sexta-feira, 10 de outubro de 2014
A dança da realidade
"La danza de la realidad", de Alejandro Jodorowsky (2013)
Após 23 anos sem filmar, Jodorowsky e o produtor francês Michel Seydoux (pai da atriz Lea Seydoux) trazem ao espectador uma pequena obra-prima, uma visão totalmente anárquica e poética sobre a memória. Realizando aqui o seu "Amarcord", Jodorowsky relembra a sua infância. Nascido em 1929 na cidade montanhosa e deserta de Tocopilla, no Chile, ele relata sua convivência com o seu pai ateu e stalinista, além de fervoroso admirador do presidente e ditador Ibanez. Sua mãe e católica fervorosa e como opção absurda e genial de Jodorowsky, ela só fala cantando, como nos granes musicais de Hollywood. O próprio Jodorowsky surge como um fantasma que acompanha a sua infância, suas amizades, medos, tragédias e perdas de mitos. A descrença com a religião, com o amor, com o poder, o ódio e amor que nutre pelo seu pai e admiração pelo amor extremo de sua mãe. A culpa de ser judeu, a perseguição nazista, enfim tudo isso vem à tona nas lembranças surrealistas do cineasta. Acredito que o filme seja todo focado em "Amarcord" e na obra de Fellini: a trilha sonora nostálgica de Adan Jodorowsky, evocando os acordes de Nino Nota. As pessoas feitas de papelão, o tanque de guerra feito de papelão pintado, típico recurso do cineasta italiano em deflagrar a mentira e a fronteira com a verdade.
A fotografia estupenda de Jean-Marie Dreujou que realça a beleza do deserto e do mar que costeia Tocopilla. O elenco é um caso à parte: totalmente imersos no universo de Jodorowsky, se entregam ao seu mundo particular. Ficam nús sem qualquer pudor. Inclusive em uma cena , a atriz que interpreta a mão mija de verdade sobre o ator que interpreta o pai. E o pai, em uma cena de tortura, leva eletrochoque no pênis e nos testículos.
Um filme vibrante, colorido, necessário, genial. Um artista em plena lucidez, em plena criatividade. Uma pena que distribuidores não queiram lançar o filme comercialmente.
Nota: 9
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