domingo, 19 de fevereiro de 2017
Persona
"Persona", de Ingmar Bergman (1966)
Um dos filmes mais enigmáticos da história do cinema, "Persona" ganhou um sub-titulo infeliz aqui no Brasil, provavelmente por motivos mercadológicos:"Quando duas mulheres pecam". Quem assistir ao filme, vai ver que esse titulo não tem nada a ver com o contexto da narrativa.
Bergman escreveu o roteiro de "persona" quando estava internado em um hospital, convalescendo de uma forte pneumonia. Essa crise criativa por não poder estar dirigindo acabou sendo transposta para o personagem de Liv Ulmann, Elisabeth Vogler. Ela, uma atriz com carreira brilhante, que subitamente fica muda durante uma apresentação da tragédia grega "Electra", interpretando a personagem-titulo. Internada em uma clinica psiquiátrica, a médica chefe entende que essa mudez seria uma forma de contestação de Elisabeth perante a sua profissão, cansada de interpretar varias
"Personas" e em busca de conhecer quem ela realmente é. A medica encaminha a sua enfermeira, Alma (Bibi Andersson) para acompanhar Elisabeth por um período de descanso em sua casa de praia. No entanto, a aproximação dessas duas mulheres, uma falante ( a enfermeira) e a outra muda( a atriz) acaba provocando distúrbios de personalidades.
Uma dos elementos mais brilhantes na historia metafórica de Bergman, é a inversão dos papéis. A atriz, muda, se torna a analisanda, e a enfermeira, que revela para a atriz os seus segredos mais sombrios, se torna a paciente. Eu adoraria entender de psicanálise para poder me aprofundar em tantos signos que o filme nos apresenta, mas acredito que cada espectador possa fazer a sua própria interpretação, sem ter que ser um especialista ou estudioso da área medica.
O filme começa com um pequeno curta experimental, repleto de imagens que falam da gênese da criação do cinema, desde o funcionamento de uma câmera, até imagens de filme mudo, passando por imagens eróticas ( um close em um penis ereto!!), corpos de idosos mortos em uma mortuária e para finalizar, um garoto ( o filho de Elisabeth) que ressuscita e toca a imagem de sua mãe projetada na parede. Aí sim, o filme começa. Outra subversão estilística acontece no meio do filme, quando o filme simplesmente "queima", e recomeça a história, dessa vez com as personagens já transformadas. E no final, quando vemos uma imagem de Bergman dirigindo e do seu fotógrafo Sven Nykvst empunhando a câmera, seria o caso de achar que a vida é toda uma farsa, segundo uma teoria de Bergman? Seríamos todos personagens, empunhando máscaras (personas) ao nosso bel prazer?
Um filme que até hoje arrebata pela sua inventividade, modernidade e perfeccionismo técnico. A fotografia escandalosa de Sven Nykvst, e a interpretação feroz e absurda dessas duas atrizes brilhantes ( Liv Ullman começou aqui sua parceria com Bergman, inclusive tendo um caso com ele durante as filmagens. Bibi Andersson era sua mulher até então. O monólogo que Alma faz, relatando a sua aventura sexual para Elisabeth, é impressionante O espectador consegue visualizar a cena só pela sua narração. E a brilhante direção e montagem já no final, com um monólogo de Alma falando sobre o aborto do filho de Elisabeth, filmado duas vezes: uma apenas em Alma, outra apenas em Elisabeth.
Essa foi a segunda vez que Bergman filmou na Ilha de Faro ( a primeira foi em seu filme anterior, "Através dos espelhos". A partir dai, ele veio sempre a filmar, inclusive morando na Ilha.
Obrigatório para estudantes de Cinema e para Atores.
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