quer que o filho esteja bem. Mas como os amigos querem farra, o brigam o pobre rapaz a acompanhá-los. E claro, tudo vai dar errado. A dupla Jon Lucas e Scott Moore foram os roteiristas da franquia milionária ( "Se beber não case", e aqui, eles apenas repetem a fórmula do filme, para uma versão adolescente. A bebida e seus excessos acabam sendo o mote que une esses filmes. sem esquecer de tantos outros filmes semelhantes: "Projeto X", "American Pie", "Porky's", que sempre giram em torno dos mesmos clichês: virgindade, bebedeiras, mulheres gostosas, pais repressores, uma vida hedonista em prol de um futuro profissional. "Finalmente 18" é de 2013, e de lá para cá, muita coisa mudou em termos de representação feminina. Por isso, filmes como esse provavelmente com o tempo, irão ser cada vez mais raros. foi uma fórmula que funcionou por décadas. Mas a sociedade, mesmo em comédias, não está mais aceitando esse olhar sobre as mulheres como meros objetos sexuais, sem outra função na trama. Esse tipo de sub-gênero dentro da comédia, que são os "filmes catástrofes", geralmente brincam com todos os estereótipos de raça, sexualidade, gênero. Os roteiristas agora terão que ralar muito a cabeça para poder explorar esse tipo de humor sem ofender ninguém. O que segura o filme, é o talento dos 3 rapazes, que estão ótimos e muito à vontade na comédia maluca. A carreira de Mills Teller mudaria definitivamente no ano seguinte, com o grande sucesso do drama "Whiplash", que mudou sua vida.

St Agatha

"St Agatha", de Darren Lynn Bousman (2018) Existe um sub-gênero dentro do filme de terror que os críticos chamam de "Nunexploitation", ou seja, a exploração da imagem das freiras, geralmente associadas como servas do Mal. Recentemente tivemos o terror 'A freira", e por causa de seu sucesso, surgiram várias cópias, querendo papar um pouco da grana. Em "St Agatha", o diretor Darren Lynn Bousman, responsável pela franquia "Jogos mortais"( menos o original, que é do Mago de Hollywood, James Wan) conta a história de Mary, uma jovem que vive na conservadora cidade americana de Georgia, em 1957. Ela engravidou fora do casamento de seu namorado, e na noite do sexo, seu irmão pequeno morreu na banheira. O Pai de Mary a pune, e a leva para se internar em um misterioso convento, destinado a mães que engravidaram de relações não matrimoniais. Mary logo percebe que o lugar é destinado para algo aterrorizante, governado por uma malvada Madre superiora. O filme cumpre o que promete: entreter, dando um ou outro sustinho. As freiras são as mais óbvias e caricatas possíveis, a Madre superiora parece uma oficial da SS Nazista de tão malvada que ela é. O que me irritou, foi a trilha sonora, que se apropria do score de "O bebê de Rosemary": hoje em dia, qualquer filme de terror que envolve grávidas, os compositores colocam a famigerada canção de ninar no coro da música. Interessante também que o elenco é majoritariamente feminino, dando força às interpretações de atrizes que atuam em papéis unidimensionais, caricatas, mas eficientes dentro do padrão do que o público espera. A direção investe em algumas cenas de gore, como a da jovem que é obrigada a cortar sua língua. Darren Lynn Bousman sabe criar cenas de aflição. Mas tivesse 20 minutos a menos, o filme teria sido mais interessante e com menos sensação de uma enorme barriga.

sábado, 16 de fevereiro de 2019

Eu sou a minha própria mulher

"Ich bin meine eigene Frau", de Rosa Von Praunheim (1992) O cineasta alemão Rosa Von Praunheim é a voz mais ativa do Cinema gay da Alemanha. Realizador de dezenas de filmes, entre ficção e documentários, a sua filmografia é importante pois ele apresenta personagens e fatos históricos em seus filmes que são verdadeiros registros de suas épocas. Em 'Eu sou minha própria mulher", Praunheim cria um interessante jogo que mistura ficção e documentário. A protagonista é Charlotte von Mahlsdorf, nascida Lothar Berflede. Lothar nasceu em 1928 na Alemanha, e viu o nazismo crescendo assustadoramente. Seu pai se filiou ao Partido e o obrigou a se alistar, mas Lothar se recusou. Lothar se vestia de mulher, escondido de seu pai. Seu pai era homofóbico, machista e racista, agredindo a mãe de Lothar, suas irmãs e a ele. Não aguentando mais a tensão de seu pai, que ameaçava matar a todos, Lothar mata seu pai e acaba indo para uma Instituição penal. Quando saiu, se assumiu como Charlotre Von Mahlsdorf. Charlotte nunca quiz mudar de sexo nem se maquiar, apenas se sentia uma mulher dentro do corpo errado de um homem. Se chamava de travesti, e não de transsexual. Logo depois, veio a divisão da Alemanha pelo Muro de Berlim, e Charlotte ficou presa no lado oriental, comunista. Charlotte começou a montar em sua casa todo tipo de arte relacionada ao homoerotismo, e inclusive seu espaço ficou famoso por promover encontros com a comunidade Lgbtq+. Mas logo ela foi perseguida pelo governo comunista. Com a queda do Muro, o lugar acabou sendo promovido como o Primeiro Museu Lgbtq+ da Alemanha oriental. Praunheim faz com que a verdadeira Charlotte narre todo o filme, intercalando e interagindo com os atores que a interpretam em diversas fases, e com os que interpretam outros personagens. É um recurso muito bem administrado, dando um tom realista a essa incrível história de resistência e de busca de identidade de gênero.

Bulldog na Casa Branca

"Bulldog in the White House", de Todd Verow (2016) Escrito, produzido, dirigido e protagonizado por Todd Verow, um dos mais atuantes Cineastas do universo Queer underground americano. É curioso assistir a esse filme depois de ter visto 'Vice", o filme sobre o vice-presidente Don Chaney, que é uma sátira política sobre o Governo Bush. Em "Bulldog na Casa Branca", Todd Verow se apropria do livro de Choderlos de Laclos, "Ligações perigosas", e apresenta uma rede de intrigas repleto de sede de Poder e de vingança. A diferença? é que Madame de Auteil, interpretado por Glenn Close no filme de Stephen Frears, aqui é interpretado por Verow, no papel do garoto de programa Bulldog. Ambicioso, ele deseja tomar posse das informações secretas do Governo Bush e assim, adquirir Poder. Ele seduz a todos, fazendo sexo e sempre fazendo o papel do ativo (metáfora de mandar todos tomarem no C..????). A idéia do filme é ótima, mas a sua realização, um pavor. Direção péssima, atores amadores no pior nível, direção de arte inexistente, diálogos pavorosos. Assistir ao filme é um suplício. Vale apenas para quem curte assistir cenas de sexo quase explícitas tendo pano de fundo a bandeira americana. Mesmo assim, são cenas destituídas de qualquer tipo de tesão. Mesmo assim, o filme ainda conseguiu ganhar o Prêmio de melhor filme no Festival de Chicago de cinema underground.