terça-feira, 8 de outubro de 2019

O Homem que virou suco

"O Homem que virou suco", de João Batista de Andrade (1981) Clássico brasileiro lançado em 1981, mesmo ano da obra-prima "Eles não usam Black tie", de Leon Hirzman. "O homem que virou suco" ganhou inúmeros prêmios na época, incluindo Melhor Filme no Festival de Moscou. O roteirista e cineasta mineiro João Batista de Andrade já havia até então dirigido documentários sobre o processo migratório de nordestinos para o Estado de Sao Paulo, os chamados "Paraíbas" ou "Baianos". Antes de "O Homem que virou suco", também dirigiu algumas ficções, que misturam na trama a linguagem ficcional e documental, e retratando o crime e violência na periferia paulista, entre eles, "Wilsinho Galiléia". José Dumont é o protagonista. Ele interpreta 2 papéis: o cantor de cordel Deraldo, que vem da Paraíba para tentar a vida em São Paulo; e José Severino funcionário de uma fábrica, que no dia da comemoração do Operário padrão, mata o seu patrão americano à facadas. O problema é que Deraldo é a cara de Severino, e por não portar documentos, é confundido com o assassino. Tendo que largar o seu trabalho de cantor de cordel, Deraldo precisa arrumar emprego. Ele vai procurar trabalho em uma obra, numa casa de família e em outros sob-empregos, mas tudo o que ele vê, é a forma desumana com que empregadores maltratam os trabalhadores. em sua maioria, migrantes do Norte e Nordeste. Ao buscar emprego na obra do metrô, Deraldo é obrigado a assistir à uma animação que ridiculariza a figura de Lampião. O filme tem uma narrativa que mescla ficção e documentário, com uma pitada de elementos lúdicos, principalmente nos sonhos de Deraldo. Uma crítica feroz ao Brasil da época, que explora a mão de obra da população, aviltado na dignidade e obrigados a trabalhar em sub-empregos. O filme ridiculariza os americanos e os empregadores de uma forma geral, vistos como carrascos e abusadores. O Personagem de Deraldo é o contraponto do nordestino que não aceita essa humilhação, e na medida do possível, procura lutar contra o sistema. Com atuação esplêndida de José Dumont, 5 anos antes de outra performance primorosa em 'A hora da Estrela", "O Homem que virou suco" é um marco do cinema brasileiro, um filme corajoso que bateu de frente com a Ditadura ainda vigente no País e que mostra as mazelas sociais de um Governo que tenta colocar os nordestinos em um lugar de desprezo. A narrativa do filme é complexa, misturando cenas elípticas com linguagem híbrida de naturalismo ficcional e documentário. O título do filme já deixa claro a contundente visão do cineasta que quer expôr a falta de identidade de cidadãos que só querem existir e se mostrarem como seres humanos em busca de sonhos.

Um comentário:

  1. Assisti esse filme há muitos anos mas jamais esqueci. Lembro dele nos muitos pontos em comum com o que li aqui, quase 30 anos depois de assisti-lo, principalmente a atuação de Dumont, que merece um Oscar pelo conjunto da obra. Apenas acrescentaria que foi por filmes como este que aprendi a respeitar o cinema nacional e a amar aprender com ele. Imortal.

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